Valor Econômico - 26/06
O agravamento da crise internacional já é bastante visível na contas externas e obrigou o Banco Central (BC) a rever as previsões para o balanço de pagamentos. As restrições ao crédito reduziram a expectativa de captações externas e investimentos em ações. A desaceleração da economia internacional diminuirá o saldo da balança comercial. Por outro lado, a conjuntura diminuirá os gastos com viagens ao exterior e as remessas de lucro e dividendos das multinacionais. Mas os investimentos estrangeiros diretos manterão o ritmo esperado. No balanço geral, o déficit em conta corrente brasileiro até acabará diminuindo, mas a revisão dos números deve ser encarada como um alerta.
Até agora, não faltaram armas ao governo para responder às novas pressões. Ao concluir que a oferta de novos empréstimos mal vai cobrir as amortizações do ano, o governo retirou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 6% sobre as operações de até cinco anos, mantendo a tributação para as até dois anos. Os empréstimos mais longos tiveram a tributação elevada há menos de três meses, em março, para desestimular o investimento especulativo que, na avaliação não admitida oficialmente, apreciava a cotação do real.
O BC esperava um ingresso menor de empréstimos em moeda estrangeira, depois que a rolagem atingiu 460% em 2011, com um superávit de US$ 47 bilhões. Com as barreiras tributárias criadas, a expectativa era que os novos empréstimos cobririam os US$ 41 bilhões que vencem neste ano e ainda sobrariam US$ 6,9 bilhões. Mas, agora, mesmo depois da retirada do IOF para as operações mais longas, estima-se que os novos empréstimos mal cobrirão os vencimentos, com sobra de meros US$ 100 milhões. Nem em 2009, quando a crise causou a retração da economia brasileira, a entrada de capital foi tão fraca. Naquele ano, a captação líquida foi de US$ 6,754 bilhões.
Efeitos negativos da crise internacional e incertezas com crescimento global devem limitar também os investimentos em ações em US$ 8 bilhões, e não mais em US$ 12 bilhões.
Já a projeção para o fluxo líquido de Investimento Estrangeiro Direto (IED) foi mantida em US$ 50 bilhões, um número que pode ser conservador. Em maio, o investimento estrangeiro direto diminuiu para US$ 3,7 bilhões em comparação com US$ 4,7 bilhões em abril. A previsão para junho é que o fluxo volte a aumentar e atinja US$ 4,8 bilhões. Se isso se confirmar, o primeiro semestre vai fechar com saldo de cerca de US$ 28 bilhões. No ano passado, os investimentos estrangeiros diretos somaram US$ 66,66 bilhões.
Por conta da desaceleração econômica global e do recuo do preço das commodities, o Banco Central também alterou a previsão para a balança comercial. O saldo esperado foi reduzido de US$ 21 bilhões para US$ 18 bilhões - quase a metade dos US$ 29,8 bilhões de 2011 - por conta de exportações US$ 10 bilhões menores, de US$ 258 bilhões; e importações US$ 7 bilhões maiores, em US$ 240 bilhões.
Por outro lado, a apreciação do dólar deve arrefecer as saídas de recursos. Uma dessas despesas são os gastos com viagens internacionais, que devem diminuir de US$ 15,5 bilhões para US$ 13,3 bilhões. Impacto mais significativo houve nas remessas de lucros e dividendos, que perderam o ímpeto registrado em 2011 por causa da desaceleração da atividade econômica, que reduziu a lucratividade das empresas, e da taxa de câmbio menos atrativa. A expectativa do BC é que as remessas de lucros e dividendos ao exterior vão encolher US$ 10 bilhões em relação aos US$ 38 bilhões antes esperados.
Em maio, as remessas de lucros e dividendos ao exterior somaram US$ 2,55 bilhões líquidos, acumulando US$ 8,44 bilhões nos primeiros cinco meses do ano, 43% em comparação com igual período de 2011. A indústria automobilística foi a que registrou maior recuo nas remessas de lucro, de US$ 2,3 bilhões em 2011 para US$ 703 milhões neste ano.
Apesar do cenário sombrio, o resultado da reavaliação das contas externas feita pelo governo acabou resultando em uma diminuição do déficit em conta corrente de US$ 68 bilhões anteriormente esperados para US$ 56 bilhões, que ainda serão em boa parte financiados pelo investimento estrangeiro direto.
O novo quadro traçado pelo Banco Central deve ser, porém, acompanhado de perto, pois pode ficar muito pior dependendo dos desdobramentos da crise na zona do euro. Não será surpresa se o governo voltar a reduzir a incidência de IOF sobre os empréstimos em moeda estrangeira como ocorreu em junho.
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