segunda-feira, março 26, 2012

Independência, a ordem do dia - DENISE ROTHENBURG


Correio Braziliense - 26/03/12


Tudo indica que os Brics cansaram de esperar que Estados Unidos e Europa lhes deem assentos vips nos organismos multilaterais. Por isso, trabalham novas instituições da mesma forma que Dilma, por aqui, busca uma nova relação com o Congresso


A presidente Dilma Rousseff fez bem em deixar alguns recados por aqui antes de viajar para a Índia. Primeiro, ao dizer que não gosta do toma lá dá cá deu um alerta aos que ficam tomando conta de seu governo. Algo mais ou menos assim: "Meninos, comportem-se na minha ausência. Não abram a porta para ninguém". Ou seja, esta semana não tem nomeação de ministro ou liberação de verba para emendas individuais.
A segunda mensagem foi ao parlamento. Quando Dilma se refere aos problemas com o Congresso e acrescenta que "só há crise quando se perde a legitimidade", muitos entenderam assim: "Não adianta chorar nem fazer malcriação porque quem manda sou eu". E você sabe, leitor: reza a lenda que manda quem pode, obedece quem tem juízo.
Em outras palavras, o resumo é cristalino: a presidente continua olhando com frieza e sobriedade para a choradeira dos congressistas. Está mais preocupada com o que considera o Brasil real e as formas de desvio da crise internacional para não prejudicar os parâmetros econômicos nacionais. Por isso a reunião com empresários na semana passada e as ordens à equipe econômica para novas medidas de promoção da indústria, a serem anunciadas após a viagem à Índia. Ou seja, teremos nestes sete dias de ausência da presidente intensas reuniões no Ministério da Fazenda.

Por falar em viagem...

Dilma vai a Nova Délhi reforçada por empresários ansiosos pela criação de desvios internos e externos para que o Brasil mantenha um ritmo de crescimento à margem da crise na Zona do Euro e das dificuldades dos Estados Unidos. E é isso que vão tratar Dilma e os presidentes Dmitri Medvedev (Rússia), Hu Jintao (China) e Jacob Zuma (África do Sul), e o primeiro-ministro da Índia, Manmohan Singh, os atuais chefes do Brics.
A pauta do encontro de cúpula é uma forte indicação de que os Brics cansaram de esperar que os Estados Unidos e a Europa abram espaço a novos assentos VIPs nas instituições econômicas e políticas. Há um ano, na terceira reunião de cúpula do Brics em Sanya, na Ilha de Hainan (China), esses mesmos personagens cobraram um rodízio na condução de instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Queriam ainda uma cesta de moedas para os financiamentos, fora do dólar e do euro. Nada foi feito.
Diante dessa constatação, partiu do primeiro-ministro indiano a proposta de criação de um banco de desenvolvimento comum a esses cinco países. Virá ainda um acordo para uso de moeda local nas transações entre esses países de forma a fugir do dólar e do euro. Obviamente, o banco não será instituído da noite para o dia nem as propostas comerciais vão mudar de moeda na mesma velocidade. Mas é claro o sinal de que há um novo mecanismo em curso, num mundo cansado de ser tão dependente das decisões dos Estados Unidos e da Europa. E é nisso que todos se mostram mais inclinados a apostar.

Por falar em menos dependente...

Da mesma forma que os Brics tentam buscar uma certa independência das potências Estados Unidos e Zona do Euro, Dilma trabalha internamente para cravar uma distância de seu governo em relação à fogueira que arde na base parlamentar. Está clara a sua intenção de reformular as relações. O problema, entretanto, é que ninguém vive sozinho e as mudanças, ao mesmo tempo em demoram a surtir efeitos, provocam reações.
Atualmente, nem os Brics podem prescindir da Europa e dos Estados Unidos nem Dilma conseguirá mudar a relação de toma lá dá cá a que a sua base está viciada. Mas o mundo e o Brasil estão em transformação. E quem não perceber as mudanças vai perder o bonde. Por enquanto, ainda é cedo para elencar derrotados e vitoriosos desse processo. E, diante disso, fica cada vez mais importante auscultar o que pensa o povo. Daqui e de fora. Afinal, sem votos, ninguém faz nada. Essa é a única dependência da qual os políticos não podem prescindir e que
lhes dá a tal legitimidade referida por Dilma.

Por falar em votos...

A prévia tucana em São Paulo foi mais fraca do que se esperava... Sinal de que o Brasil ainda tem muito o que caminhar no sentido de fazer todos os filiados participarem da vida partidária. É mais um processo a passos lentos.

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