quinta-feira, janeiro 19, 2012

2012, ano de inflexão? - MARIA CLARA R. M. DO PRADO

VALOR ECONÔMICO - 19/01/12
Bissexto, 2012 parece fadado a marcar o rumo que o mundo definitivamente tomará nos próximos anos. E, ao contrário do que muitos possam pensar, o destino a ser configurado não depende do comportamento da economia chinesa e, sim, do desempenho dos dois grandes blocos que por quase vinte anos seguidos sustentaram o acelerado crescimento da China pela via do comércio internacional.

Em verdade, a ninguém deve espantar a desaceleração que começa a impactar com mais vigor o PIB chinês, cuja taxa de expansão fechou em torno de 9,2% em 2011 e que, para muitos analistas, não deve ser muito superior a 8% neste ano. Se os compradores do outro lado do globo minguaram, por drástica redução da renda, o motor que vinha impulsionando a China só pode dar sinais de que está rateando. A Europa, que funcionou como a região de maior demanda para os produtos chineses, tende a cair em recessão este ano.

O Japão, parceiro comercial e financeiro mais estreito nos últimos anos, não deve voltar a crescer muito significativamente. A responsabilidade sobra para os Estados Unidos. Terá a economia americana condições de garantir um crescimento mais robusto, em torno de 3%, este ano? Até que ponto o debate eleitoral tende a redefinir a política expansionista do presidente americano Barack Obama? E, mais, o que esperar depois das eleições, com ou sem Obama?

Na Europa, um importante passo político poderá ser dado com a eleição presidencial na França, em maio. Ou não. Se não se aprumarem melhor em termos de liderança, o controle da região, em especial da zona do euro, cairá mais e mais nas mãos da Alemanha. Conflito à vista? É possível e isso não seria novidade depois das rusgas com relação ao bloco que opuseram os interesses britânicos aos franceses, recentemente.

Nesse caldeirão em que todos estão mergulhados não restará à China muita opção além da apreciação cambial com vistas a estimular o mercado doméstico, abrindo assim espaço para que outros mercados possam se beneficiar do gigantismo local. Países como o Brasil que, ao contrário da China, têm crescido com base no aumento da demanda doméstica, terão de refrear o ímpeto com drástica redução dos gastos públicos, sob pena de amargarem anos de alta inflação à frente.

2012 pode se caracterizar como o ano em que a opinião pública mundial enterrou definitivamente a ideologia do "neoliberalismo" e tudo o que estava implícito naquele pacote. Na prática, já há mostras disso. O protecionismo tem batido à porta dos países com mais insistência e sem muita resistência política, reconfigurando os termos que sustentaram o largo fluxo do comércio mundial nas últimas duas décadas. Também as atividades financeiras passaram a ser alvo de atenção das autoridades locais e dos organismos multilaterais desde que o desastre dos "sub-prime", seguido pelo desaparecimento do Lehman Brothers, em 2008, foi reforçado pelos problemas de dívida soberana na Europa e suas consequências sobre o patrimônio dos bancos.

Não deixa de ser absoluta novidade a decisão tomada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) no sentido de que, ao invés de voluntário, o monitoramento da organização sobre o desempenho do setor financeiro dos países membros passaria a ser mandatório, com início neste ano. Vinte e cinco diferentes países já foram selecionados para submeterem seus sistemas financeiros a uma profunda e detalhada averiguação por parte do FMI a cada cinco anos. Daquela lista, 18 estão escalados para serem "auditados" ao longo de 2012, incluindo três países da Europa - França, Espanha, Bélgica -, quatro da América do Sul - Brasil, Argentina, Uruguai e Colômbia - além de Japão, Austrália e Bahamas, entre outros.

A ideia é passar um pente fino para medir a qualidade dos bancos e de outras instituições financeiras, com aplicação inclusive de testes de estresse, além de avaliar o desempenho da supervisão do mercado financeiro e do relacionamento com órgãos de supervisão de outros países.

Os bancos não serão obrigados a implementar as recomendações do FMI a serem apresentadas em relatórios específicos para cada caso. Mas isso não tira a relevância da oportunidade de se conhecer o estado em que se encontra o setor financeiro dos países monitorados.

Não se sabe como os bancos reagirão a essa intromissão, mas com certeza os governos tendem a ganhar. Espera-se que a radiografia sirva de guia para evitar futuros potenciais colapsos bancários, liberando assim os bancos centrais da esdrúxula atividade quase-fiscal a que têm sido submetidos nos países mais avançados. A possibilidade de prevenir eventuais crises recolocará os bancos centrais no seu devido lugar: o de zelar pela estabilidade monetária, independente dos interesses políticos dos entes governamentais.

A julgar por este início, 2012 pode não ser um ano dos mais promissores, mas que pelo menos nele sejam criadas as condições que assegurem a todos uma nova rodada de prosperidade para o restante da década.

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