ZERO HORA - 14/12/11
Hoje será votado o projeto que pretende alterar o nome da Avenida Castelo Branco. A ideia é de que a avenida deixe de homenagear um representante da ditadura militar para se chamar Avenida da Legalidade, que é um movimento que orgulha os gaúchos.
Os autores do projeto, os vereadores Fernanda Melchionna e Pedro Ruas, estão bem-intencionados e seus argumentos são razoáveis, mas é uma iniciativa que, vitoriosa ou não, pouca diferença fará. Ninguém vai passar a dizer: “Me atrasei, fiquei preso na Legalidade”. Todos continuarão saindo e entrando livremente de Porto Alegre pela Castelo Branco.
No Rio, as pessoas desembarcam no Galeão, mesmo que o aeroporto se chame Antonio Carlos Jobim desde 1999. Alguém se refere a Cat Stevens como Yusuf Islam? É o nome do cantor desde que ele se converteu ao islamismo. Quem escutava Jorge Ben quando criança não consegue chamá-lo hoje de Jorge Benjor, e muitos moradores vizinhos à Praça Carlos Simão Arnt (praça o quê? Ah, a praça da Encol) seguem chamando o supermercado Nacional de Febernatti.
Não importa se por homenagem, conversão religiosa, numerologia ou mudança de propriedade: temos profunda resistência a trocar de hábitos. Na época da escola, tínhamos uma colega cujo apelido era Gorda. Hoje, a Gorda é uma mulher linda e magra que faz questão de que a chamemos pelo nome, Marina.
Mas alguém consegue? Quando ela nos apresenta algum namorado ou se está diante de uma cliente, ai de nós, suas amigas de infância, se perguntarmos: “Onde é que tu conheceste a Gorda?”. Ela nos fulmina com os olhos como quem diz: “Te pego na saída”.
Mas não pega.
Porque, depois de um tempo, Gorda deixa de significar acima do peso, assim como Castelo Branco deixa de significar presidente do regime militar. Ninguém racionaliza sobre nomes próprios. A menção torna-se automática, sem nenhuma codificação, sem nenhum racionalismo. Tanto faz se uma loja for inaugurada com um nome esdrúxulo ou chique, pois todos os nomes são rapidamente despidos de qualquer sentido.
Lembro que houve uma época em que a butique mais elegante de Porto Alegre chamava-se Levajeito: nome de lojinha de subúrbio. Assim como lanchonetes de fundo de quintal são batizadas com nomes em inglês e apóstrofo – identificações superficiais, pois o que segue relevante é a identidade intrínseca do local.
Infelizmente, é assim: o costume elimina a significância. Vá saber se em algum rincão do Brasil não há uma rua chamada Orlando Silva, que tanto pode estar homenageando o cantor das multidões como o ministro que saiu do governo sob acusações de irregularidades. Na hora de dizer Orlando Silva, 256, apartamento 101, quem pensa no ilustríssimo que a inspirou?
Não que seja um mau projeto. Só me parece inútil.
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