Ninguém é louco
O ESTADO DE SÃO PAULO - 09/10/09
Qual é o nome do presidente da Guatemala? Ninguém sabe. Escolhamos, então, um pais maior: como se chama o governante do Panamá? Trata-se também de um desconhecido. Ora, Honduras é uma nação com muito menor significância do que as duas acima citadas. E, graças às iniciativas desastradas do Itamaraty, de lá conhecemos muito bem o presidente deposto, Manuel Zelaya, e também o que o derrubou, Roberto Micheletti. Zelaya, já há algumas semanas, é hospede de nossa embaixada por lá. E Micheletti é o responsável por numerosas e merecidas declarações malcriadas sobre o Brasil.
A gente bem que poderia passar sem essa. Poderia. O nosso presidente Lula não pensa assim e o nosso chanceler, o impagável celso amorim, também não.
Quando o presidente Zelaya decidiu forçar a barra e se aventurar num arrojado retorno a Honduras, sabia exatamente o que estava fazendo. Juntamente com dezenas de simpatizantes, tratou, de imediato, de se abrigar no prédio de nossa representação diplomática. Todo mundo se lembra de que, num primeiro momento, o loquaz amorim se regozijou. O fato de o presidente caído, entre tantas outras embaixadas, ter escolhido espontaneamente a do Brasil demonstrava cabalmente - segundo ele - o prestígio e a crescente influência do nosso país na região.
Não era bem assim. E nós só nos inteiramos da embaraçosa realidade alguns dias depois. Zelaya é um acólito do ditador da Venezuela, Hugo Chávez, e foi por orientação dele que se hospedou na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa. O Itamaraty jura que não, mas transparece cada dia mais que, previamente consultado, o indômito amorim concordou com a situação.
É óbvio. Ninguém se abriga numa embaixada estrangeira - ainda mais na companhia de uma turba - sem o prévio consentimento desta.
E há, ainda, agravantes. O status político de Zelaya, enquanto nosso hóspede, ainda não foi definido. Ele não é um abrigado, nem um asilado, nem um refugiado. Em qualquer situação ele teria de ser remetido imediatamente para o Brasil. Zelaya não dá o menor sinal de pretender fazer isso.
Pior: contrariando todas as normas diplomáticas internacionais, ele está se valendo da situação para tentar insuflar a população para exigir a sua volta ao poder. Trata-se de um claro abuso de nossa hospitalidade. O Brasil está violando todas as convenções internacionais por causa de Zelaya. E este, por sua vez, não tem a menor relevância internacional.
Manuel Zelaya não é nada. Nem ao menos na realidade institucional da região centro-americana. Ele somente se tornou importante graças ao grotesco status que o Brasil lhe vem concedendo.
Não perguntem ao patriota ministro amorim o que está acontecendo. Com certeza ele se exacerbará e dirá que o Brasil está, nada menos, do que reafirmando a sua soberania.
Duvido, sinceramente, que ele e o presidente Lula estejam pensando assim. Pode ser que no início alguns "terceiro-mundistas" na Chancelaria acreditassem nessa tese. Agora, não.
Manuel Zelaya é um cadáver político. E como tal já se encontra em estado avançado de putrefação. E o Brasil não tem a menor ideia de como se livrar de seus restos mortais. Asilo diplomático ele não quer. Porque, como já foi ressaltado, ao aceitá-lo teria de ser enviado ao Brasil. Por outro lado, ele não faz o menor esforço para tornar leve a sua hospedagem na nossa embaixada. Ocupou todo o casarão com os seus asseclas e dispara exaltadas declarações de "patria o muerte" para quem quiser ouvi-lo.
O problema é que sua plateia vem diminuindo a cada dia que passa. Segundo já nos foi demonstrado, Manuel Zelaya não é popular em Honduras. Não há sinais de que o povo o queira de volta. Ao contrário. Micheletti, respaldado nos militares e em grande parte da população, convocou eleições diretas para presidente em novembro.
Há nessa história um personagem oculto que tem sido subavaliado pela mídia brasileira. Trata-se do coronel Hugo Chávez, ditador da Venezuela. Se ele for realmente o idealizador de tudo isso, bobo não é. Tachá-lo assim significa condenar toda a cúpula decisória do governo brasileira, uma vez que foi plenamente convencida a agir da forma como agiu nessa crise.
Ora, Chávez, pelo visto, não é louco. Tem sido, isso sim, um habilidoso psiquiatra de alguns milhões de latino-americanos loucos.
João Mellão Neto, jornalista,deputado estadual,foi deputado federal, secretário e ministro de Estado
Nenhum comentário:
Postar um comentário