O Estado de S.Paulo - 04/06
Sob o impacto do avanço decepcionante do PIB no primeiro trimestre, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou no último dia 29 que há mudança na política econômica: o governo federal não vai mais incentivar o consumo, dará prioridade ao investimento. É hora de avaliar o que é preciso fazer para garantir sucesso nessa virada.
Primeiro convém saber até que ponto há sinceridade nisso. Se é verdade, por exemplo, que o governo prepara uma prorrogação de isenção ou redução tributária para a venda de veículos e aparelhos domésticos, então já não é para levar tanto a sério o anúncio do ministro.
Mas, se for para dar toda força ao investimento, então muita coisa tem de mudar. É importante levar em consideração que turbinar o investimento não significa necessariamente reprimir o consumo.
Todo investimento implica uma lista enorme de contas a pagar bem antes da criação de riqueza prevista nele. Uma hidrelétrica, por exemplo, começa a gerar despesas no momento em que o primeiro técnico faz o esboço do projeto no computador. Essas despesas se multiplicam com levantamentos geológicos, engenharia, licenciamento ambiental, materiais, mão de obra. São, digamos, entre 8 e 10 anos só de despesas, sem faturamento correspondente, porque o primeiro quilowatt/hora apenas será gerado quando a primeira turbina vier a ser acionada. Ou seja, um grande programa de investimentos gera também forte demanda, que precede os resultados.
Caso seja mesmo para criar condições para a multiplicação do investimento, então é necessário propiciar regras constantes de jogo que, por sua vez, garantam remuneração adequada aos operadores dos projetos. E isso é diferente do que vem acontecendo sob coordenação de um governo que ainda não se livrou de certos preconceitos ideológicos, segundo os quais iniciativas desse tipo configuram o que alguns lá em Brasília continuam chamando de privataria.
Para assegurar regras confiáveis de jogo é preciso, também, fortalecer as agências reguladoras, para impedir desvios. Ou seja, têm de ser organismos de Estado, vacinados contra contaminações políticas e não, como são hoje, instrumentos de governo e, nessas condições, sujeitos ao jogo político.
Para abrir espaço ao investimento, será necessário também desenvolver o mercado de capitais fornecedor de financiamentos de longo prazo para que aconteçam duas coisas. Primeira, redução de sobrecarga do BNDES, que não dá conta nem do que já tem para financiar, e segunda, disponibilidade de financiamentos em volume e juros compatíveis com o custo dos projetos. Isso tudo exige mais estímulos à poupança.
As regras estáveis de jogo mencionadas, por sua vez, pressupõem estabilidade da política econômica. Um operador de projetos que não sabe qual inflação vai enfrentar, com que tipo de câmbio vai lidar, que juros vai pagar e que todos os dias está sujeito aos vaivéns do governo não pode mesmo trabalhar direito. Em outras palavras, um ambiente favorável ao investimento exige clima de confiança e este, por sua vez, firmeza e estabilidade na condução da economia. Está o governo Dilma disposto a isso?
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