quarta-feira, junho 19, 2013

O que fica dos protestos - EDITORIAL ZERO HORA

ZERO HORA - 19/06

A sociedade tem de saudar e acolher esse verdadeiro despertar jovem, zelando para que fortaleça o Estado democrático de direito.


A história está repleta de datas que sintetizam espíritos e épocas, como o 14 de Julho, o Domingo Sangrento e o 11 de Setembro. Sem esperar pelo veredicto da posteridade, já é possível afirmar que o 17 de Junho é o retrato de um novo Brasil. O país que foi para as ruas protestar na segunda-feira reflete um novo estado de ânimo de uma ampla parcela da população: rejeição à corrupção e ao descaso com a coisa pública, desconfiança de governantes e partidos, indignação com a desproporção entre os gastos com grandes eventos, por um lado, e com saúde, educação e transporte, por outro. O país que tomou praças e avenidas sente os efeitos da alta de preços de alimentos e serviços. A nação que tomou a palavra antevê, para além dos sinais incipientes de turbulência econômica, os percalços de um futuro que parece menos auspicioso do que há alguns anos. Sua voz ergue-se também contra governos, parlamentares, corporações e meios de comunicação. Pode-se saudar ou rejeitar a emergência desse Brasil do 17 de Junho. Mas não se pode, sob nenhuma hipótese, ignorá-lo.
É utópico imaginar que dezenas de milhares de pessoas decidam se manifestar por fora dos canais até hoje existentes no interior do Estado de direito, por meio de ida massiva às ruas, sem que isso implique riscos para a segurança e até mesmo distúrbios isolados. É preciso separar a manifestação legítima e democrática da maioria das depredações, incêndios e pichações promovidos por uma ínfima minoria oportunista. Toda sorte de vandalismo pode e deve ser investigada, e os envolvidos, enquadrados criminalmente na forma da lei. O fato de tais atitudes terem prosperado nos primeiros dias do movimento reflete o fato de não haver objetivos, líderes e organização claras.
O mais importante é que a nação seja capaz de refletir e retirar ensinamentos dos acontecimentos da última semana. Em síntese, os jovens nas ruas estão enviando um recado para toda a sociedade, incluindo governantes, políticos, empresários e imprensa. O sentimento da maioria é, como bem sublinhou a presidente Dilma Rousseff ao citar o cartaz "Desculpem o transtorno, estamos mudando o Brasil", carregado de civismo e boas intenções. É positivo que milhões de pessoas com menos de 30 anos estejam se dispondo a assumir um papel de protagonistas na história. Trata-se de uma geração que mal desperta para a vida pública e que jamais viveu períodos de exceção ou de cerceamento de liberdades. Para o bem do país, esse aprendizado deve ocorrer de forma serena e não traumática. A sociedade tem de saudar e acolher esse verdadeiro despertar jovem, zelando para que fortaleça o Estado democrático de direito. Não resta dúvida de que todos seremos testemunhas dos reflexos concretos do que está acontecendo hoje em São Paulo, Rio, Porto Alegre, Brasília e outras cidades daqui a pouco mais de um ano, nas eleições presidenciais de 2014. É desejável que a experiência histórica de cada geração se reflita na participação eleitoral por meio do embate entre ideias, programas e concepções. A democracia ainda é a melhor panaceia para os males da vida pública.

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