ZERO HORA - 06/06
A penúria financeira dos municípios desaconselha o Congresso a endossar uma nova onda de emancipações.
O Brasil tem 5.570 municípios, a maioria dependentes do Fundo de Participação distribuído pelo governo federal porque não dispõem de arrecadação suficiente para se manter. Em praticamente todos os Estados brasileiros, há municípios com baixos índices de desenvolvimento humano, problemas de moradia e saneamento e com grande parte da população sobrevivendo de programas sociais da União. Pois, mesmo nesse cenário, a Câmara dos Deputados aprovou nesta semana um projeto de lei que permite a retomada das emancipações, com potencial para desencadear uma nova onda de criação de cidades sem as mínimas condições de cumprirem com suas obrigações básicas, como ocorreu nos anos 80 e 90.
Entre os argumentos por mais um fracionamento dos municípios, defende-se que essa é oportunidade para que as comunidades se tornem econômica e socialmente autônomas e dinâmicas. Emancipacionistas se baseiam principalmente em modelos europeus, pelos quais as cidades dispõem de fartos recursos e exercitam práticas herdadas de séculos de convivência fortemente comunitária. No Brasil, ressalvadas as exceções, os municípios são dependentes da concentração de receitas na esfera federal e sobrevivem de repasses que, como se observa nos últimos anos, têm minguado. O efeito da dependência é a precariedade dos serviços em educação e saúde. Tanto que os prefeitos amplificaram as queixas contra a escassez imposta por Brasília, sem que suas lamúrias surtam efeito.
Mesmo assim, prevalece no Congresso o apoio ao projeto que permite a volta das emancipações, a partir de plebiscitos e de leis estaduais. Apenas os parlamentares do PSOL se posicionaram contra, ao observarem que a maior parte dos municípios não consegue nem mesmo pagar suas dívidas com a Previdência e se mantém com as migalhas da União. A matéria depende de apreciação do Senado, que tem a chance de evitar a repetição do que ocorreu há mais de duas décadas, quando as emancipações viraram moda, em nome do desenvolvimento, que encobria o desejo de ampliação de currais eleitorais, com estrutura administrativa capaz de contemplar o compadrismo e o clientelismo.
Desde 1996, com a aprovação de emenda constitucional que tirou das Assembleias dos Estados o poder de legislar sobre o assunto, o Brasil estava livre de uma tentação que, segundo a Confederação Nacional dos Municípios, tem hoje mais de 800 distritos à espera de nova lei que viabilize suas pretensões. Exemplos bem-sucedidos de comunidades que prosperaram como município não podem justificar a pressão pelo surgimento de cidades precárias em meio à penúria generalizada.
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