terça-feira, junho 25, 2013

Aquém do possível - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 25/06

Reforma política, como a reforma tributária, é aquilo que todo mundo é a favor, mas cada pessoa tem uma proposta diferente. Um plebiscito para decidir se deve haver uma constituinte exclusiva para isso pode ser uma boa ideia. O que não é bom é chamar os governadores para dizer que "antes o país era governado apenas para um terço dos brasileiros". Isso ofende a oposição e os fatos.

A presidente herdou do seu antecessor a convicção equivocada de que o Brasil começou em 2003. Houve avanços importantes na inclusão de brasileiros nos governos petistas. Mas qualquer pessoa que acompanhou os fatos recentes sabe que o processo de inclusão no mercado de consumo foi iniciado, e se tornou possível, a partir da estabilização da economia em 1994/1995. Pacto se faz costurando coincidências de pensamentos e propostas comuns, e não lembrando mais uma vez o que separa. Isso é que dá submeter todos os pronunciamentos que faz ao marqueteiro. Este não é momento de campanha.

A população está nas ruas num momento difícil da economia. Não por culpa das manifestações. A economia está complicada por fatores externos e os erros cometidos na condução da política econômica. O dólar ontem caiu pelo segundo dia seguido, mas ainda acumula um ganho de 10% em um mês.

A bolsa continuou caindo ontem e fechou com -2,3%, na casa dos 45 mil pontos. O nível mais baixo desde abril de 2009. A desaceleração da China atinge a Vale que, como exportadora, poderia até se beneficiar da alta do dólar; a disparada da moeda americana atinge todas as empresas endividadas em dólar, mas mais ainda a Petrobras, que tem o ônus de pagar pela gasolina importada um preço cada vez maior.

O dólar subiu diante da maioria das moedas. Subiu mais no Brasil por dificuldades econômicas, como o déficit em conta corrente de 3,2% do PIB. A presidente Dilma falou em pacto pela estabilidade fiscal. Primeiro, será necessário desmontar a alquimia que faz com que números não correspondam aos fatos. Os indicadores de dívida pública e superávit primário perderam consistência. A estabilidade fiscal precisa, antes de tudo, de números compreensíveis e verificáveis.

Tornar a corrupção dolosa um crime hediondo é um gesto forte, mas o combate a esse mal tem que ser diário, e a maior arma contra ele sempre será a transparência. Nesse ponto, a pauta das ruas coincide com o programa de governo, se ele for implementado. Ninguém sabe ao certo como são calculadas as tarifas públicas. Elas são uma caixa preta deliberada ou se tornaram tão complexas que é difícil entender os valores arbitrados pelo poder concedente. Portanto, essa é uma tarefa de todas as instâncias governamentais, porque há serviços concedidos pelo governo federal e pelos estados e municípios.

A defesa da presidente da Lei de Acesso à Informação é outra boa notícia. Pena que o BNDES não se submeta a ela. Com a alegação universal de que é detentor de sigilo bancário, o banco não presta nem ao Ministério Público as informações que deveriam estar oferecendo espontaneamente ao distinto público. Como o BNDES é uma máquina de usar dinheiro caro captado pelo Tesouro e oferecer dinheiro barato às empresas, ele é o centro da distribuição de renda para a elite do empresariado brasileiro. É ele que financia os gastos da Copa. É o banco que garante a construção das hidrelétricas, principalmente a mais polêmica delas, Belo Monte.

A constituinte exclusiva para a reforma política já foi defendida por outros, como o deputado Miro Teixeira. Ela tem chances de desatar o nó na qual se perdem todas as propostas de reformas. Melhor ainda se for precedida de uma consulta popular para ver se é ou não o caso de fazê-la. Na economia, no entanto, as propostas da presidente ficaram aquém do esperado e desejável.

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