O GLOBO - 08/06
O viés de baixa carimbado no país pela S&P é sinal do fim de um ciclo. Inflação, baixo crescimento, gastança são problemas a serem combatidos para valer
A agência de avaliação de risco Standard & Poor’s (S&P) concedeu o “grau de investimento” ao Brasil em 2008. Fato inédito, acompanhado de merecidas comemorações. O país entrava no clube restrito frequentado pelo Primeiro Mundo, por economias de ilibada reputação, emissoras de títulos seguros para o investidor. Nada mal para quem já dera vários calotes externos.
Puxada pelas crescentes importações chinesas de minérios e alimentos, a balança comercial brasileira passou a acumular grandes superávits. O país chegou ao ponto de pagar a dívida externa, e a União a emprestar dinheiro ao Fundo Monetário, supremo motivo de orgulho nacional. Lula e Dilma souberam aproveitar o bom momento. A presidente até deu temerárias lições públicas de economia à Europa em mergulho rumo à recessão. Pois na quinta-feira a mesma S&P carimbou um viés de baixa no Brasil. Primeiro passo para reduzir a classificação do país. Fecha-se um ciclo.
Na justificativa da decisão, a agência cita o baixo crescimento, inflação, política fiscal expansionista e, em geral, perda de credibilidade da política econômica. Nenhuma novidade. A persistência deste quadro é que leva a S&P a ser a primeira das agências a mostrar o cartão amarelo ao país.
O conjunto da obra não é de fato animador. A inflação deve voltar a romper o limite superior da meta, de 6,5%, e encerrará também 2014 longe do centro do alvo, de 4,5%. A elevação de tom da ata do Copom demonstra que até o paciente BC mudou de humor — como expresso no 0,5 ponto percentual de aumento da taxa básica de juros.
Do quadro traçado pela agência de risco, um dos quesitos mais preocupantes é o fiscal. Numa tentativa de resposta à S&P, o secretário de Política Econômica da Fazenda, Márcio Holland, deu a cândida explicação de que a política fiscal é “anticíclica”. Balela. Desde a troca de Antonio Palocci por Guido Mantega, no Ministério da Fazenda, ela é “cíclica”, monotônica: só aumenta os gastos. Na quinta, por sinal, o governo criou mais um ente estatal, a Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater), com 130 funcionários e R$ 1,3 bilhão em despesas já espetadas no Orçamento de 2014. O diagnóstico da agência é prova cabal de que a “contabilidade criativa” e seus alquimistas alocados no Tesouro e na Fazenda, capazes de transformar endividamento em receita primária, não enganam mesmo os analistas mais atentos. A criatividade faz com que repasses do Tesouro a bancos públicos não apareçam na dívida líquida pública. Mas elas têm impulsionado a dívida bruta. O desregramento deixa pistas.
Dilma dá demonstrações de buscar alteração de curso. A luta em torno da nova lei dos portos, para melhorar a infraestrutura, é um exemplo. Os cuidados com a inflação, outro. Mas não há sinais à vista de mudança na política fiscal. O rebaixamento de classificação feito pela S&P mostra que este ponto fraco da política econômica entrou nos radares dos analistas internacionais. Começa a se fechar um ciclo da economia brasileira.
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