FOLHA DE SP - 04/05
Nada marcou mais os novos padrões profissionais que a transfiguração do papel feminino, no lar e fora dele
O ingresso definitivo da mulher no mercado de trabalho, assim se afastando de boa parte da atividade no lar --antes seu centro exclusivo-- foi apressado pela Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Os milhões de soldados convocados na Europa e na Ásia retiraram o trabalho masculino dos segmentos econômicos, nos países cujas forças armadas foram convocadas para as tropas envolvidas na guerra.
Morreram no conflito cerca de 30 milhões de pessoas, provocando diminuição brusca das disponibilidades de trabalhadores para todas as funções. Abriram espaço para a convocação da mulher. Ela teve sucesso na substituição.
Ao mesmo tempo, novas invenções, ampliadas pelo uso da eletricidade transmitida a grande distância da fonte geradora, em todo o planeta, facilitaram a vida da mulher no trabalho doméstico. Hoje, as geladeiras, máquinas elétricas de lavar roupas, pratos e assim por diante foram abertas ao acesso das mulheres.
Do resumo resulta uma conclusão, sejam quais forem as origens da transformação social: nada marcou mais os novos padrões de trabalho que a transfiguração do papel feminino, na economia do lar e na sua operacionalidade externa.
Passou-se do extremo predominante desde os tempos greco-romanos, em que a mulher tinha aposentos separados, apartados dos homens, no gineceu, para sua presença diária na vida do casal. As resistências no mundo árabe, o mais renitente, têm costumes que, pelo menos em parte, tendem a ser afastados, lenta, mas inexoravelmente.
Para a mulher, a origem dos fatos históricos que justificaram a consagração do feriado do Dia do Trabalho nunca teve muita expressão. Ela era estranha ao mercado de trabalho, só o alcançando na segunda metade do século 20. Mudou a cara do mundo. Um exemplo constitucional ilustra a diferença.
A Constituição democrática de 1946, a única digna dessa consideração antes da atual, apresentava, há menos que 70 anos, duas referências à mulher. Uma delas era tipicamente discriminatória: restringia o trabalho noturno para os menores do sexo masculino e para as mulheres (art. 152, inciso 9).
A outra veio com uma curiosidade formal: dispensava do serviço militar o religioso e a mulher. Corria então o chiste de que as forças armadas não suportavam gente de saia, pois os sacerdotes católicos tinham na batina sua obrigatória característica essencial.
A estrutura legal mudou radicalmente. Basta percorrer dos artigos 6º ao 11 da Carta de 1988 para constatar quanto alterou o rumo do tratamento dos dois sexos. O mesmo se diga do número de assalariados, em que a ascensão feminina é sempre mais expressiva, quanto ao número e à remuneração.
É possível extrair uma variável na avaliação desse quadro histórico, com as transformações geradas pela participação feminina, ainda mais quando se sabe que elas estão integradas a soluções novas.
Sempre me pareceu que ser feriado no Dia do Trabalho era o paradoxo dos paradoxos. Afinal, o trabalho corresponde, no sentido mais comum, a exercer uma atividade, remunerada ou não. Não haveria maior homenagem no dia do feriado, até para rememorar seus fundamentos históricos. Faz pensar que o exemplo da mulher indicaria esse rumo, em honra do trabalho.
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