sexta-feira, fevereiro 15, 2013

Delação contestada - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 15/02


Ainda controverso, o instituto da delação premiada -pelo qual um criminoso pode obter redução de pena se denunciar comparsas- teve em 2012 um de seus anos de maior repercussão na opinião pública desde que foi adotado no país, na década de 1990.

A ferramenta chegou a ser cogitada em casos célebres como os de Marcos Valério de Souza, operador do mensalão, e Paulo Vieira, apontado pela Polícia Federal como líder de tráfico de pareceres no governo federal. No de Luiz Henrique Ferreira Romão, o Macarrão, ex-aliado do goleiro Bruno, foi de fato empregada.

É surpreendente que até hoje o mecanismo não tenha sido devidamente regulamentado -tanto mais por se tratar de instrumento polêmico, criticado por boa parte dos advogados criminalistas.

Os questionamentos à delação premiada são sobretudo de ordem moral. Argumenta-se que o Estado não deveria estimular a deslealdade, oferecendo recompensa a um criminoso e, ainda mais, traidor.

Entende-se a repulsa que tal comportamento pérfido ocasiona na maior parte das pessoas, mas ao Estado cabe privilegiar o combate ao crime organizado, não a ética entre delinquentes.

Não são poucos os exemplos de grandes redes criminosas que só foram desbaratadas graças à delação premiada. Para não ficar em experiências internacionais -como a luta contra a Máfia, nos anos 1980, na Itália-, relembre-se o mensalão do DEM, esquema de corrupção que envolveu o ex-governador José Roberto Arruda (DF) após delação pelo ex-secretário Durval Barbosa.

Trata-se, sem dúvida, de dispositivo útil demais para ser descartado. Mas, justamente para preservar seu valor e assegurar que seu uso resulte em benefícios para a sociedade, é preciso haver regras claras sobre as circunstâncias em que o réu poderá lançar mão da delação premiada.

Torna-se fundamental que o Congresso aprove uma lei sobre o tema, para reunir em uma peça única as normas hoje dispersas em diplomas pouco conexos.

Questões procedimentais precisam ser resolvidas, como a proporção entre a colaboração e o benefício obtido, o momento em que a delação pode ser usada pelo réu e a obrigatoriedade de expor seu conteúdo no processo.

Além disso, é preciso garantir que as delações sejam sempre submetidas a contraditório, e as informações, oferecidas de maneira voluntária. Não pode haver espaço para nenhum tipo de abuso.

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