FOLHA DE SÃO PAULO - 30\10
Pode-se dizer que estas foram as eleições mais fisiológicas, ao menos no pós-ditadura
O agravamento extremado da perda de identidade e sentido dos partidos é, provavelmente, a característica destas eleições municipais.
Já se tornara comum a deformação expressa nas alianças estaduais de partidos que se contrapunham em outros Estados. A deformação mais do que se ampliou nos municípios: foi agora a conduta partidária marcante no país todo. Conduta levada até ao cúmulo de partidos se combatendo com ferocidade em municípios vizinhos de onde mantinham alianças.
Ou seja, nenhum dos partidos, nos municípios, esteve sujeito a mais do que à sua política provincial, desconectado não só da linha partidária nacional, mas até da linha praticada no Estado.
A variedade de partidos vitoriosos nas capitais e grandes cidades chamou mais atenção. Sua influência para a nova distribuição das forças políticas é, de fato, muito importante. Mas, em pista paralela, a barafunda das parcerias municipais estará produzindo reflexos nas assembleias e governos estaduais, por certo com casos de emaranhados difíceis para os governadores. E ainda, dado serem os municípios as bases dos deputados federais, com reflexos nas bancadas mais numerosas da Câmara.
A ideia de fragmentação partidária, decorrente sobretudo das múltiplas siglas vitoriosas nas capitais, é generosa ou otimista. Com o PSB aliado nacional do PT e adversário naquele ou no outro Estado, e assim em numerosas e variadas combinações e descombinações, fazia-se a estadualização dos partidos. Uma volta à República Velha, com os partidos de âmbito estadual. As eleições de agora consagraram a municipalização dos partidos: mais do que fragmentá-los, é retirar-lhes a identidade e o sentido pretendido no sistema partidário brasileiro.
Pode-se dizer que estas foram as eleições mais fisiológicas, ao menos no pós-ditadura. O interesse grupal libertou-se das últimas restrições conceituais e convencionais.
Nessa terra desmatada emerge uma ressalva: a linha oficial do PSOL é não fazer acordos eleitorais. Há, porém, uma corrente discordante, desde a chegada ao segundo turno do seu candidato em Belém, o vencido ex-prefeito Edmilson Rodrigues.
OUTROS SINAIS
A vitória de ACM Neto em Salvador, que foi também a derrota do governador Jaques Wagner, é insuficiente para dar algum oxigênio ao DEM. Não chega a afligir a direita, porque o PSD entra no jogo: seu desempenho, ainda que não seja de impressionar, é bastante para atrair-lhe nova leva de trânsfugas. Seu líder enrustido, José Serra, vai precisar disso, seja qual for o significado do "vamos em frente" de sua fala de derrotado. Se bem que fala dotada de alto teor fantasioso.
A campanha "limpa" que Serra ali se atribuiu foi a responsável pela mediocrização da disputa paulistana. Campanha "propositiva", mas só apresentado o seu "programa" a meio já da disputa de segundo turno. E sem sequer uma linha que os meios de comunicação pudessem elevar a manchetes.
O desempenho geral do PSDB, talvez melhor do que o próprio partido esperasse, foi importante como advertência ao PT vitorioso a despeito do julgamento no STF, e da exploração eleitoral dessa desvantagem sua. Mas, contraditoriamente, o PSDB sai da eleição com o pior problema: a necessidade de refazer-se enquanto há tempo.
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