O ESTADÃO - 18/01/12
Para atender aos novos critérios, cada entidade privada envolvida em convênio deverá comprovar pelo menos três anos de atividade no setor e isso será inscrito no sistema. As inovações deverão ainda facilitar o registro de irregularidades e o "acompanhamento e fiscalização dos convênios, contratos de repasses e termos de parceria". Está prevista a implantação de outros módulos até julho. O reforço do controle parece apreciável, mas a aprovação do novo cadastro vai depender do órgão responsável pela transferência. Na melhor hipótese, isso tornará mais claro o papel dos ministros e altos funcionários e esse requisito funcionará como um freio. Mas a melhor hipótese tem-se confirmado raramente quando se trata do uso de recursos públicos. Nesse caso, a pior hipótese é a aprovação de cadastros inadequados, com a continuação da patifaria.
A roubalheira por meio de convênios nunca foi interrompida, mesmo depois da implantação do Sincov, em 2008. O vigor da corrupção foi evidenciado mais uma vez nos escândalos ministeriais do ano passado. Alguns ministros foram demitidos e a presidente Dilma Rousseff assinou os Decretos 7.568, 7.592 e 7.641, no segundo semestre, para conter a sangria do Tesouro.
A ampliação das funções do Sincov é consequência dessa reação. Congressistas, no entanto, ficaram longe dessas preocupações e acrescentaram, por meio de emendas, R$ 967,3 milhões às verbas orçamentárias destinadas a convênios com entidades "sem fins lucrativos", elevando o total a R$ 3,4 bilhões.
Não há nada ilegal, em princípio, nesse tipo de manobra. Como usem ilegalidade - fraude, favorecimento pessoal, envolvimento de laranjas e outros tipos de banditismo -, ações como essa resultam frequentemente em desperdício de dinheiro federal e em mera apropriação de verbas públicas para interesses privados. Tudo se passa como se a festiva divisão da pizza orçamentária fosse um perfeito ritual democrático.
Não é preciso violar a lei, no Brasil, para fazer da privatização de recursos públicos uma festa permanente. Não há um só argumento razoável a favor da aberração chamada Fundo Partidário, num país onde os partidos são fartamente financiados com recursos particulares. Além do mais, organizações partidárias são entidades privadas, e igualmente privados são os seus componentes, exceto quanto exercem um mandato público. Mas o tal fundo existe legalmente e todo ano é inscrito no Orçamento-Geral da União. Para este ano está prevista uma verba de R$ 324,7 milhões para os partidos. Houve um acréscimo de R$ 100 milhões à proposta original do Executivo, graças à intervenção dos senhores parlamentares. A maior fatia,R$ 53,9 milhões, deve ir para o PT. A segunda,R$ 41,6 milhões, para o PMDB. Nada mais justo, devem pensar os parlamentares, do que o inchaço do fundo num ano de eleições.
Instrumentos como o Sincov podem ter alguma utilidade, assim como organismos de controle. O Tribunal de Contas da União e a Controladoria- Geral têm contribuído para a imposição de algum freio aos desmandos com dinheiro público. Apesar desse esforço, a malandragem continua sendo uma das grandes marcas da administração federal.
Com uma oposição inepta, uma base empenhada em proteger a ralé ministerial e um governo incapaz de renegar claramente a aliança com o fisiologismo, qualquer programa saneador só pode ter alcance limitado. Tem-se discutido, por exemplo, se o Ministério de Ciência e Tecnologia ficará com o PT ou voltará ao PSB, quando o atual ministro for transferido para a Educação. Que tal discutir, para variar, uma política séria de pesquisa e desenvolvimento para modernizar a economia e torná-la realmente competitiva? Posta nesses termos, a questão extrapola o compromisso com o fisiologismo. Mantido esse compromisso, o Sincov será pouco mais que um desodorante para o ambiente governamental.
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