Quando a objetividade evapora
HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 08/10/11
SÃO PAULO - No contexto de um problema aritmético ou de uma prova, ninguém se enganaria. Se João tem oito laranjas para vender e precisa fazer R$ 16 (R$ 12 para pagar as despesas de seu negócio e R$ 4 para sobreviver até o próximo mês), cada unidade terá de custar R$ 2.
Se, por um motivo qualquer, ele cobrou apenas R$ 1 dos quatro primeiros clientes, deverá comercializar os frutos remanescentes por R$ 3. Aqui não existe mágica. Os últimos compradores estarão subsidiando o desconto oferecido aos primeiros.
Basta, porém, que modifiquemos um pouco a situação, trocando as laranjas por ingressos para eventos e espetáculos, por exemplo, para que a objetividade evapore. Considera-se não só que a meia-entrada é um direito natural de estudantes e idosos como também que é por ganância que empresários tentam sabotá-la.
Está em ação aqui o que a psicologia evolutiva chama de viés anticapitalista: nossos cérebros, adaptados para a Idade da Pedra, rebelam-se contra os princípios mais elementares do funcionamento do mercado.
Em nossas cacholas, interesse público e cobiça privada são inconciliáveis. É só com muito treino que os estudantes de economia se livram da noção intuitiva (e errada!) de que para o empresário ganhar o consumidor precisa perder e que assimilam a ideia de que lidamos com interações de soma positiva e nas quais um vício privado (cobiça/busca pelo lucro) pode transformar-se em virtude pública (preços baixos e inovação).
Voltando à meia-entrada, se o Estatuto da Juventude for aprovado, jovens estudantes de até 29 anos serão agraciados com descontos de 50%. Como maiores de 60 já fazem jus ao mesmo benefício, o grosso da conta dos subsídios recairá sobre os pobres mortais na faixa dos 30 aos 59, uma fatia de apenas 18,5% da população.
É claro que o Brasil não deve subordinar sua soberania aos caprichos da Fifa, mas isso não implica que nossas leis façam sentido.
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