Devagar com o andor
CARTA AO LEITOR
REVISTA VEJA
Com Antonio Palocci, ministro da Casa Civil e principal articulador político do governo, nocauteado por uma acusação de enriquecimento ilícito e a presidente Dilma Rousseff paralisada pela inapetência pelo diálogo com parlamentares, eis que ressurge em Brasília um ex-presidente disposto, como sempre, a ignorar as liturgias e desprezar as instituições para chamar a si a resolução do que pintou como uma séria crise política. Mas que crise foi essa? A democracia periclitou? Estivemos à beira de uma guerra civil? A economia ameaçou desandar e destruir a prosperidade dos brasileiros? As fronteiras nacionais estavam sendo forçadas por um inimigo atroz e foi preciso recorrer ao único personagem capaz de unir o país para organizar a defesa da pátria? Não. Nada disso. O Brasil vive um momento raro de estabilidade política, paz social e prosperidade econômica. Nem impasse real houve em Brasília. O objeto de discórdia, o novo Código Florestal, ainda vai ser examinado pelos senadores da República e, em nosso sistema presidencialista de cunho imperial, caso algo no texto final desagrade à governante, ela simplesmente poderá vetar o artigo produzido pela impertinência do Legislativo.O que se viu em Brasília foi a fabricação de uma crise pelo lulopetismo, que aproveitou uma derrota do Executivo na Câmara dos Deputados, desfecho normal nas democracias, para fazer tempestade em copo d"água. De tão fora do contexto, a crise parece ter sido criada por encomenda para que Lula fizesse uma rentrée barulhenta e inconveniente para o bom funcionamento das instituições -mas satisfatória para os donos dos votos no Parlamento. Foi a reafirmação do modus vivendi imposto a Lula depois do escândalo do mensalão e cujos termos nada republicanos ele aceitou alegremente em proveito próprio, de seu partido e da base alugada.
O Brasil anda tomando liberdades demais com a fina pátina de civilização que os melhores das gerações passadas conseguiram sobrepor aos ilusórios entusiasmos tropicais, experiências políticas ruinosas que, a exemplo do lulopetismo de agora, mal disfarçaram sua dependência de um Legislativo fisiológico, desprovido de princípios e pronto a criar crises para vender governabilidade. Lula foi recebido em Brasília pelos seus sóclos, capitaneados por José Sarney, presidente do Congresso. Não é tolerável que, ao mais leve baque em seu projeto de poder, o grupo político dominante se entregue à cínica negação das leis e ao atropelo das normas civilizadas. Foi para a casa de Sarney, onde Lula instalou seu balcão de ofertas, que se transferiram os poderes da República. Espera-se que apenas momentaneamente.
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