segunda-feira, fevereiro 01, 2010

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Cada coisa é uma coisa

O Estado de S. Paulo - 01/02/2010


Não adianta comprar roupa de astronauta para pesca submarina. Em outras palavras, cada produto é bom para aquilo para quê ele é desenhado. É até possível algumas adaptações darem certo, mas não é o ideal e existe sempre o risco de as coisas se complicarem. No mundo dos investimentos ou das aplicações financeiras não é diferente. Cada produto tem um perfil que o faz mais indicado para um determinado fim. Na hora de investir, o que precisa ser comparado são produtos similares. Aí o conhecimento detalhado de cada aplicação faz diferença, já que custos com administração, corretagens e comissões, além da carga tributária incidente, podem piorar o desempenho e comprometer a rentabilidade, como acontece atualmente com alguns planos de previdência privada abertos.

Ninguém espera altos rendimentos de uma caderneta de poupança; por outro lado, ninguém espera alta segurança de uma aplicação em derivativos de linhas de financiamento residencial para as classes D e E nos Estados Unidos. Se esta regra for respeitada, e a aplicação feita de forma criteriosa, todo investimento é bom, porque atende um objetivo específico para o qual aquele plano foi desenhado.

A atividade seguradora oferece entre seus produtos, basicamente, dois tipos de investimentos diretos: os planos de previdência privada aberta e os planos de capitalização.

Os planos de previdência privada aberta, ao longo dos últimos anos, se transformaram num dos melhores investimentos do mercado, desde que respeitada sua característica fundamental: ser um plano de longo prazo, no qual o Governo troca com o investidor uma redução proporcional na carga tributária pela manutenção do dinheiro por um prazo mínimo progressivo, antes do qual o saque da importância investida não só deixa de ser interessante, como se torna extremamente onerosa.

Assim, investir num PGBL ou num VGBL dinheiro que pode ser necessário no curto prazo, ou para o qual se espera uma alta rentabilidade num período menor do que dez anos, é escolher um investimento pouco apropriado.

Já os planos de capitalização são produtos com um desenho completamente diferente e altamente particular. Criados na França, estes planos encontraram forte apelo junto aos brasileiros em função de suas características básicas, que o tornam uma mistura de loteria com programa de investimento de médio prazo.

Se brasileiro não gostasse de jogo, o Governo não teria desenvolvido a coleção de loterias colocadas à disposição da população pela Caixa Econômica Federal e pelos Governos dos Estados.

De outro lado, a certeza de receber um valor certo, depois de um determinado tempo de aplicação, é uma ferramenta cômoda para a realização de uma série de ações, desde a compra de um novo automóvel até uma viagem, sem necessidade de grandes contas ou movimentos complexos para a desaplicação do dinheiro.

Por isso, é uma aplicação rotineiramente realizada por um amigo que é também um dos maiores economistas do País. Ele compra planos de capitalização para não se preocupar em dispor do dinheiro para finalidades específicas que tem em mente, num horizonte médio de dois anos. Com a vantagem de, ainda por cima, poder ser sorteado e aí ganhar uma bolada

De forma bastante simples, o plano de capitalização pode ser definido como uma loteria em que não há perdedores e isso o torna extremamente atraente para boa parte dos brasileiros. Afinal, o que pode ser mais gostoso do que jogar na loteria, não ganhar, mas, após um determinado período de tempo prefixado, ter parte do dinheiro jogado devolvido com juros?

Atualmente, os planos de capitalização vão muito além deste desenho e se prestam com boas vantagens competitivas para viabilizar uma série de promoções, o que tem feito com que sua procura cresça regularmente, à medida que estas alternativas vão se tornando mais conhecidas.

O que é preciso se ter claro é que cada coisa é uma coisa e que não adianta querer levar vantagem comprando a coisa errada.

*Antonio Penteado Mendonça é advogado, sócio de Penteado Mendonça Advocacia, professor da FIA-FEA/USP e do PEC da Fundação Getúlio Vargas e comentarista da Rádio Eldorado.

CONRADO HÜBNER MENDES

Onze ilhas

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/02/10


O STF (Supremo Tribunal Federal) teve uma agenda politicamente delicada em 2009. Chegaram ao tribunal casos que envolviam a antiga Lei de Imprensa, a demarcação de terras indígenas, a extradição de dissidente político, entre muitos outros temas de menor visibilidade pública.
Suas decisões provocaram reações várias na mídia, tanto na defesa quanto no ataque. Raramente, porém, essas reações se preocuparam em ler com cuidado o que foi dito nas decisões. Colaboraram, assim, para um diálogo de surdos. Não confiaram na própria capacidade de argumentar nem na disposição do STF de ouvir.
Uma pena que não estejamos debatendo os argumentos utilizados pelo STF. Eles são diversos. Em regra, têm estilo prolixo e arrevesado. Constituem peças clássicas do bacharelismo beletrista.
Se tentarmos levar os argumentos do STF a sério, porém, esbarramos numa outra dificuldade: argumentos "do tribunal" quase nunca existem, exceto por obra de uma metáfora. Não há, exceções à parte, razões compartilhadas pela maioria dos ministros, razões que, boas ou ruins, pudéssemos generalizar como do tribunal.
Se perguntarmos por que o STF decidiu um caso numa determinada direção, não raro ficamos sem resposta. Ou melhor, ficamos com muitas respostas que nem sequer conversam entre si, expressas nos votos dos 11 ministros. E por que isso deveria nos preocupar?
Comecemos pela compreensão do propósito de uma corte colegiada, uma empreitada coletiva cujo resultado pretende ser melhor que a soma das opiniões individuais.
Esse ganho só se concretiza quando os membros de tal órgão firmam o compromisso ético de se engajarem numa deliberação genuína. Requer atitudes que não são fáceis de pôr em prática. Exige, de cada um, disposição para duvidar de suas convicções iniciais, vontade de minimizar o desacordo e o reconhecimento da importância de uma opinião institucional coesa, fundada em razões claras.
Praticantes da deliberação escutam tanto quanto falam e não se importam em ser persuadidos. Formam um time que joga em conjunto, sem estrelismos individuais. São colegas, não adversários. Cooperam, não competem. Respeitam o direito ao voto vencido e concorrente, justificáveis se produtos do desacordo autêntico, não de vaidade ou preciosismo.
Um tribunal, se pretende construir uma jurisprudência vigorosa, que sirva de bússola para o regime democrático, precisa almejar uma deliberação assim ambiciosa.
Nossa jurisprudência constitucional, contudo, é quase obscurantista, refém das idiossincrasias enciclopédicas de cada um dos ministros do STF e facilmente manipulável pela retórica advocatícia. Fragiliza nossa linguagem dos direitos fundamentais, que permanece desguarnecida de uma casuística coerente nas decisões do Supremo.
O voto do ministro Peluso no caso em que o jornal "O Estado de S. Paulo" alegava ter sido censurado, por exemplo, menciona essa patologia da corte, mas não se posiciona a respeito dela. Não se incomoda com a frequente ausência, nas suas palavras, de uma "pronúncia coletiva", de uma "inteligência sistemática dos votos", de uma "verdadeira opinião da corte". Apenas constata ser esse hábito consequência de "singular modelo deliberativo historicamente consolidado".
Há tempos se instiga o STF a repensar seus ritos decisórios e hábitos deliberativos. As sugestões de reforma são antigas e não requerem mobilização legislativa, só ajustes internos.
O Supremo volta hoje ao trabalho, e essa seria uma boa meta para 2010.
A tarefa não é simples, nem seria correto responsabilizar os atuais ministros por tal prática. Estão seguindo uma tradição. No entanto, tradições podem ser submetidas a uma reflexão crítica transformadora.
O aperfeiçoamento da deliberação colegiada do STF contribuiria para a qualidade do debate público. E o Supremo se apresentaria não somente como autoridade que toma decisões a serem obedecidas, mas também como fórum que oferece razões a serem debatidas. Criaria uma oportunidade de reforçar sua legitimidade.
O STF não é infalível. Seus erros, assim como acertos, integram o processo de aprendizado democrático. Errando ou acertando, contudo, não pode se dar ao luxo de sonegar razões claras e colegiadas que possamos desafiar, recusar ou apoiar.
Não pode continuar a se proteger por trás de sua filosofia decisória "historicamente consolidada", de um emaranhado de opiniões individuais que não fazem, aparentemente, esforço para convergir.
A celebração de um tribunal "descolegiado", ao invocar passivamente tal tradição como álibi, é perniciosa para o Estado de Direito.
CONRADO HÜBNER MENDES é professor licenciado da Direito GV e da Sociedade Brasileira de Direito Público.

GOSTOSA

MARINA SILVA

Campus Party

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/02/10


Quando olhamos para o futuro, precisamos entender como a inteligência e o conhecimento são compartilhados hoje e para onde apontam. A revolução da tecnologia da informação provocou mudanças tão profundas que ainda não conseguimos entender para que lado faz pender a saga da humanidade.
Inútil buscar respostas lineares, pois felizmente faz parte dessa revolução o embaralhamento dos maniqueísmos. Entendi melhor isso na Campus Party, na última semana, em São Paulo. Quem poderia prever, poucas décadas atrás, a formidável expansão do universo das redes de relacionamento e troca de informação via internet?
A Campus Party é o grande evento dessa nova cultura digital. Chamada de "nerdstock", o que já revela certo preconceito, na verdade é um espaço de intensa participação, inclusive política, e de exercício de cidadania. O que mais me comoveu foi ter reconhecido naqueles jovens o mesmo inconformismo, generosidade e disposição para mudar o mundo que em outras gerações se manifestavam de outras formas.
Encontrei-me com Lawrence Lessig, um dos fundadores da "Creative Commons", ONG que promove o acesso criativo a obras intelectuais por meio de licenças jurídicas que permitem a qualquer criador dizer o que pode ou não ser feito com suas obras. Nossa conversa ajudou-me a avaliar a importância da internet para que a cultura seja um bem de todos.
Participei também de uma iniciação digital -o batismo digital- e de um evento bastante heterodoxo, a desconferência, onde convidado e plateia estão quase no mesmo nível de protagonismo e a conversa toma o rumo que essa interação permite. As perguntas e manifestações não foram diferentes do que tenho ouvido Brasil afora. Dois focos importantes de perguntas foram sobre como fazer para que informações de interesse público estejam disponíveis de forma ágil e com credibilidade, e como ter maior transparência no setor púbico.
Durante o percurso entre os campuseiros, conduzida por Juliano Spyer e João Ramirez, tive a sensação de estar entrando numa mata densa, cheia de boas surpresas e riscos, onde deleite e perigo têm uma linha tênue de separação. Lugar onde a prudência aconselha a companhia de um bom mateiro.
João e Juliano deram um show como mateiros. Sempre repito as palavras de Edgar Morin, de que para sair da crise em que nos encontramos é necessário promover o diálogo de saberes. Na Campus Party, me senti o tempo todo praticando esse preceito. E sentindo como ele é fundamental e empolgante.

FERNANDO DE BARROS E SILVA

Que esquerda é essa?

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/02/10

SÃO PAULO - Como retrato da esquerda, o Fórum Social Mundial nos oferece uma imagem melancólica. De um lado, o evento, encerrado ontem, se presta a ser um palco de aclamação do lulismo; de outro, reitera sem mais dogmas anticapitalistas, fazendo tabula rasa do legado ruinoso dos experimentos coletivistas do século 20.
Em sua 10ª edição, o fórum agrega uma esquerda que transita entre o novo pragmatismo e a utopia de antigamente, sem que se detenha na crítica de nenhum dos polos. Adesista e fundamentalista ao mesmo tempo, essa esquerda age como quem quer usufruir todos os benefícios possíveis deste mundo (lulista), sem prejuízo de manter intacto o clichê do "outro mundo possível".
Entre o radicalismo vazio e o apego ao poder, haveria uma trilha menos cômoda. Algo como o compromisso com a redução das desigualdades, com o combate à corrupção em todas as suas formas e a defesa da democracia e do pluralismo -tudo combinado numa perspectiva reformista, que se paute pelo realismo sem abrir mão de princípios.
Não é isso, como se sabe, o que seduz os funcionários da utopia. Mas que esquerda é essa que vira as costas aos estudantes venezuelanos e não se manifesta contra a escalada autoritária de Chávez? Que esquerda é essa, para quem o mensalão não existiu ou acha que "a vida é assim mesmo"? Que esquerda é essa, capaz de defender a barba de Fidel Castro e o bigode de José Sarney?
Não há dúvida de que existe uma maioria bem intencionada entre os participantes do fórum. Mas o evento se tornou coisa de profissionais. Com raríssimas exceções, os intelectuais que contam não perdem mais tempo por lá. Restou um lúmpen "pensante" que fez do fórum o seu negócio. Gente, aliás, que cansou de esperar Godot e hoje enche as burras à custa do lulismo. São parasitas do Estado que adoram ressuscitar o fantasma neoliberal diante de plateias embasbacadas para manter viva a sua boquinha. Será possível ainda ser de esquerda sem parecer idiota ou espertalhão?

LAVANDO A XERECA

RUY CASTRO

Morrer de prazer

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/02/10

RIO DE JANEIRO - No outro domingo, o Mais! pediu aos entendidos que citassem sequências marcantes do cinema. O resultado apontou as inevitáveis -a da escadaria em "O Encouraçado Potemkin", a da morte de Annie Girardot em "Rocco e Seus Irmãos", a do corte do osso para a nave em "2001"- e outras menos lembradas, todas de filmes "clássicos".
Fui um pouco discrepante, escolhendo uma sequência de "O Homem do Sputnik", uma chanchada nacional, gênero extinto há 50 anos e ainda meio visto como vira-lata, mas de encantos mil para mim e para o Sérgio Augusto. Poderia ter citado também Oscarito e Grande Otelo como Romeu e Julieta em "Aviso aos Navegantes" (1951).
O duro é escolher uma sequência entre milhares. Talvez por óbvias, ninguém se lembrou de Gene Kelly cantando na chuva ou de Dooley Wilson carbonizando corações com "As Time Goes By" em "Casablanca". Mas, e Harold Lloyd escalando o edifício e se pendurando no relógio em "O Homem-Mosca" (1923)? E Maurice Chevalier saindo para a farra em "A Viúva Alegre" (1934)? E o duelo a espadas entre Stewart Granger e Mel Ferrer em "Scaramouche" (1952)? E a luta a socos entre Alan Ladd e Van Heflin, em meio aos cavalos, em "Os Brutos Também Amam" (1953)?
E o que dizer da sequência inicial de "Meu Tio" (1958), com os meninos e os cachorros pelas ruas? De Silvana Mangano com água pelas pernas em "Arroz Amargo" (1949)? Da primeira aparição de Orson Welles em "O Terceiro Homem" (1949)? De Cyd Charisse descobrindo o capitalismo em "Meias de Seda" (1957)? Ou de Mario Reis, maravilhoso, cantando "Cadê Mimi?" em "Alô, Alô, Carnaval!" (1935)? E muitas mais.
Hoje, com o DVD, é possível assistir a essas e a todas as outras numa única sessão. Corre-se apenas o risco de morrer de prazer.

TODA MÍDIA - NELSON DE SÁ

China vs. EUA

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/02/10


Manchete do "China Daily", "Ministro do exterior cobra que EUA parem de vender armas a Taiwan". Diz que o negócio "fere a segurança nacional da China e os esforços de reunificação pacífica" com Taiwan.
No também chinês "Global Times", "China suspende as visitas militares com os EUA". O ministério da defesa fala em "dano severo" e "indignação".
Ainda no "China Daily", o artigo "Responda quando atacado" descreve o negócio como "despertador" para o país, que "não pode ignorar os valentões" [bullies]. "A China ainda é fraca, econômica e militarmente, comparada aos EUA. Mas uma mensagem tem que ser enviada: De agora em diante, os EUA não devem esperar cooperação da China num amplo espectro de questões regionais e internacionais."
Foi manchete on-line no "Financial Times", "China ameaça EUA", e no "New York Times".

De Davos, no "Wall Street Journal", a consultoria Eurasia Group avisou que o confronto "só vai piorar" e que os perdedores serão as empresas americanas. "Os vencedores serão o Brasil, a potência emergente da América do Sul, e a Índia."

OUTRO MUNDO
A "Newsweek" dá longo artigo de Nader Mousavizadeh, do londrino International Institute for Strategic Studies, avisando que "o mundo que criou o 'eixo do mal' acabou, quanto mais cedo Washington reconhecer, melhor". Diz que "Brasil, Turquia, Rússia, China: nenhum faz segredo da resistência à diplomacia americana anti-'rogue states'". Resistem à escalada contra o Irã.
Na sexta, o Departamento de Estado dos EUA cobrou sanções da China contra o Irã. E ontem o Departamento de Defesa, destaque no "New York Times", já começou a posicionar mísseis no golfo, diante do Irã.

CONSENSO DE PEQUIM
De Davos, Thomas L. Friedman, ontem no "NYT", sob o título "Nunca ouvi isso antes", relata que a "instabilidade política" dos EUA foi tema recorrente no Fórum. E cita "outra frase que nunca ouvi antes: o Consenso de Pequim está substituindo o Consenso de Washington?". Em suma, a estabilidade "confúcio-comunista" já seria vista como alternativa. Friedman acha que não. E que o problema é a divisão partidária em Washington.

RECESSÃO HUMANA
Sob o título "Mercados emergentes tomaram o palco central em Davos", o "WSJ" resumiu o evento opondo as perspectivas divergentes de EUA e Brasil -expressas por Lawrence Summers e por Guido Mantega.
O conselheiro de Obama vê "recuperação estatística, mas recessão humana" nos EUA. O segundo "desenhou um dos melhores cenários" e afirmou que "o crescimento já está forte o bastante para retirar parte do estímulo".

NÃO É O ÚNICO
A "Economist" antevê, para a semana, uma operação de "resgate" [bail-out] da Grécia pela União Europeia. E "não é o único país da eurozona com finanças cambaleantes".

POR OUTRO LADO
No canal CNBC, no final da semana, o chefe da OCDE, o "clube dos ricos", declarou que "há risco de uma bolha de papéis em lugares como o Brasil ou a Índia e temos que ser cuidadosos". Insistiu que "é uma ameaça real".

SEQUESTRO DE CRIANÇAS
Por aqui, foi manchete no site da Reuters Brasil, mas mal noticiado por outros, "Haiti prende norte-americanos que deixavam o país com crianças". Os dez americanos tentavam sair do país com 33 crianças e são "suspeitos de participar de esquema ilegal de doações".
Nos EUA, Drudge Report e Huffington Post postaram a notícia no alto das páginas iniciais, com agências. Mas o "NYT" também mal registrou.

"AMAZONGATE"
O conflito entre "céticos" do aquecimento global e seus proponentes divide a mídia londrina. Depois que o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), da ONU, admitiu que as geleiras do Himalaia não vão acabar até 2035, surge agora um "Amazongate", como apelidou o conservador "Telegraph".
Questiona os dados do IPCC prevendo desaparecimento de "até 40%" da floresta, com o aquecimento. No progressista "Observer", o ministro do meio ambiente declarou "guerra aos céticos".

JAPA GOSTOSA

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Boticário se prepara para venda direta

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/02/10


A empresa de franquias de cosméticos O Boticário se prepara para iniciar vendas porta a porta. A Folha apurou que, no segundo semestre de 2009, a empresa fez seleção para contratar profissionais de concorrentes do ramo de cosméticos e de companhias especializadas em vendas diretas de outros produtos, com a intenção de abrir um novo canal de vendas. Especialistas do mercado de venda direta afirmam que ainda não se sabe se O Boticário lançaria uma nova marca para vender produtos porta a porta ou se o próprio nome da empresa seria aproveitado. Questionado sobre a intenção de iniciar o projeto, o presidente do Boticário, Artur Grynbaum, nega. "Sempre buscamos complementar nossos quadros para reforçar o modelo de franquias. Não temos planos de vendas diretas. Gosto de estudar a venda direta, assim como gosto de estudar todos os canais de distribuição." Segundo a Folha apurou, a empresa realizou processo seletivo sigiloso, em que se identificava apenas como uma multinacional brasileira de bens de consumo. Havia vagas para atuar na área de vendas diretas, na região Sul, onde está localizada a sede do Boticário. Um profissional do mercado, que pediu para não ser identificado, informou que a contratante seria uma empresa do grupo Boticário chamada GKDS Cosmetics. O mercado vê com otimismo a entrada da empresa no segmento porta a porta. "Desconcentraria o mercado, hoje baseado em dois grandes "players", Natura e Avon", afirma Marcelo Pinheiro, da DirectBiz Consultants, consultoria especializada em venda direta. Nesta semana, a empresa inaugura um centro de distribuição com investimentos de R$ 85 milhões, em Registro (SP). O novo empreendimento aumenta em mais de 100% a capacidade de distribuição da marca. Tem 30 mil m2 de área construída e capacidade de expedição de 700 caixas por hora. A marca também investirá na ampliação da fábrica, em São José dos Pinhais (PR). A empresa tem hoje mais de 900 franqueados na rede. Em 2009, foram inauguradas 150 lojas, que totalizaram mais de 2.800 pontos no país.

CACHECOPA
De repente, aqui e ali, surgiram nos saguões do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, pessoas de diferentes nacionalidades com cachecóis nas cores azul, amarelo, verde, vermelho e branco. Era uma iniciativa da delegação sul-africana para divulgar a Copa do Mundo de 2010.

ASAS
Guilherme Paulus, dono da Webjet, recebeu proposta de compra de parte da empresa pela aérea irlandesa Ryanair, segundo a Bloomberg. As conversas devem ser retomadas a partir de março, quando está prevista a promulgação de nova lei para ampliar a participação permitida de estrangeiros em aéreas nacionais. No início de janeiro, o fundo americano Carlyle comprou a CVC, fundada por Paulus.

EM GRUPO
Novos negócios estão nascendo entre Dubai e Brasil. Dez universitários brasileiros e oito jovens dos Emirados Árabes Unidos formaram grupos mistos que desenvolveram planos de negócios apresentados ontem a um júri. Até março, os grupos detalharão os projetos e apresentarão em Dubai, de onde sai um vencedor para competir pelo prêmio de US$ 20 mil, que será investido no negócio ou em estudos. O projeto é patrocinado por Al Ahli Group -conglomerado dos Emirados. No Brasil, teve parceria da Universidade Quantum.

DIRETO DE DAVOS

Diretor do Itaú Unibanco espera aumento de regulação no setor


"Uma mudança vai haver. Temos que estar preparados. Vai ter que ter mais regulação [no setor financeiro], capital mínimo regulatório, novas regras de contabilidade para os bancos, além dos modelos de remuneração dos executivos." A opinião sobre as propostas do presidente Obama é de Ricardo Villela Marino, diretor-executivo responsável pelas unidades externas e pela área de pessoas do Itaú Unibanco. "Há uma tendência de taxar, de colocar mais regras. É uma medida popular que dará votos. Mas vai ter que passar pelo Congresso", disse. "Será algo mais alinhado com o interesse dos acionistas a longo prazo e ajustado ao risco." Marino frisa, porém, que é importante distinguir o que ocorre nos EUA e no Brasil. "É diferente. Nos EUA, houve falhas na gestão de risco, nas companhias que dão "rating", excesso de alavancagem do consumidor americano que, no final, teve de pagar a conta." Marino disse que participantes do Fórum Econômico Mundial neste ano estão "mais aliviados que em 2009. Mas, sabem que têm muito a fazer para evitar recessão de fundo duplo". Villela Marino teve encontros com importantes banqueiros estrangeiros no Fórum suíço. Com relação ao setor financeiro no Brasil, Marino diz que neste ano haverá crescimento da reversão de provisões que os bancos estão fazendo e queda da inadimplência em relação a dois anos anteriores.

Investimento substitui consumo, afirma HSBC

Os países emergentes despontaram como importantes responsáveis pelo restabelecimento da economia global durante a crise, segundo relatório do HSBC divulgado em Davos, com base em estudo sobre os mercados emergentes em 2009. "O Brasil está entre as nações emergentes que estão indo realmente muito bem", afirma Stephen King, economista-chefe do grupo HSBC. "Os preços das principais commodities voltaram a subir rapidamente, o que ajudou muito o país." De acordo com King, o investimento pode estar gradualmente substituindo o consumo como componente que mais contribui para o PIB. O ano de 2010 pode reproduzir o padrão de crescimento da demanda doméstica visto em 2007 e 2008. A inflação é citada como fator que merece atenção. "Apesar da recuperação consistente, revisamos nossa expectativa de inflação para este ano de 5% para 4,6%. A piora vista na inflação ainda não é suficiente para elevação de juros neste primeiro trimestre. Mas as chances de isso ocorrer crescem especialmente se não houver um aperto fiscal em 2010."

com JOANA CUNHA e ALESSANDRA KIANEK

ANDRÉ GERDAU

O desafio das multinacionais brasileiras

O Estado de S. Paulo - 01/02/2010


Quem folheasse uma publicação econômica internacional dez anos atrás raramente encontraria uma menção a companhias brasileiras. Hoje, esse cenário é completamente diferente, já que empresas nacionais se destacam mundialmente em distintos segmentos da economia. Essa capacidade competitiva foi influenciada pelas décadas de instabilidade econômica no Brasil. Baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), inflação alta, mudanças de moeda e sucessivos pacotes econômicos fizeram com que os empresários se tornassem especialistas em buscar soluções em ambientes adversos.

Além disso, a incerteza econômica também levou empresas brasileiras a buscar e adaptar as melhores referências mundiais em tecnologia de gestão à sua realidade de negócios. Esse esforço não somente permitiu a sobrevivência das companhias em um cenário difícil, mas as tornou capacitadas a competir em pé de igualdade com seus concorrentes globais.

Portanto, as múltis brasileiras possuem em seu DNA a busca permanente pela competitividade, independentemente das dificuldades encontradas. É isso que fez com que 14 empresas do Brasil, entre elas, a Gerdau, fossem listadas entre as 100 companhias de países emergentes consideradas "desafiadoras", segundo pesquisa divulgada pelo Boston Consulting Group em 2009. Essa posição coloca o País em terceiro lugar no ranking, atrás apenas da China e da Índia. No caso da Gerdau, seu processo de internacionalização teve início em 1980 e, atualmente, a companhia é líder na produção de aços longos nas Américas e uma das maiores fornecedoras mundiais de aços longos especiais para a indústria automotiva, com presença industrial em 14 países.

Outro ponto forte que auxiliou as multinacionais brasileiras a superar os momentos de crise em 2009 foi a mobilização das equipes para realizar os ajustes e as reduções de custos necessários ante à nova realidade do mercado. Soma-se a isso a habilidade dos brasileiros em se adaptar às oscilações do ambiente e a diversidade cultural que forma a identidade do nosso povo. A nossa diversidade permite, por exemplo, que os brasileiros tenham especial talento em harmonizar diferentes culturas, principalmente quando se tem equipes em países diferentes. A capacidade de mobilizar, portanto, se dá, na maioria das vezes, pela busca da conciliação de pontos de vista e da construção de metas comuns. E não pela imposição.

Agora que o mercado brasileiro começa a responder com maior demanda e se percebe uma gradual retomada nos mercados internacionais, o desafio é a otimização das operações e a manutenção dos ganhos de sinergia obtidos durante os períodos difíceis. Sem dúvida, o enfrentamento da crise deixa muitas lições que podem servir de base para a melhoria da gestão das empresas, como, por exemplo, a capacidade de diagnosticar o momento em que a organização se encontra perante o conhecido ciclo "preservação-otimização-crescimento".

Num primeiro momento, para superar os desafios, foi necessário direcionar os esforços para a preservação da saúde financeira do negócio, focando na manutenção do caixa e da liquidez, sem descuidar da principal razão da existência das empresas: o cliente. O segundo passo, que é vivenciado atualmente, tem sido a otimização das operações, com a continuidade das sinergias conquistadas ao longo da crise e o aumento de produtividade. Após os ajustes e com os sinais de melhora do mercado, o crescimento deve ser alinhado à realidade dos mercados de atuação, atualmente em níveis de recuperação distintos nas diversas regiões.

Nesse momento de retomada, as múltis brasileiras têm um novo desafio pela frente: ampliar sua competitividade e capacidade de inovação ante um mercado com demanda reduzida e competição cada vez mais acirrada. É preciso ter em mente que o empreendedorismo brasileiro tem conquistado espaço no mercado global. Porém, como toda conquista, exige um trabalho permanente, é necessário se renovar sempre, manter um olhar crítico, acompanhar as tendências e os movimentos da economia. Muitas empresas que eram líderes há 20 anos não existem mais. Logo, o sucesso de hoje não garante a permanência no mercado amanhã. Nosso DNA empresarial foi forjado na adversidade e, portanto, as empresas brasileiras têm condições de conquistar uma participação cada vez maior no cenário mundial dos negócios.

*André Gerdau é diretor-presidente da Gerdau e presidente do Instituto Latino-americano do Ferro e Aço (Ilafa)

GOSTOSA

MÔNICA BERGAMO

Santa de casa


Folha de S. Paulo - 01/02/2010

Descoberta com alarde entre os escombros da Capela das Mercês, em São Luiz do Paraitinga, a imagem de barro bicentenária de Nossa Senhora das Mercês grávida está esquecida na casa do dentista que a encontrou.

"O pessoal do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) foi lá em casa. Disseram que precisava esperar a imagem secar para encaminhá-la à restauração. Mas ninguém voltou", diz José Carlos Imparato, arqueólogo voluntário. A imagem rara preserva rosto praticamente intacto.

ANJINHOS
E os arqueólogos comemoram: o forro original da igreja também foi encontrado. "Quando a igreja foi restaurada, há alguns anos, não usaram o forro original. Ele ficou guardado. Agora, encontramos a tela debaixo de uma parede de tapuia", diz Imparato. Outra descoberta foram anjos de madeira policromada.

ACHADOS
O Iphan planeja fazer uma exposição na cidade com os anjos e outras peças raras que sobreviveram às inundações.

FAZER A HOMEPAGE
Em meio ao eleitorado "geek" da Campus Party, a ministra Dilma Rousseff passou boa parte do tempo defendendo downloads legais. Acomodou-se em um sofazinho com o ongueiro Larry Lessig, da Creative Commons, ídolo entre os que levantam a bandeira.

AMIGAS
Hoje pastora da igreja Renascer, Caroline Celico, mulher do jogador Kaká, está preparando um CD com participações especiais. Claudia Leitte gravará a sua nesta semana, cantando uma composição de Caroline sobre a amizade das duas.


"Ela assistiu a um DVD meu na casa de Dida, o goleiro, disse "tô apaixonada por Claudinha" e foi me procurar. Viramos confidentes", diz Claudia.

CORAÇÃO DE MENINO
O hospital infantil Cândido Fontoura, da zona leste de SP, deve ser o primeiro do gênero a ter uma unidade de cirurgia cardíaca. A ala, que será inaugurada em março, terá seis leitos de UTI e 11 na enfermaria. O custo de manutenção é de R$ 1 milhão por mês.

MALLU NA ESTRADA
A cantora Mallu Magalhães vai sair em turnê de seu novo disco em março. No dia 19, se apresenta no Auditório Ibirapuera e, em 9 de abril, canta no Circo Voador, no Rio.

MONTANHA RUSSA
O professor russo Boris Komissarov, da Universidade de São Petersburgo, vem a São Paulo em fevereiro para a abertura da exposição "Expedição Langsdorff", no Centro Cultural Banco do Brasil. Ele é um dos curadores da mostra que fala sobre a viagem do barão Georg Langsdorff pelo interior do Brasil entre 1821 e 1829.

ÂNGULO
A boate Heaven vai ter camarote no show da cantora Beyoncé, no dia 6 de fevereiro, no Morumbi. Por bufê, bebida à vontade, portão exclusivo e DJ, cobrará R$ 750 por pessoa.



"As mulheres vão agarrar o Zé na rua"

A socialite Maria Christina Mendes Caldeira, ex-mulher do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), réu do processo do mensalão, decidiu mudar o protagonista do livro que está escrevendo sobre sua convivência com os políticos: sai o ex-marido, entra o ex-ministro José Dirceu (também réu no caso). E diz que sonha ver a obra nas telas, com Rodrigo Santoro no papel do petista.

FOLHA - Está escrevendo sobre você e José Dirceu?
MARIA CHRISTINA MENDES CALDEIRA - Estou fazendo um livro que vai virar filme. Está praticamente pronto. Vai se chamar "A Tribo do Não-Dito".

FOLHA - Mas esse não é o nome do livro em que você iria falar sobre seu casamento com o deputado Valdemar Costa Neto?
MARIA CHRISTINA - Exatamente, porque a história da tribo do não-dito é a mesma. O Valdemar aparece como uma pessoa que me fez ser de completamente alienada politicamente a ter uma consciência política. Mas o personagem principal é o Zé, que vai da militância de esquerda para o meio, que é o fato de que não dá para realizar as coisas sendo nem do lado de lá nem de cá. Ele tem um histórico de militância, entendeu?

FOLHA - Qual é a sua relação com o ex-ministro?
MARIA CHRISTINA - Eu sou amiga do Zé. Ponto. Eu nunca tive nada com o Zé. A gente tem um romance platônico em algum mundo astral, entendeu? Mas eu acho ele uma pessoa admirável na coisa da inteligência. A gente tem um romance mental, vai. Pronto, é isso. Olha que eu vou te falar uma coisa: a mulherada morre de tesão pelo Zé. Elas todas disfarçam, mas essas moças da Daslu querem mais é um guerrilheiro na vida delas. Arriscaria que 70% da mulherada aí tem sonhos eróticos com o Zé Dirceu. Ele tem essa aura de mistério, é um Rhett Butler ["...E o Vento Levou"].

FOLHA - Você disse que a história vai virar filme.
MARIA CHRISTINA - Já tenho uns contatos superbons nos Estados Unidos. A coisa está evoluindo e o livro está bem legal. Mas pode ter certeza de que, depois desse filme, o Zé tá frito: todas as mulheres vão agarrar ele na rua. A mulherada vai ficar apaixonada pelo Zé.

FOLHA - Quem você gostaria que interpretasse seu papel?
MARIA CHRISTINA - Se for no Brasil, queria que fosse a Luana [Piovani], que é malcriada que nem eu, e é grandona. E um bom cara para ser o Zé é o Rodrigo Santoro, que inclusive era parecido com ele quando era moço. Pega umas fotos dele para ver! E o Valdemar... Valdemar eu acho que é um gênero, assim, meio Antonio Fagundes, porque o Valdemar já entrou velho na minha vida.

CURTO-CIRCUITO


HELENA RIZZO , do Maní, recebeu o prêmio chef do futuro da Academia Internacional de Gastronomia, em Paris.
A PREMIAÇÃO do concurso "Conexão Beauty Art", da Avon, acontece hoje, às 19h, no Porão das Artes, no Ibirapuera.
TEIXEIRA COELHO , curador do Masp, participa hoje e amanhã do seminário "Direitos culturais: natureza, implicações, desafios", que a ONU promove em Genebra.

MARCO ANTONIO ROCHA

A economia não preocupa, o governo sim

O Estado de S. Paulo - 01/02/2010


Tem razão o ministro Guido Mantega, da Fazenda. Ele teria dito, sobre a nossa economia, no Fórum Econômico Mundial de Davos, na semana passada, que "a preocupação, no Brasil, é se vamos crescer demais, ou não".

Mas isso nem deveria ser uma preocupação. Por que, então, qualificar de preocupação uma dúvida tão positiva, entre o bom e o melhor?

A questão já tem sido explicada por inúmeros economistas aos mortais comuns, como nós, e consiste no seguinte, em resumo: existe uma taxa de crescimento econômico que seria a ideal, situada na fronteira onde começa a pressão inflacionária. Ou seja, é preciso encontrar o ponto de equilíbrio entre desenvolvimento econômico saudável - com bom nível de atividade industrial, agrícola, de serviços, de criação de empregos, de melhoria da renda, de geração continuada de perspectivas favoráveis - e crescimento econômico descontrolado. O motivo é que esse último granjeia aplausos, suscita entusiasmo, mas é de curta duração. Logo a inflação se encarrega de entrar no palco e estragar o show, derrubando as expectativas dos empresários/investidores e, pior que isso, destruindo a confiança da população num futuro melhor.

O Brasil já passou por algumas fases de crescimento econômico pujante, seguidas de tormentos financeiros e esperanças frustradas.

Na segunda metade dos anos 50 tivemos anos de vacas gordas, principalmente no governo Juscelino Kubitschek, com efusivas demonstrações de confiança no futuro do Brasil, os "anos dourados", que desaguaram em grandes percalços econômico-financeiros ao longo dos governos Jânio Quadros e João Goulart. E quem pode afirmar que aqueles percalços não tiveram papel importante - talvez decisivo - no fracasso administrativo daqueles dois governos e na subsequente eclosão do autoritarismo militar que duraria mais de 20 anos? Foi apenas a alegada "ameaça comunista" que deu aos militares o suporte popular para apearem Jango do poder? O descalabro das contas fiscais, da inflação interna e da dívida externa não puseram o povo a favor deles?

Também no regime militar teríamos o famoso período do "milagre econômico", que, depois, em razão de sacolejos imprevistos da economia mundial, nos lançou na chamada década perdida dos anos 80, ao longo dos quais proliferou uma inflação feroz e planos de controlá-la ainda mais ferozes e perturbadores.

Mas, agora, deixando de lado paixões políticas e preferências eleitorais, que sempre turvam qualquer olhar crítico e qualquer análise, reconheçamos, todos - lulistas, petistas, fernandistas, tucanos, comunistas, socialistas, direitistas e que outros espécimes se nomeiem da variada fauna política nacional -, o fato indiscutível é que o Brasil navega, há mais ou menos 15 anos, em águas muito menos revoltas do que as do passado, no que diz respeito ao andamento da sua economia e, principalmente, da maneira de administrar a sua economia. Desde 1994, quando o presidente Itamar Franco, inspiradamente, aceitou aprovar e apoiar uma ideia aparentemente tresloucada, de pôr em andamento um plano em que o primeiro passo era uma moeda virtual - imaginem, que ninguém iria receber (!) - chamada URV, gestadora do real.

De lá para cá, a economia brasileira não cresceu só internamente, de maneira razoavelmente regular, sem trancos e barrancos, como o respeito por ela também cresceu no plano internacional, uma vez que - assim pensam nossos parceiros internacionais - a administração brasileira se tornou bastante responsável. Essa combinação providencial e já mais ou menos duradoura de sucesso no terreno do crescimento econômico saudável, com exemplos visíveis de responsabilidade governamental proativa e crescente (coisa que o governo da Argentina, por exemplo, não tem condições de exibir, nem o de Hugo Chávez), está dando ao Brasil aquela longamente almejada carteirinha de país confiável, necessária para sentar à mesa dos "players" decisivos.

Mas não exageremos na avaliação. A carteirinha de país "ponta-firme" é muito recente e pode ser provisória. Tudo depende da continuidade dos bons procedimentos e da perseverança na cartilha da boa governança. "Continuidade, para nós, é avançar" - teria dito este poço de sabedoria que se chama Dilma Rousseff. Depende. Avançar para onde? E com que objetivo? Poder-se-ia cobrar dela uma definição precisa - que ela não daria porque arriscaria perder votos.

O avanço que o Brasil tem de dar é na direção de consolidar sua imagem ponta-firme. Não tem sentido o mundo ocidental estar apostando na China - um país com um governo ditatorial, atrabiliário e nada confiável, com tradições culturais milenares, mas estranhas para nós, e uma língua impenetrável - e muito menos no Brasil. Por que isso acontece? É preciso pensar um pouco e tentar avaliar a raiz desse fato. Temos tantos politólogos, sociólogos e culturólogos palpitando na imprensa que bem poderiam investigar esse mistério.

Para mim, a explicação é simples: o governo da China não inventa nada, funciona by the book e fornece aos investidores ocidentais o que eles mais apreciam: segurança de regras. O do Brasil vive inventando regras. Mudando até as dele mesmo.

Então, voltando ao início, a preocupação não é se "vamos crescer demais, ou não", como dizia Mantega. A preocupação é saber o que este governo fará se a economia crescer perigosamente, a ponto de gerar inflação. A regra do manual é clara: aumentam-se os juros, restringe-se o crédito, reduzem-se os gastos públicos, elevam-se os impostos. Em suma, mete-se o pé no freio do consumo e da economia.

Portanto, a verdadeira dúvida é: esse governo demagógico, num ano eleitoral decisivo para o futuro do seu partido, vai fazer isso?

*Marco Antonio Rocha é jornalista

GOSTOSA

EVERARDO MACIEL

Direito do cidadão e anterioridade

O Estado de S. Paulo - 01/02/2010


A legislação tributária brasileira, ao contrário do que ocorre em outros países, ainda não sistematizou os direitos dos contribuintes, que se encontram esparsamente divididos entre normas constitucionais e legais. Certamente, no contexto de uma indispensável revisão do Código Tributário Nacional - excepcional peça jurídica, porém desatualizada -, seria recomendável reservar um capítulo específico para a sistematização daqueles direitos, em proveito de um maior equilíbrio nas relações entre o Fisco e o contribuinte.

No âmbito desses direitos, a Constituição prescreve os princípios da irretroatividade e da anterioridade, em virtude dos quais a lei não pode instituir ou majorar tributos em relação a fatos geradores pretéritos (art. 150, III, a) nem no mesmo exercício financeiro em que tenha sido publicada (art. 150, III, b).

São princípios universais, que estão associados às origens do Estado fiscal moderno e se inscrevem no domínio mais amplo da segurança jurídica orientada para a previsibilidade do que se pretende extrair da sociedade, a título de tributos, e para a garantia na consecução de expectativas legitimamente constituídas pelo cidadão e pela empresa.

A modelação da anterioridade, no caso brasileiro, segue um formato peculiar. À vedação de cobrança de tributos que tenham sido instituídos ou majorados no mesmo exercício se acrescenta a exigência da noventena (art. 150, III, c). Essa norma estabelece que a eficácia da lei tributária deve ser diferida para, ao menos, 90 dias da data de sua vigência.

O texto constitucional, todavia, admite muitas exceções no tocante à abrangência das vedações previstas no art. 150, III: as alíneas b e c não se aplicam aos impostos sobre o comércio exterior, ao IOF e ao imposto extraordinário a que se refere o art. 154, II; a alínea b não alcança o IPI e as contribuições sociais; e a alínea c não incide sobre o Imposto de Renda, o IPVA e o IPTU.

Excluir os impostos sobre o comércio exterior e o IOF das vedações ao princípio da anterioridade encontra, sem lugar a dúvidas, respaldo na natureza eminentemente regulatória desses tributos. De igual forma, não cabe cogitar da aplicação desse princípio ao imposto extraordinário, a ser instituído somente em caso de guerra externa.

Esse cipoal de regras responde por situações esdrúxulas. As alterações no Imposto de Renda ou na base de cálculo do IPVA e do IPTU somente produzem efeito se aprovadas até 31 de dezembro do exercício anterior, ainda que a circulação do Diário Oficial venha a ocorrer segundos antes do espocar dos fogos do ano-novo, conforme sustenta farta jurisprudência. Nessa hipótese, pode-se concluir que, de fato, não houve respeito ao princípio da anterioridade em sua concepção original.

O IPI, o PIS e a Cofins incidentes sobre bebidas admitem, à opção do contribuinte, regimes de incidência ad valorem ou ad rem, tendo por base, respectivamente, o preço do produto ou um valor fixo expresso em reais. Tendo o contribuinte optado por um dos regimes, é inevitável que qualquer aumento subsequente seja condicionado à observância da regra da noventena, pois é completamente descabido, por falta de fundamentação constitucional ou infraconstitucional, alegar que a possibilidade da opção afasta a aplicação da regra.

É verdade que o processo orçamentário brasileiro há muito tempo desandou completamente, convertendo-se em peça meramente formal. Esse quadro, entretanto, se torna ainda mais dramático quando articulado com as normas de anterioridade.

O Orçamento-Geral da União deve ser encaminhado ao Congresso Nacional até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro. Nesse período, contudo, desde que em consonância com as normas de anterioridade, podem ser instituídos ou majorados tributos. No caso, as receitas que informam o Orçamento devem ser revistas com repercussão sobre as despesas programadas. Mais grave: quando o Orçamento inclui receitas de tributos sujeitos à extinção antes do encerramento do exercício financeiro subsequente, como ocorreu com a CPMF, recorre-se à estranha figura da "receita condicionada", cuja supressão gera transtornos imprevisíveis.

Parece claro, portanto, que é necessário dar um novo contorno normativo à anterioridade. Relatório apresentado pelo senador Francisco Dornelles no âmbito de comissão especial de reforma tributária do Senado Federal, oferece uma solução para o problema: ressalvados os casos dos tributos regulatórios e extraordinários, só produziriam efeitos, em um exercício, as normas tributárias aprovadas até junho do exercício anterior. A proposta soluciona, com um só golpe, todas as assinaladas deficiências da anterioridade. Tornar-se-ia ainda melhor se pudesse abranger também as obrigações acessórias.

É certo que a proposição demandará emenda constitucional. Seu teor, todavia, é simples, em contraste com a miríade de propostas constitucionais tributárias que conseguem evidenciar a tese de que a capacidade de piorar é infinita.

*Everardo Maciel, consultor tributário, foi secretário da Receita Federal (1995-2002)

GUSTAVO GUIDA REIS

É público ou não?


O Globo - 01/02/2010

De nada adianta um computador sem propósito para utilizá-lo, sem programas nem acesso a dados de modo a se aproveitar a capacidade de processamento para realmente produzir algo.

Há poucos dias, o governo do Reino Unido demonstrou compartilhar deste pensamento e estreou uma iniciativa audaciosa, patrocinada pelo próprio inventor da internet, Tim Berners-Lee: um portal que centraliza os dados do governo britânico - data.gov.uk. A administração Obama também caminha para democratizar o acesso a informações e lançou recentemente um portal semelhante ao britânico (Data.gov). O mote utilizado é "Transparência, Participação, Colaboração" e traduz perfeitamente o objetivo proposto.

Por trás de ambas as iniciativas está o desejo de democratizar o acesso a informações e oferecer subsídios para indivíduos e empresas desenvolverem soluções a partir de tais informações. Com efeito, já começaram a aparecer no Reino Unido sites como o Fill That Hole (fillthathole.org.uk), que incentivam a população a denunciar vias cujo asfalto está deteriorado. Desconheço o modelo de negócios da empresa por trás do site e isso não vem ao caso no momento, o que importa é que, com iniciativas desse tipo, os cidadãos ganham em serviços que o governo não proveria por falta de foco ou prioridade.

No Brasil, o governo não compartilha a visão dos países citados acima e, salvo raras exceções, ainda trata informações públicas como se fossem suas, não enxergando que, nas mãos de pessoas e empresas criativas, tais informações gerariam frutos e benefícios para toda a sociedade. Um exemplo claro dessa visão retrógrada é a base brasileira de CEP, nas mãos dos Correios. Qual o grande segredo que impede que empresas tenham acesso gratuito e irrestrito a todos os endereços brasileiros?

Apesar das dificuldades, empresas e instituições conseguem romper as barreiras e prestar serviços à sociedade. É o caso do Transparência Brasil, que consolida informações dispersas e provê um verdadeiro mapa da corrupção nas mais diversas esferas governamentais. Outro exemplo é o site Help Saúde (helpsaude.com) - uma ferramenta de busca que lista gratuitamente todos os prestadores de serviços médicos do Brasil. Parte das informações foi adquirida do site do Ministério da Saúde, mediante um software específico de captura que demandou seis meses de desenvolvimento da equipe.

Não são todas as empresas com conhecimento e perseverança para perseguir uma ideia e conseguir implementá-la como foi o caso. Isso resulta num prejuízo incalculável à sociedade, que deixa de se beneficiar com serviços semelhantes que não chegam nem a nascer devido às dificuldades de acesso a informações do governo, informações essas que deveriam ser de fato públicas.

GOSTOSA

GEORGE VIDOR

Gás do Eike

O GLOBO - 01/02/10


Está prevista para maio a perfuração do primeiro poço exploratório de gás natural (tanto melhor se for encontrado petróleo também) do grupo EBX - leia-se Eike Batista - na Bacia do Parnaíba, em blocos situados no Maranhão. Os levantamentos sísmicos deram resultados positivos e, por isso, um dos investidores é a MPX, braço do grupo que cuida dos empreendimentos de energia elétrica.

A MPX é um dos vários projetos ambiciosos de Eike Batista. A companhia gera hoje apenas 23 megawatts em usina térmica a óleo no Amapá, mas tem planos para chegar a 10 mil megawatts (MW), dos quais efetivamente 1.500MW se tornarão realidade no ano que vem, quando estiverem prontas três termoelétricas a carvão, duas no Ceará e uma no Maranhão. Se a exploração dos blocos na Bacia do Parnaíba for bem-sucedida, a MPX construirá usinas térmicas a gás natural na região.

O grupo privilegiou inicialmente o carvão porque em breve também produzirá o mineral (na Colômbia e no Rio Grande do Sul) e, assim, não ficará dependendo de fornecedores nem dos humores do mercado internacional.

Depois do Nordeste, será a vez do Rio. A usina a carvão projetada pela MPX para o distrito industrial junto ao futuro Porto do Açu - a propósito, faltam apenas cem metros para ser concluída a ponte que entra mar adentro, dando acesso aos três píeres programados - terá uma capacidade de 2.100MW. A expansão do parque térmico será com uma usina gigante a gás natural (3.300MW de potência, a mesma das grandes hidrelétricas do Rio Madeira). O Estudo de Impacto Ambiental (EIA/Rima) dessa segunda fase ficou pronto e nas próximas semanas Eduardo Karrer, presidente da MPX, promete entrar com pedido de licenciamento no Instituto Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro (Inea). Se a OGX descobrir reservatórios de gás no litoral do Rio já terá garantido um bom cliente dentro do próprio grupo. Mas sempre existirá a alternativa de comprar gás de outros produtores ou importar GNL pelo Porto do Açu.

Para o Rio Grande do Sul, o projeto da MPX é de uma usina de 600MW.

Construir usinas térmicas, especialmente a carvão, no momento em que o mundo todo está com as atenções voltadas para o efeito estufa pode parecer inconsequência ou um pacto com o demônio. Entretanto, todos os projetos foram licenciados pelos órgãos ambientais pois não têm nada a ver mais com as velhas usinas a carvão. O avanço da tecnologia possibilitou às novas usinas não emitirem material particulado, nem enxofre ou nitrogênio em volumes relevantes. A emissão de CO2 ainda é inevitável, porém já existem atenuantes. O carvão mineral pode ser misturado a biomassa (madeira), em proporção de 10% a 15%, de modo que as usinas sejam conjugadas a empreendimentos florestais. A MPX resolveu também financiar pesquisas da Coppe/UFRJ, em parceria com universidades chinesas, que visam à redução e/ou captura de CO2 na geração de energia térmica.

De qualquer forma, além dos investimentos exigidos pela lei para compensação ambiental, a MPX decidiu financiar algumas unidades de conservação (como os Lençóis Maranhenses e áreas de Mata Atlântica no Rio).

Especificamente no campo das fontes renováveis, a empresa investirá em uma usina pioneira de energia solar, de 1MW, no interior do Ceará, e em 200MW de usinas eólicas (100MW no Ceará e 100MW no Rio).

A média de passageiros que utilizam a nova estação de Ipanema (Praça General Osório) do metrô do Rio é de 26 mil, dos quais 10 mil são novos usuários. Os demais 16 mil usavam antes outras estações. A expectativa da concessionária que opera o metrô é um aumento do movimento na estação para 30 mil pessoas por dia, com o fim das férias escolares.

O metrô do Rio ainda não se recuperou totalmente da situação traumática dos últimos dias de dezembro. Simultaneamente à inauguração da nova estação em Ipanema foi feita a interligação das linhas 1 e 2, mas nada saiu como o planejado. Os passageiros da linha 2, que deixaram de fazer baldeação para chegar ao Centro do Rio, tiveram de esperar mais pelos trens, o que levava os carros a saírem ainda mais cheios. E para agravar o desconforto, os termômetros passaram dos 40 graus centígrados, e o sistema de ar-condicionado dentro dos vagões não conseguia dar conta do recado. Os passageiros da linha 1 - especialmente os do trecho da Tijuca - se livraram da "invasão" na estação de transbordo (Estácio), mas sofreram também com a irregularidade nos horários.

Ou seja, o que era para melhorar acabou desagradando a quase todos. As falhas na operação estão sendo corrigidas e, com isso, a direção da concessionária espera reconquistar a boa vontade dos seus passageiros. Não é uma tarefa tão fácil, pois a melhora substancial dos serviços depende agora da chegada dos trens (144 carros) adquiridos na China, o que só ocorrerá em 2011.

Antes disso, será inaugurada, provavelmente em abril ou maio, uma nova estação (Cidade Nova).

O Metrô transporta entre 500 mil e 600 mil pessoas por dia. Com os novos trens, a atual malha poderá transportar de 1,1 milhão a 1,2 milhão de passageiros diariamente. E quando a extensão da linha 1 para a Barra da Tijuca estiver pronta (espera-se que antes da Copa de 2014), outras 260 mil pessoas deverão usar esse meio de transporte.

NAS ENTRELINHAS

O carro e os bois


Correio Braziliense - 01/02/2010

O PMDB não aceita ver Michel Temer na frigideira. Afinal, falta muito para a convenção que decidirá o destino do partido na eleição. É bom o PT se comportar se quiser manter o noivado.


O acontecimento político mais importante desta semana em que o Congresso retoma seus trabalhos não é nem a volta dos parlamentares, uma vez que estão todos preocupados em salvar a própria pele nas eleições de outubro. Os olhos da política estarão mesmosobre a convenção do maior partido do pais, o PMDB, que virá recheada de mensagens subliminares.
O deputado Eliseu Padilha (PMDB-RS), presidente da Fundação Ulysses Guimarães, conta pelo duas: “Coligação ou candidatura própria são assuntos para junho. Agora, vamos apenas eleger o diretório nacional. Defendo a candidatura própria a presidente da República, mas estarei na convenção para votar em Michel Temer”, diz Padilha. “O partido não permitirá que Michel seja ultrajado. Há um processo de tentativa de desconstrução política dele que não será aceito”, completa.

Sem, como diz o dito popular, “dar nome aos bois”, o PMDB tem uma lista de ações que, na opinião dos analistas do partido, reforçam a tese de tentativa de desconstrução de um de seus maiores líderes. Esse movimento, avaliam peemedebistas, começou quando Temer foi apontado como o nome para compor a chapa com a ministra.

Primeiro, uma nota publicada na Folha de S.Paulo, em dezembro. Dizia que a Polícia Federal tinha bala na agulha para obrigar a cúpula do PMDB a escolher outro nome como candidato a vice-presidente. Depois, uma lista apócrifa que teria sido apreendida durante a operação Castelo de Areia, que investiga a empresa Camargo Corrêa. Temer reagiu indignado. Cobrou explicações. No caso da tal lista, o nome dele ainda estava grafado errado.

Artesãos

Para o PMDB, essas notícias — somadas à declaração de Lula defendendo uma lista tríplice para que a ministra Dilma Rousseff escolhesse o candidato a vice — são parte do mesmo tapete de intrigas que o PT teceu contra o aliado em 2009. E, agora, com a chegada de 2010, os amigos de Temer desconfiam que há um grupo de petistas dedicado a uma nova tapeçaria para desconstruir Michel Temer. Antes que isso aconteça, o PMDB quer desmanchar essa trama na convenção.

De um modo geral, o PMDB vê no seu presidente um dos maiores fiadores da unidade que o partido anuncia aos quatro cantos. E qualquer discussão sobre o caminho dos peemedebistas nas eleições deste ano terá que passar por Michel Temer.

O PT sabe disso, mas, em conversas reservadas, petistas dizem que não dá para repetir o que aconteceu em 2002, quando o PMDB era parceiro de José Serra, então candidato a presidente pelo |PSDB. Na época, Henrique Eduardo Alves (RN) foi escolhido para o papel de vice. Por causa de um processo de separação judicial movido pela ex-mulher de Alves mencionar a possibilidade de recursos do deputado depositados no exterior, o potiguar terminou fora da chapa. A candidata foi a deputada Rita Camata. Alves demorou a reconstruir a sua imagem — hoje lidera a bancada na Câmara.

A cúpula peemedebista considera uma provocação só o fato de figuras do PT relembrarem esse episódio ainda que á boca-pequena. Afinal, Alves não está em questão e os tempos são outros. Por isso, o PMDB deixará claro desde já aos petistas que não quer ver Michel Temer na frigideira. E também fará aquela pose, do tipo, vamos devagar. Afinal, ainda falta muito para a convenção que decidirá o caminho do partido na eleição. Portanto, é bom o PT se comportar se quiser manter o noivado.

Os peemedebistas não podem simplesmente fingir não ver a movimentação do governador do Paraná, Roberto Requião, em defesa da candidatura própria. E, se o PT começar com muitas imposições para fechar a aliança, querendo atropelar os aliados, confiante apenas nas últimas pesquisas que mostram Dilma embalada como um trio elétrico, os peemedebistas podem se voltar à candidatura própria, ainda que hoje esse movimento seja improvável.

A inclinação pela aliança é real, até porque não dá para esquecer que o PMDB tem uma série de apartamentos de luxo no atual governo, como Minas e Energia, Integração Nacional, Comunicações. Mas, o partido considera importante, diante do quadro atual, manter algum recurso aplicado na candidatura própria, como um seguro eleitoral. Como disse a pré-candidata Dilma, não dá para colocar o carro na frente dos bois. E o PMDB hoje está convencido de que o melhor mesmo é manter um pouco de mistério.