O GLOBO - 01/10
Não havia pior dia para se divulgar os dados fiscais de agosto. Ontem, o Banco Central também divulgou o Relatório Trimestral de Inflação. A nova tese do BC, que até agora ninguém entendeu, é que a política fiscal caminha para a "neutralidade" É uma forma de dizer que os gastos vão parar de subir e de realimentar a inflação. Pois, em agosto, o governo teve deficit primário.
O superávit primário vem minguando, mas agora foi pior: houve deficit primário. Não se sabe de onde o BC tirou a ideia de que os gastos do governo serão neutros porque, ao mesmo tempo, o Relatório de Inflação deixou a entender que os juros vão continuar subindo além do patamar atual de 9%. Diz o texto que mesmo que os juros subam para uma média de 9,89% ao ano, — cenário de mercado — nem mesmo no terceiro trimestre de 2015 o IPCA voltará para o centro da meta. Durante todo o governo Dilma e três trimestres do próximo período presidencial, a inflação não estará no centro da meta.
A inflação em 12 meses está em 6,09%, o que é 0,85% mais alta do que estava em agosto de 2012. Parece pouca diferença, mas os preços que o governo controla estão em 1,27% (2,5 pontos percentuais abaixo do ano passado, na mesma época) e os preços livres estão em 7,64%. Alimentos e bebidas estão em alta de 10,45%. Conclusão: a inflação só não está maior porque o governo está reprimindo os preços de tarifas públicas.
No relatório, a previsão de crescimento do PIB deste ano caiu de 2,7% para 2,5%. O herói do PIB foi a agropecuária que cresceu, 14,7%. O BC avisou que o PIB continuará em 2,5% nos primeiros dois trimestres do ano que vem. Ou seja, a economia, que estava começando a melhorar o ritmo, vai parar de acelerar, mas será um crescimento, segundo o BC, puxado menos pelo consumo e mais pelos investimentos e comércio exterior.
Na entrevista coletiva após a divulgação do Relatório, o diretor do Banco Central Carlos Hamilton afirmou que ainda "há muito trabalho a ser feito pela política monetária". O mercado entendeu que o relatório e essas palavras estão dizendo que a Selic poderá romper a barreira dos 10%. Mas será que o BC terá autonomia para subir juros em um ano eleitoral?
Pela manhã, Hamilton disse que há condições para que a política fiscal deixe de ser expansionista e se torne neutra. Essa é a mesma tese que estava na última ata do Copom. Os números têm mostrado um cenário diferente. À tarde, o próprio Banco Central divulgou que no mês de agosto o setor público registrou deficit primário de R$ 432 milhões. No ano, a economia para pagamento de juros é de R$ 54 bilhões, ou 1,73% do PIB, resultado muito menor que os R$ 74 bi economizados no mesmo período do ano passado.
O processo de desmonte da credibilidade fiscal do governo segue a pleno vapor. Segundo a consultoria Rosenberg Associados, de janeiro a agosto, as despesas primárias (que descontam o pagamento de juros) cresceram 5,8%. Houve alta de 14,5% nos gastos de custeio, de 6,5% nos gastos com previdência, e queda de 6,7% nos investimentos. O deficit nominal (medida que inclui o gasto com os juros) subiu a 3,17% em 12 meses até agosto, contra 2,47% do mesmo período do ano passado.
Dos números do relatório, um impressiona particularmente: o superávit comercial em 12 meses está em US$ 2,5 bilhões; em agosto do ano passado o acumulado em 12 meses era quase dez vezes mais: US$ 23 bilhões. O deficit em transações correntes (conceito mais amplo de contas externas) está em US$ 57,8 bi em oito meses. No ano passado, era de US$ 31,5 bi. Isso não é o fim do mundo, mas a conclusão é que o governo Dilma coleciona números medíocres ou preocupantes na economia.
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