ZERO HORA - 09/10
Com a mesma franqueza que utilizou no célebre puxão de orelhas às autoridades brasileiras, quando causou indignação nacional ao dizer que o país merecia um pontapé no traseiro para se mobilizar e agilizar as obras da Copa, o secretário-geral da Fifa voltou a responsabilizar os governantes por atrasos e improvisos. Disse o senhor Jérôme Valcke, em sua passagem por Porto Alegre, que o Mundial só será realizado em 12 praças esportivas porque o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva solicitou e que isso multiplica o número de problemas potenciais. Lembrou ainda, numa atitude defensiva em relação às recentes manifestações de rua com protestos focados na Fifa, que o Brasil é que pediu para realizar a competição, devendo, por isso, assumir responsabilidades sobre investimentos. Por fim, admitiu o executivo que a Fifa está consciente de que terá de conviver com o improviso e com projetos inconclusos, mas espera que haja um mínimo de organização nesses rearranjos.
Segundo Valcke, a Fifa já aprendeu uma lição com o Brasil, depois de ver a contrariedade de parcela da população com os gastos da Copa. Nos próximos Mundiais, exigirá que o parlamento do país-candidato chancele o pedido presidencial, para que os cidadãos se sintam efetivamente representados por quem decide. Embora com mais elegância do que na crítica anterior, o homem poderoso da Fifa voltou a tocar num ponto frágil do empreendimento brasileiro, que é a relutância dos governantes em assumir suas responsabilidades. Observe-se, por exemplo, a manifestação do ministro do Esporte, Aldo Rebelo, integrante da mesma comitiva que inspecionou o Estádio Beira-Rio, na última segunda-feira. Rebelo disse que as manifestações contra a Copa foram uma criação da mídia, que queria atirar o povo contra o governo. Na sua opinião, os protestos eram por melhores condições de saúde, educação, segurança e transporte público _ e não por causa dos gastos com o Mundial. Ora, o ministro, sim, é que parece estar querendo confrontar o governo, que afinal é diretamente responsável pelos serviços públicos referidos por ele.
A realidade da Copa é que ela é irreversível e poderá, sim, trazer benefícios para o país, tanto pela movimentação de turismo e comércio durante a competição quanto pelas obras de mobilidade urbana que forem efetivamente concluídas. Mas isso só acontecerá se a população continuar fiscalizando, acompanhando de perto, cobrando mesmo, sem jamais renunciar ao seu direito de crítica e de manifestação, garantido pela Constituição. Quem não gostar, que vá se queixar para a Fifa.
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