segunda-feira, novembro 05, 2012

O vendedor agressivo - WALCYR CARRASCO

REVISTA ÉPOCA
Aconteceu recentemente. Um amigo fez aniversário. Queria dar uma camisa. Mas não sabia seu número. Fui a uma loja do Shopping Leblon, no Rio de Janeiro, de uma grife importante de que sou cliente há mais de dez anos. Deixei uma autorização para o aniversariante escolher uma camisa. Dias depois, o presenteado me telefona da loja. Queria permissão para ficar com um casaco oferecido pelo vendedor. Fiquei na saia justa. Concordei. Dias depois, tomei coragem e falei com ele pessoalmente: não era demais ganhar uma camisa e escolher um casaco?

– O vendedor só me ofereceu as peças mais caras, disse ele. Quando pedi para ver as camisas, disse que não havia nenhuma que valesse a pena, por ser fim de estação.

E se ofereceu para pagar a metade. Recusei. Voltei à loja e reclamei:

– Eu havia autorizado uma camisa. Vocês quebraram uma relação de confiança comigo, como cliente. No mínimo, em vez de deixar o presenteado ligar, deveriam ter me chamado em particular para explicar o que acontecia.

Ouvi desculpas. Paguei. Não volto mais lá.

Foi uma situação radical. Sinto cada vez menos confiança nos vendedores de lojas, principalmente de grifes e marcas conhecidas. Antes, se eu entrava num estabelecimento elegante, costumavam me deixar à vontade. A moça, ou o rapaz, se apresentava e dizia, educadamente, que estava à disposição. E me deixava observar as peças, sapatos, acessórios. Hoje, camelôs se tornaram um primor de delicadeza diante desses vendedores. Eles se atiram em cima da gente! Mesmo que eu diga que “estou só olhando” começam com um “já viu isso, já viu aquilo?”. Sem dúvida, existem clientes que apreciam uma assistência feroz. Fujo correndo de vendedores extremamente solícitos.

E a confiança, para onde foi? Outro dia experimentei um paletó. Impossível fechar. “Esse paletó fica muito bem usado aberto”, disse o vendedor. Observei minha barriga, que brotava como um cogumelo na abertura. “Eu jamais compraria uma peça que não posso fechar”, disse. “Quero um número maior.”

O rapaz rugiu:

– Não temos, mas esse ficou muito bem você. Perfeito nos ombros!

Respondi:

– Nunca mais vou acreditar quando você disser que alguma coisa está ótima!

– Essa aí não caiu bem.Ele me olhou com desprezo, como se eu nada soubesse de moda. Posso não ser delicado. É que perdi a paciência. Vejo as pessoas comprar roupas que nunca vão usar, instigadas por profissionais insistentes. Já houve um tempo em que eu confiava inteiramente em vendedores. Experimentava uma camisa e ouvia:

Eu me sentia confiante. Os profissionais das lojas onde era cliente tornaram-se amigos. Não sentiam necessidade de me empurrar o mais caro. O importante, eu percebia, era que me tornasse um cliente satisfeito. Certa vez, no Shopping Paulista, numa grife nacional, ouvi o conselho:

– Você levou um casaco muito parecido com esse faz seis meses.

Agradeci a lembrança. Realmente, tenho de me policiar para não comprar roupas parecidas. É claro que voltei outras vezes, pedi conselhos e comprei.

A relação entre cliente e profissional de vendas não pode ser tão selvagem. O papel de um vendedor é, sim, oferecer as peças, mas também aconselhar com franqueza sobre o que ficou bem ou não. Suponho que a mudança tenha um bom motivo. Há algum tempo as grifes internacionais, aqui no Brasil, vêm deixando de ser representadas por empresas locais. As corporações assumem os controles de suas marcas em território nacional. O resultado imediato é que os preços das peças importadas baixaram. A concorrência se tornou maior. Também suspeito que tanto as grifes internacionais como as brasileiras estabelecem cotas de desempenho mais árduas para os vendedores. Isso levou a um salve-se quem puder quando entra um cliente na loja. A ponto de já ter ouvido várias histórias de brigas entre vendedores, porque um “rouba” a vez do outro, quando consegue. O espírito natalino já está chegando à decoração dos shoppings. Mas o comércio se transformou numa praça de guerra entre vendedores, na tentativa de arrebatar o melhor cliente. E num assédio a quem entra numa loja. Quem tenta comprar só um par de meias corre o risco de sufocar num mar de veludos, jeans, carteiras, bolsas, tênis, botões!

E, quando um vendedor me garante que uma peça de roupa ficou bem, eu penso:

– Será verdade? Ou ele só está tentando me empurrar mais alguma coisa?

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