sexta-feira, março 16, 2012

Às claras - REGINA ALVAREZ

O GLOBO - 16/03/12


A ata do Copom foi esclarecedora. Depois de anunciar de forma telegráfica o corte na taxa básica de juros em 0,75 ponto, na semana passada, o Banco Central detalhou ontem na ata seus motivos. E foi além, ao sinalizar o que pretende até o fim de 2012, ou seja, o piso da Selic para o ano, de 9%. O documento traz informações importantes sobre os cenários para a economia, que refletem também os desafios que o governo tem pela frente para fazê-la crescer.

Fica claro, por exemplo, que o crescimento em 2012 depende muito mais do mercado interno, pois as fontes externas que turbinaram o PIB no passado recente estão secando.

O economista André Perfeito, da Gradual Investimentos, destaca alguns pontos da ata que considera relevantes. Um deles é a confirmação de que houve uma deterioração do cenário externo maior do que o esperado e isso vai permanecer por um bom tempo. O mega estímulo que o Brasil vinha recebendo por meio da balança comercial estancou e já se observa um movimento no sentido contrário.

- Andar com as próprias pernas é o maior desafio no momento - destaca. Outro aspecto importante é a ênfase que o Banco Central deu na ata à política fiscal. Na visão do economista, está claro que a estratégia para viabilizar a redução dos juros passa por uma política fiscal restritiva, com cortes em despesas e um esforço para cumprir a meta de superávit primário cheia, como prometido pela equipe econômica. O problema é que o impacto negativo do ajuste fiscal pesará mais no PIB do que o estímulo positivo da política monetária. Nessa equação, as variáveis puxam mais o produto para baixo do que para cima. - A política fiscal vai puxar pra baixo, o setor externo, também, e os investimentos não serão tão fortes por conta da ociosidade da indústria - destaca.

O economista Luis Otávio Leal, do banco ABC Brasil, lembra que se a economia crescer estimulada pelo consumo interno há o risco de a inflação de serviços, que já pressiona o índice, aumentar e a indústria recorrer cada vez mais às importações, prejudicando a balança comercial e aumentando a vulnerabilidade externa.

Leal viu na ata a intenção clara do BC no sentido de estimular o crescimento, mas destaca um outro recado, que é o comprometimento com o sistema de metas e o controle da inflação.

- Sinalizar com juros de 9% foi uma tentativa de frear as expectativas de inflação. O BC quis dizer que tem um piso para os juros e, portanto, não está rasgando o manual.

Desafio ao crescimento
Embora o governo federal tenha aumentado os investimentos públicos nos últimos anos e faça grande publicidade em torno do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), as taxas ainda estão muito aquém do necessário para estimular o crescimento da economia. A fatia de investimentos é pequena em relação aos gastos correntes. E ainda encolheu em 2011, na comparação com o ano anterior. O investimento público global correspondia a uma fatia de 21% das despesas correntes no começo da década de 70, enquanto hoje está na faixa de 7%, ou seja, um terço daquele percentual.

- A diferença entre o gasto corrente e os investimentos ainda é muito grande, mesmo o investimento tendo crescido - observa Velloso.

A impressão de que o país está muito melhor do que as economias avançadas , na visão do economista, é falsa, porque está calçada na dívida e não considera os gargalos na infraestrutura. Ele cita o exemplo de Portugal, visto como a bola da vez na crise da Zona do Euro:

- Eles fizeram há anos o que a gente não consegue fazer. O desafio pela frente é muito grande.

Intransferível
A presidente Dilma Rousseff decidiu convidar pessoalmente algumas personalidades para a Rio + 20. Fez isso com Angela Merkel, na visita à Alemanha, e fará o mesmo com o presidente Obama, em abril, quando viaja aos EUA. Faz parte do esforço para tornar a conferência a maior da história das Nações Unidas.

Precaução
Antes de propor qualquer mudança nas regras da caderneta de poupança, o governo quer fazer uma grande campanha de esclarecimento à sociedade, mostrando, por exemplo, que os pequenos poupadores não serão prejudicados e como o país ganha com a queda dos juros. O maior desafio neste caso é a comunicação, avalia o governo, pois qualquer ruído pode causar estragos, relembrando o trauma do confisco do Plano Collor. Aquilo ninguém esquece, diz uma fonte. 

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