quinta-feira, março 01, 2012

Albatrozes aprovam o aquecimento global - FERNANDO REINACH


O Estado de S.Paulo - 01/02/12


Se você sair de Madagascar e navegar em direção ao Polo Sul, antes de chegar à Antártida você se deparará com o Arquipélago de Crozet, com seis ilhas, a maior com 150 km². Desde 1936, elas são uma reserva ecológica, onde os únicos humanos são cientistas que se revezam em uma estação experimental.

Apesar da temperatura amena, o local não é dos mais agradáveis: chove 300 dias por ano e ventos de 100 km/hora varrem as ilhas 100 dias por ano. Isso porque elas estão no caminho de uma corrente de ar que varre os oceanos em volta da Antártida.

Nos últimos 15 anos, por causa do aquecimento global, esses ventos aumentaram de intensidade e mudaram de direção. Essas mudanças climáticas estariam afetando as aves que vivem em Crozet?

Uma colônia da maior espécie de albatroz - de uma ponta da asa à outra são mais de 3 metros -, o Diomedea exulans, vive em Crozet e é estudada desde 1966. Com dados dos últimos 40 anos, foi possível estudar o impacto do aquecimento sobre essa população.

Eles vivem no ar, onde se mantêm por horas sem bater as asas, aproveitando os ventos. Pousam à noite no mar para se alimentar de pequenos polvos e peixes, decolam e só pousam em terra para se reproduzir. São monógamos. A cada dois anos, os casais se reencontram na ilha, produzem um único ovo e dividem o trabalho de chocar e alimentar o filhote. Depois decolam e passam a maior parte da vida no ar, solitários, voando cerca de 500 km por dia.

Desde 1966, cientistas os pesam quando estão em terra, monitoram seu sucesso reprodutivo e colocam um GPS e um radiotransmissor. Como faz 40 anos os dados são coletados, foi possível verificar o que mudou com as mudanças nos ventos.

A primeira descoberta é que a velocidade de voo aumentou. Se em 1990 eles voavam 9 metros por segundo, hoje eles voam de 10 a 12. O número de quilômetros voados por dia passou de 500 para 800. Com isso, eles passam menos tempo na água se alimentando.

Essas alterações comportamentais levaram os animais a voltar para suas ilhas mais fortes. Se antes os machos voltavam do mar a cada dois anos com 9,5 quilos, agora eles pesam 11 quilos. As fêmeas, que antes pesavam 7,5 quilos, ganharam 1 quilo. Esse ganho afetou a capacidade reprodutiva. Na década de 70, apenas 65% dos casais produziam um filhote a cada dois anos; hoje, 80% produzem. A população deixou de diminuir.

Esses dados indicam que os albatrozes se beneficiaram com as mudanças na intensidade e na velocidade dos ventos. Para eles, o aquecimento global tornou a vida mais fácil. Mas isso pode ser transitório - se as mudanças se intensificarem, existe o risco de esse processo ser revertido.

Esse é um de diversos estudos que demonstram como é difícil prever as consequências das mudanças climáticas no planeta. Enquanto muitas espécies estão se extinguindo e muitos ecossistemas estão sofrendo, outros podem estar se expandindo ou iniciando um processo de aumento da biodiversidade. Como tudo o que envolve a diversidade e complexidade dos seres vivos, não existem respostas simples.

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