sexta-feira, janeiro 06, 2012

O contraditório da energia - JOÃO CARLOS MELLO


O ESTADÃO - 06/01/12

O excesso de encargos e tributos é um dos principais problemas do Setor elétrico na atualidade. Como distribuidoras e consumidores têm mostrado em diversas ocasiões, as cobranças chegam a responder por cerca de metade das contas de luz. Essa situação cria uma contradição em relação à nossa matriz elétrica: pouco adianta dispormos da geração de energia por meio de hidrelétricas - o formato mais barato para produção de eletricidade em larga escala -, se inflacionamos as contas de luz com cobranças diversas, colocando- as entre as mais altas do mundo.

Para resolver essa equação, é preciso analisar se realmente as cobranças são necessárias. Tomemos o caso da Reserva Global de Reversão (RGR), criada nos anos 1950 para cobrir os custos associados à reversão de concessões do Setor elétrico ao órgão concedente. Até hoje, não há registro do uso de recursos do encargo para sua finalidade original. E, neste momento em que se discute exatamente a questão do vencimento de concessões, somos informados de que os cerca de R$ 16 bilhões que estariam disponíveis não são suficientes para cobrir os custos das reversões apresentados pelas empresas.

Some-se a essa questão a falta de transparência na destinação dos recursos. Isso porque, além de criar encargos, nosso Legislativo tem o grave costume de ampliar as funções para as quais são destinados. Esse é o caso do Projeto de Lei 2116/11, que propõe o uso de pelo menos 15% da RGR para os municípios custearem a manutenção das redes de Iluminação pública, uma vez que esses ativos serão transferidos para seu controle. A intenção parece até boa, pois a maioria dos municípios terá dificuldades para assumir essa responsabilidade. A questão é que esse tipo de medida serve apenas para aumentar a confusão e a falta de transparência do Setor elétrico, impedindo que os consumidores saibam porque estão pagando e dificultando a fiscalização. Soluções dedicadas a problemas específicos sempre são melhores do que a utilização de recursos existentes com objetivos diferentes.

Certamente esse tipo de comportamento de nossos governantes se deve à facilidade de arrecadar recursos por meio das contas de energia. Afinal, o serviço tem ampla difusão e o consumidor já aprendeu: se não pagar a conta, o funcionário vem cortar. Mas, considerando as pretensões do nosso país continuar avançando em termos econômicos e sociais, esse tipo de lógica é inaceitável. É preciso combatê-la para que nossas contas de luz possam ocupar sua posição correta no ranking mundial: entre as mais baixas.

JOÃO CARLOS MELLO É PRESIDENTE DA ANDRADE & CANELLAS.

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