domingo, agosto 07, 2011

ELIO GASPARI - Barraco na secretaria do Moreira


Barraco na secretaria do Moreira
ELIO GASPARI
O GLOBO - 07/08/11

O comissário transformou a organização de uma reunião num incidente e o subsecretário foi-se embora

A SECRETARIA de Assuntos Estratégicos do ministro Moreira Franco está com dificuldades táticas. Num clima de beligerância burocrática, seu secretário-executivo, Roger Leal, provocou um barraco com a simples convocação de uma reunião de trabalho.
No dia 27 de julho, às 16h20min, ele convocou cinco funcionários da Subsecretaria de Desenvolvimento Sustentável para uma reunião, por meio de uma mensagem copiada para o titular do serviço, Eustáquio Reis. Mensagem esquisita. Não dizia dia, hora nem agenda. Esquisita porque a reunião seria no dia seguinte, às 15h. (Um dos cinco nem na SAE trabalhava, pois deixara-a havia pouco tempo.)
Com 36 anos de serviço público na escola de rigor funcional do Ipea, o economista Eustáquio Reis nunca vira convocação de subordinados sem algum tipo de discussão com a chefia. Como não era a primeira vez, negou autorização para que dois dos subordinados imediatos fossem à reunião.
Ele já havia se queixado com Moreira Franco desse tipo de conduta. No dia seguinte, às 12h48min, escreveu ao secretário Roger Leal que havia ali questão de hierarquia e conteúdo técnico, colocando-se à disposição para tratar do caso. Nada. No dia 31, Leal escreveu a Moreira Franco, acusando de "indisciplina e desobediência" e agressão ao Código de Ética dos Agentes Públicos.
Em qualquer loja de eletrodomésticos, um conflito do subgerente com um chefe de seção seria resolvido com uma conversa. Se eles não se entendessem, o gerente entraria, pacificando os ânimos ou mandando embora quem estivesse encrencando. Adotou-se o modelo do comissariado, onde misturam-se acusações e silêncios que terminam com alguém, desmoralizado, indo para o canil.
Eustáquio esperou uma semana por uma resposta de Moreira Franco. Nada. Na sexta-feira, escreveu a Leal desafiando-o a denunciá-lo por má conduta, acusou Moreira de "omissão e negligência", mandou-lhe uma carta de demissão e foi-se embora.

SOBRECARGA
Os R$ 13 milhões em dinheiro vivo apreendidos nas casas de cinco auditores da Receita derrotaram a Polícia Federal: a máquina de contar notas da PF não aguentou o serviço e quebrou.
A Corregedoria da Receita espera pegar mais gente.

CONTA DA FESTA
Da linha de partida à de chegada, os oito dias de Jogos Mundiais Militares custaram à Viúva R$ 1,8 bilhão.
O investimento do governo federal para formação de alunos do ensino profissionalizante, incluindo transporte e alimentação, será de R$ 2 bilhões.

POBREZA AMERICANA
O Supremo Tribunal Federal quer que os salários de seus 11 ministros sejam fixados em R$ 30.600 mensais (US$ 248 mil anuais).
A Corte Suprema dos Estados Unidos paga US$ 213.900 a oito dos seus juízes e US$ 223.500 ao presidente da casa.
Em Pindorama, os ministros têm carro com motorista. Em Washington, só o presidente.
O juiz Harry Blackmun (1908-1999) ia para o serviço no seu Fusca azul. David Souter dirigia um Golf com o assento quebrado.

MADAME NATASHA
Madame Natasha tem horror a palavras estrangeiras, mas reconhece que em alguns casos elas enriquecem os vocabulários alheios. Isso acontece com "saudade", que só existe em português.
Vendo a maneira como se trata a crise americana, Natasha aprendeu uma sopa de letras alemã: Schadenfreude (pronuncia-se chádenfróide).
Ela também não existe em outros idiomas e designa a sensação de felicidade que às vezes as pessoas sentem diante da desgraça alheia.
Natasha sabe outra palavra em alemão: Volkswagen.

O EGO DE JOBIM
O surto de egolatria juvenil de Nelson Jobim, exposto pela repórter Consuelo Dieguez, levou a taxa de mortalidade dos ministros da doutora Dilma para 12,5% em apenas oito meses. Essa é a taxa anual de mortalidade infantil do Mali.
Com a ida de Celso Amorim para a Defesa, o embaixador americano não mandará mais a Washington telegramas como aqueles em que Clifford Sobel contava suas conversas com Jobim.
Noutro aspecto, o chanceler Antonio Patriota corre o risco de reassumir a secretaria-geral do Itamaraty.

BOA NOTÍCIA
Em novembro, o "New York Times" terá um novo correspondente no Brasil. Será o repórter Simon Romero, que atualmente cobre (muito bem) a região andina. Ele já esteve baseado em São Paulo e passou um ano no curso de história da USP.

A BOLSA DOS VARGAS
Está nas livrarias "Darcy, a outra face de Vargas", da jornalista Ana Arruda Callado. Conta a vida de "Dona Dárci" (era assim que a chamavam), presença discreta e solidária durante os 15 anos de poder do marido.
Para os hierarcas de hoje, uma lição: em 1933, quando o casal voltava de Petrópolis, um pedregulho rolou sobre o carro em que viajavam. Um oficial da Marinha morreu esmagado, Getúlio e a mulher tiveram fraturas nas pernas.
A dele, leve, a dela, exposta, agravou-se com uma infecção que se transformou em gangrena, com o risco de amputação.
Ela ficou com dois centímetros a menos na perna atingida. Darcy foi salva pelo médico Pedro Ernesto, que anos depois foi colocado na cadeia pela repressão política do marido.
As despesas médicas correram por conta da caixa dos Vargas. Era uma época em que os governantes não metiam a mão na bolsa da Viúva para despesas desse gênero.
A DIPLOMACIA DE DILMA TERIA FRITADO "WANDA"

Em março de 1970, Dilma Rousseff estava presa em São Paulo. A "Wanda" da VAR-Palmares fora capturada em janeiro, e ainda vivia no DOI-Codi. Conforme ela mesma narrou, "a pior coisa que tem na tortura é esperar, esperar para apanhar".
O jornal "Washington Post" publicou um editorial condenando as violências do governo brasileiro, e o embaixador americano foi chamado ao Itamaraty.
Ouviu uma queixa e a ameaça de que gestos desse tipo comprometiam as boas relações entre os dois países. Estava implícita a sugestão de que o Departamento de Estado fizesse uma gestão no jornal.
O embaixador (Charles Elbrick, que havia sido sequestrado meses antes) narrou ao Departamento de Estado um dos argumentos que ouviu: "Os terroristas recorrem a violência, sequestros e ataques a pessoas e instituições, coisa que o governo não pode tolerar".
Passaram-se 41 anos, Dilma está na Presidência da República, e o Itamaraty é acusado pelo Human Rights Watch de exigir uma condenação de "todas" as formas de violência que vêm sendo praticadas na Síria. Lá, a ditadura de Bashar Assad já matou cerca de 2.000 pessoas e ocorreram assassinatos de algo como uma dezena de agentes do governo.
Nem Madame Sosostris, uma grande vidente, teria sido capaz de prever que, um dia, a diplomacia de Dilma exigiria que a denúncia das torturas que "Wanda" sofria, ou o assassinato de seus companheiros, fossem equiparados aos atentados que a VAR-Palmares cometia.

Um comentário:

Marcons disse...

Quando um funcionário não se adequa à cultura organizacional de uma instituição, não dá para nela continuar.
Moreira Franco falou sobre isso em seu Twitter. "Na SAE todos tem plano de trabalho, metas e métrica definidas,acompanhado e avaliado na Sec-Executiva.O subsecretário demitido não aceitava.".