sexta-feira, junho 11, 2010

MARIA CRISTINA FERNANDES

Francenildo como credor

 Maria Cristina Fernandes
Valor Econômico - 11/06/2010
 
Dilma Rousseff deve sua candidatura a Francenildo dos Santos? A busca de uma resposta é também o caminho para se entender o futuro de um governo petista que tenha a prominência de Antonio Palocci. É este o miolo da luta interna petista da qual submerge apenas o paroquialismo das disputas entre paulistas e mineiros.
A ascensão de Dilma à Casa Civil em meio à crise do mensalão marcou a mudança de política econômica mais estrita rumo a um crescimento mais vigoroso. A guinada, que obedeceu à necessidade de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva buscar o apoio das ruas e dos sindicatos para atravessar o nevoeiro da crise política e se reeleger, deu início ao processo de enfraquecimento de Palocci em sucessivos embates com Dilma.
No mais célebre deles a ex-ministra bombardeou a ideia do déficit nominal zero acalentada por Palocci para alavancar a poupança pública. Não havia como conciliá-lo com o PAC que principiava.
Dilma começou a dar sinais de que partia para o confronto bancada pelo presidente da República. Foi num jantar com senadores pemedebistas ainda em 2005 que a ex-ministra ampliou para além dos gabinetes palacianos suas críticas à falta de ousadia de Palocci na condução da política econômica.
O então ministro já estava em dissonância com os novos ventos do governo quando o caseiro Francenildo cruzou-lhe o caminho. O julgamento do Supremo, três anos depois, não foi capaz de mitigar a grandiosidade do maior monumento à covardia da era Lula, nem bastou para fazer do ex-ministro candidato ao governo de São Paulo, mas foi suficiente para lhe devolver a exposição pública como homem do poder.
O crescimento galopante e a unção popular de Lula levaram a que o PT se unisse em torno da candidatura Dilma com a eleição do diretório nacional pela mais acachapante maioria da história da legenda. Alas antes irreconciliáveis fecharam com uma candidata que nunca militara pelo partido.
Paralelamente, interlocutores de Dilma na área econômica, como o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, passaram a ganhar não apenas poder de formulação, mas também a engordar seu quinhão no governo.
Até 2007, por exemplo, inexistiam repasses do Tesouro ao BNDES. Em 2008 a rubrica já alcançava R$ 35 bilhões. Este ano a conta deve fechar em R$ 218 bilhões.
Como o expediente inexistia em sua época de mandatário da Fazenda nacional e essa é uma das contas que mais cresceram durante sua ausência do governo, é de se imaginar que não esteja fora da mira do artigo sobre o equilíbrio das contas públicas com o qual Palocci resolveu estrear na sua condição de colunista da "Folha de S.Paulo".
Relata a história de um governo que usou o superávit primário para alavancar o crescimento econômico com impulso ao consumo público e privado que acabou se mostrando insustentável. Falava da administração George W.Bush. Abriu e fechou o artigo dizendo que governar é fazer escolhas. E não é nos Estados Unidos que o partido dele tem que fazê-las.
O ex-ministro vem cumprindo com eficiência ímpar a missão de credenciar sua candidata junto a investidores. O efeito colateral de Dilma/Palocci em dueto afinado sobre a importância do equilíbrio das contas públicas para o crescimento sustentado é a escalada do risco Serra.
Ainda que gratidão não seja moeda da política, não é elucubração inconsequente a aposta de que as expectativas geradas no mercado por tamanha dedicação de Palocci à campanha não devam vir a ser frustradas numa eventual vitória petista.
É sobre esse cenário que o episódio do dossiê inexistente apenas joga fumaça. O ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel só não é o Gilberto Carvalho de Dilma porque, ao contrário deste, tem ambições políticas, mas desfruta de uma relação de confiança com a candidata que, no Planalto, só rivaliza com a de Lula e seu chefe de gabinete.
Como economista, está mais para Luciano Coutinho. E, como petista, militou ao lado de Palocci por pontos de convergência com o PSDB.
Na campanha, careceu de alianças para exercer o poder que a confiança de Dilma lhe delegara. No seu Estado, foi obrigado a deixar uma disputa em que era favorito (governo estadual) por outra em que sai em desvantagem (Senado) em nome da aliança nacional com o PMDB.
O episódio que mitigou o peso de Pimentel na campanha reforçou aliança entre setores do PT paulista e Palocci. O PT cresceu muito mais em outros lugares do país, mas é o de São Paulo que, com o aval de Lula, continua dando as cartas. Ao garantir domínio sobre a logística da campanha, tem meio caminho andado para garantir a permanência de seus postos na capital federal. Na aliança, o ex-ministro aumenta seu cacife como estrategista de um eventual governo Dilma.
Se ambos conseguirem seus objetivos, é provável que o casamento de conveniência venha a ser abalado. Fora do governo, Palocci não renunciou à rédea curta sobre os gastos. Por outro lado, seus aliados na campanha da Dilma, que nunca deixaram o poder, mantêm em suas mãos, por exemplo, o gerenciamento dos generosos acordos salariais do funcionalismo público.
É essa disputa que a ex-ministra, se eleita, terá que arbitrar. Se até Lula pagou pedágio para se impor sobre o partido, é de se imaginar o que sua eventual sucessora pode vir a enfrentar. Se eleita, terá em Francenildo o mais fácil dos seus credores.

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