A aerocracia adiou a multa pelos atrasos
FOLHA DE SÃO PAULO - 21/03/10
Nelson Jobim anunciou uma coisa, entregou outra e Solange Vieira, da Anac, fez o oposto
A MINISTRA DILMA Rousseff precisa marcar um almoço com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e com a presidente da Agência Nacional de Aviação Civil, Solange Vieira, para estudar a anarquia das medidas compensatórias oferecidas às vítimas dos atrasos das empresas aéreas. Há método nela: protege a aerocracia. Em dezembro de 2007, em meio ao caos instalado nos aeroportos, Jobim deu uma espetaculosa entrevista anunciando um plano de ressarcimento para as vítimas de atrasos e cancelamentos.
Em três meses, entraria em vigor uma medida provisória determinando que a empresa indenizaria o passageiro de acordo com uma tabela progressiva que chegaria ao equivalente a 50% do valor do bilhete, caso o atraso fosse superior a cinco horas. Se o voo fosse cancelado, a empresa indenizaria a vítima no equivalente ao dobro do valor do bilhete. Na ocasião, a doutora Solange chegou a prever o surgimento de "um mercado secundário dos créditos de atrasos".
Passou o tempo e nada. A medida provisória foi desidratada numa minuta de projeto de lei, cuja tramitação no Congresso poderia levar anos. A tabela progressiva emagreceu e o teto baixou para 20% do valor do bilhete. Sumiu a indenização pelo cancelamento.
No último dia 12, dois anos depois do anúncio de Jobim, Nosso Guia mandou ao Congresso outro projeto, prevendo uma indenização de 50% do valor da passagem para os casos de cancelamento inadvertido, overbooking ou atraso superior a duas horas em voos curtos e quatro horas nos longos. (Um projeto que tramita no Congresso desde 2004 é muito mais rigoroso, talvez até exagerado, e, para o caso de overbooking, prevê uma indenização no valor da passagem.)
Três dias depois, a Anac, onde a doutora Solange acha que o ressarcimento é um problema para ser levado aos Procons, e não à agência, soltou uma resolução ao gosto das empresas. Se o atraso levar o passageiro a desistir da viagem, ele terá direito ao reembolso do que já pagou. Indenização, nem pensar. Se a vítima veio de outra cidade para embarcar numa conexão, ganha um bilhete de retorno e tchau. No caso de overbooking, a Anac diz que a vítima deve negociar com a empresa. Como? Virai-vos.
Pelo que Jobim anunciou em dezembro de 2007, um passageiro que pagou R$ 323 por um voo Rio-Salvador e esperou três horas no aeroporto seria indenizado com R$ 48,45. Pela primeira minuta do projeto de lei, levaria R$ 32,30. Pelo projeto do dia 12, que entrará em vigor sabe-se lá quando, a indenização sobe para R$ 161,50. Pela resolução da Anac, que vigorará a partir de junho, não tem direito a nada.
A comissária Dilma precisa perguntar aos doutores Jobim e Solange Vieira quem fala sério.
O MEC PLANEJOU 1+1 = 2 E OBTEVE 1+1= -3
Em três meses, entraria em vigor uma medida provisória determinando que a empresa indenizaria o passageiro de acordo com uma tabela progressiva que chegaria ao equivalente a 50% do valor do bilhete, caso o atraso fosse superior a cinco horas. Se o voo fosse cancelado, a empresa indenizaria a vítima no equivalente ao dobro do valor do bilhete. Na ocasião, a doutora Solange chegou a prever o surgimento de "um mercado secundário dos créditos de atrasos".
Passou o tempo e nada. A medida provisória foi desidratada numa minuta de projeto de lei, cuja tramitação no Congresso poderia levar anos. A tabela progressiva emagreceu e o teto baixou para 20% do valor do bilhete. Sumiu a indenização pelo cancelamento.
No último dia 12, dois anos depois do anúncio de Jobim, Nosso Guia mandou ao Congresso outro projeto, prevendo uma indenização de 50% do valor da passagem para os casos de cancelamento inadvertido, overbooking ou atraso superior a duas horas em voos curtos e quatro horas nos longos. (Um projeto que tramita no Congresso desde 2004 é muito mais rigoroso, talvez até exagerado, e, para o caso de overbooking, prevê uma indenização no valor da passagem.)
Três dias depois, a Anac, onde a doutora Solange acha que o ressarcimento é um problema para ser levado aos Procons, e não à agência, soltou uma resolução ao gosto das empresas. Se o atraso levar o passageiro a desistir da viagem, ele terá direito ao reembolso do que já pagou. Indenização, nem pensar. Se a vítima veio de outra cidade para embarcar numa conexão, ganha um bilhete de retorno e tchau. No caso de overbooking, a Anac diz que a vítima deve negociar com a empresa. Como? Virai-vos.
Pelo que Jobim anunciou em dezembro de 2007, um passageiro que pagou R$ 323 por um voo Rio-Salvador e esperou três horas no aeroporto seria indenizado com R$ 48,45. Pela primeira minuta do projeto de lei, levaria R$ 32,30. Pelo projeto do dia 12, que entrará em vigor sabe-se lá quando, a indenização sobe para R$ 161,50. Pela resolução da Anac, que vigorará a partir de junho, não tem direito a nada.
A comissária Dilma precisa perguntar aos doutores Jobim e Solange Vieira quem fala sério.
O MEC PLANEJOU 1+1 = 2 E OBTEVE 1+1= -3
A megalomania do MEC cravou mais um prego no caixão do Enem como sucedâneo do vestibular. Em março do ano passado, o ministério informou que as notas da garotada teriam validade nacional. Assim, um craque do Piauí poderia conseguir matrícula em São Paulo. Santa medida, tomada em nome de uma política de redução dos desequilíbrios regionais.
Quem ouviu a professora Azuete Fogaça aprendeu: "Pode acontecer o contrário, um aluno com nota baixa de São Paulo pode migrar para uma faculdade do Nordeste. Um não tem nota, mas tem recursos. O outro tem nota, mas não tem recursos". Não deu outra. Os repórteres Fábio Takahashi, Patrícia Gomes e Angela Pinho descobriram que São Paulo importou 169 alunos e exportou 2.531. O Piauí importou 612 e exportou 85.
Minas Gerais teve 431 vagas ocupadas por candidatos de São Paulo. Em nome do combate aos desequilíbrios regionais, o melhor que as universidades dos Estados importadores têm a fazer é fugir dessa arapuca.
CHOQUE DE SCOTCH
Durante a passeata do governador Sérgio Cabral, na quarta-feira, um escorpião viu um camelô oferecendo uísque Johnny Walker de rótulo preto a R$ 15 a dose. Ele aceitava R$ 5 por duas doses, o que não fazia diferença, pois a bebida era falsa. A cena foi filmada.
NO COLO DE LULA
Há um travo de uísque falsificado no debate em torno da tunga que a emenda Ibsen pode impor aos Estados produtores de petróleo. Seu texto é um monstrengo impraticável, resultado de um cochilo dos governadores interessados e da precariedade dos acordos que fizeram. Esse pedaço do problema poderá ser resolvido nos próximos meses, no mínimo seis, enquanto o caso tramita no Senado. Pensando bem, considerando-se que o petróleo está a 8.000 metros de profundidade desde o início dos tempos, se a discussão durar dois anos, nada de ruim acontecerá por causa da demora.
Nos últimos dias um novo dragão mostrou seu rosto. O que se quer mesmo é derrubar o regime de partilha, substituindo-o por um retorno às concessões.
Não se pode dizer que um sistema seja melhor do que o outro, pois uma partilha mal desenhada é pior que uma concessão bem planejada. Mesmo assim, o DEM e um pedaço do PMDB jogarão no colo do Grande Mestre a defesa da sua proposta da partilha. Durante a campanha eleitoral ela virá embrulhada na bandeira nacional, com o grito de "O Petróleo é Nosso".
Depois a oposição reclama quando é acusada de ter desejado privatizar a Petrobras.
VENTOS CUBANOS
Nosso Guia precisa se preparar para a hipótese de um surto repressivo em Cuba. Se a ditadura castrista decidir calar as Damas de Branco, recorrerá à mesma metodologia da China, do Irã e de Mianmar (último flerte da diplomacia-companheira), jogando em cima dos dissidentes todo o poder de polícia necessário para isolá-los, amedrontando a sociedade.
Para esses regimes, as revoluções europeias de 1989 são aulas de fracasso de ditadores.
WARHOL E TUYMANS
Há duas grandes exposições na praça. Uma por perto, a de Andy Warhol (1928-1987) na Estação Pinacoteca, em São Paulo, com 170 trabalhos do genial artista americano. Num palpite audacioso, Warhol é o maior pintor da segunda metade do século passado. Sua "Gold Marilyn Monroe", que está no MoMA de Nova York, é um dos melhores retratos de todos os tempos. Quem for à Pinacoteca poderá ver outra (boa) Marilyn. A Pinacoteca pretende colocar toda a exposição no seu sítio da internet a partir de abril.
A outra exposição, do pintor belga Luc Tuymans, de 51 anos, está no Museu de Arte Moderna de San Francisco. Num tempo de miserê, ele é um dos melhores pintores vivos. Alguns de seus trabalhos lembram Giorgio Morandi (1890-1964) e em seus retratos há uma crueza que contrasta com a alegria e o humor de Warhol. Um deles, da ex-secretária de Estado Condoleezza Rice, é uma maravilha.
O retrato da Rice pode ser visto numa reportagem do "New York Times" intitulada "Luc Tuymans, Putting the Wrongs of History in Paint".
Quem ouviu a professora Azuete Fogaça aprendeu: "Pode acontecer o contrário, um aluno com nota baixa de São Paulo pode migrar para uma faculdade do Nordeste. Um não tem nota, mas tem recursos. O outro tem nota, mas não tem recursos". Não deu outra. Os repórteres Fábio Takahashi, Patrícia Gomes e Angela Pinho descobriram que São Paulo importou 169 alunos e exportou 2.531. O Piauí importou 612 e exportou 85.
Minas Gerais teve 431 vagas ocupadas por candidatos de São Paulo. Em nome do combate aos desequilíbrios regionais, o melhor que as universidades dos Estados importadores têm a fazer é fugir dessa arapuca.
CHOQUE DE SCOTCH
Durante a passeata do governador Sérgio Cabral, na quarta-feira, um escorpião viu um camelô oferecendo uísque Johnny Walker de rótulo preto a R$ 15 a dose. Ele aceitava R$ 5 por duas doses, o que não fazia diferença, pois a bebida era falsa. A cena foi filmada.
NO COLO DE LULA
Há um travo de uísque falsificado no debate em torno da tunga que a emenda Ibsen pode impor aos Estados produtores de petróleo. Seu texto é um monstrengo impraticável, resultado de um cochilo dos governadores interessados e da precariedade dos acordos que fizeram. Esse pedaço do problema poderá ser resolvido nos próximos meses, no mínimo seis, enquanto o caso tramita no Senado. Pensando bem, considerando-se que o petróleo está a 8.000 metros de profundidade desde o início dos tempos, se a discussão durar dois anos, nada de ruim acontecerá por causa da demora.
Nos últimos dias um novo dragão mostrou seu rosto. O que se quer mesmo é derrubar o regime de partilha, substituindo-o por um retorno às concessões.
Não se pode dizer que um sistema seja melhor do que o outro, pois uma partilha mal desenhada é pior que uma concessão bem planejada. Mesmo assim, o DEM e um pedaço do PMDB jogarão no colo do Grande Mestre a defesa da sua proposta da partilha. Durante a campanha eleitoral ela virá embrulhada na bandeira nacional, com o grito de "O Petróleo é Nosso".
Depois a oposição reclama quando é acusada de ter desejado privatizar a Petrobras.
VENTOS CUBANOS
Nosso Guia precisa se preparar para a hipótese de um surto repressivo em Cuba. Se a ditadura castrista decidir calar as Damas de Branco, recorrerá à mesma metodologia da China, do Irã e de Mianmar (último flerte da diplomacia-companheira), jogando em cima dos dissidentes todo o poder de polícia necessário para isolá-los, amedrontando a sociedade.
Para esses regimes, as revoluções europeias de 1989 são aulas de fracasso de ditadores.
WARHOL E TUYMANS
Há duas grandes exposições na praça. Uma por perto, a de Andy Warhol (1928-1987) na Estação Pinacoteca, em São Paulo, com 170 trabalhos do genial artista americano. Num palpite audacioso, Warhol é o maior pintor da segunda metade do século passado. Sua "Gold Marilyn Monroe", que está no MoMA de Nova York, é um dos melhores retratos de todos os tempos. Quem for à Pinacoteca poderá ver outra (boa) Marilyn. A Pinacoteca pretende colocar toda a exposição no seu sítio da internet a partir de abril.
A outra exposição, do pintor belga Luc Tuymans, de 51 anos, está no Museu de Arte Moderna de San Francisco. Num tempo de miserê, ele é um dos melhores pintores vivos. Alguns de seus trabalhos lembram Giorgio Morandi (1890-1964) e em seus retratos há uma crueza que contrasta com a alegria e o humor de Warhol. Um deles, da ex-secretária de Estado Condoleezza Rice, é uma maravilha.
O retrato da Rice pode ser visto numa reportagem do "New York Times" intitulada "Luc Tuymans, Putting the Wrongs of History in Paint".
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