A China ultrapassou os Estados Unidos como principal destino das exportações brasileiras em 2009. Enquanto as vendas para o mercado chinês cresceram 23%, para o mercado norte-americano elas caíram 42,4%. Esse fato parece ter disparado o alarme para os formuladores de política comercial no Brasil. No início desta semana, o secretário de Comércio Exterior, Welber Barral, anunciou que o governo deverá reforçar as ações para retomar o mercado norte-americano. O reconhecimento da relevância do mercado dos Estados Unidos é um passo importante que reverte a ordem de prioridades que dominou a política comercial brasileira nos últimos anos.
Para muitos analistas, o aumento da participação da China tem contribuído para a deterioração da pauta de exportações brasileiras, uma vez que a demanda chinesa é concentrada em produtos básicos, que representam quase 80% do total vendido para aquele país. Já as vendas para os Estados Unidos são dominadas por produtos manufaturados, que representam mais de 70% das exportações para esse mercado. Esse fato contribui para a percepção de que não é bom ter a China como principal parceiro comercial.
A composição do comércio com a China reflete, em grande medida, as vantagens comparativas reveladas entre os dois países - o Brasil exporta produtos intensivos em recursos naturais e importa produtos intensivos em mão de obra e em escala. Isso, longe de ser um problema, deve ser visto como oportunidade. Os exportadores brasileiros aproveitaram a rápida retomada da demanda chinesa por matérias-primas no último ano e aumentaram suas vendas para aquele país. As exportações brasileiras cresceram a um ritmo superior ao observado para o total das importações chinesas, resultando no aumento da participação brasileira no mercado chinês, que dobrou entre 2003 e 2009 (dados até setembro), passando de 1,4% para 2,9%.
Onde o Brasil está perdendo, de fato, é na concorrência com produtos chineses nos mercados que tradicionalmente são destinos relevantes para os manufaturados brasileiros: Estados Unidos, Argentina e México, dentre outros. Como mostra o Observatório Brasil China, divulgado ontem pela Confederação Nacional da Indústria, os exportadores chineses ganharam participação nesses três mercados ao longo de 2009 e há evidências de que eles vêm deslocando produtos brasileiros. Essa tendência é particularmente preocupante na Argentina, país em que os exportadores brasileiros gozam de preferências tarifárias, que em alguns produtos chegam a representar 35% do preço do produto importado, para não mencionar a proximidade geográfica.
Num contexto de forte retração nos seus principais mercados de destino, as exportações brasileiras de produtos manufaturados caíram 27,3% em 2009. Esse desempenho não é explicado apenas pela crise internacional, embora ela tenha afetado de forma mais intensa os mercados mais importantes para os manufaturados brasileiros. As exportações de manufaturados também são muito sensíveis à recuperação da demanda interna - que começou a se fazer sentir a partir do segundo trimestre de 2009, levando os produtores a substituir o mercado externo pelo doméstico.
Além disso, as exportações de manufaturados são mais sensíveis à taxa de câmbio que as vendas de commodities. Nesse quesito, a concorrência com produtos chineses, que contam com uma moeda artificialmente desvalorizada, deixa os brasileiros em franca desvantagem. Com demanda externa ainda retraída, demanda interna em forte expansão e taxa de câmbio desfavorável, não se pode esperar desempenho melhor dos produtos manufaturados.
Diante desse cenário, qual deve ser a agenda de política de comércio exterior? Na área internacional, as agendas de negociações comerciais e promoção comercial precisam seguir a lógica da importância e dimensão dos mercados consumidores e evitar a subordinação da política comercial à política externa. A decisão anunciada pelo secretário Barral de priorizar os mercados latino-americanos dinâmicos vai nessa direção. No âmbito doméstico, há pouco espaço para atuar diretamente sobre a taxa de câmbio, mas há uma extensa e conhecida agenda de competitividade a ser enfrentada, cujo principal componente é o tributário - em particular, o acúmulo pelos exportadores de créditos tributários de impostos federais e estaduais, que somam mais de US$ 30 bilhões.
*Sandra Polónia Rios, economista, é diretora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes) |
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