A demissão do presidente do Banco Central da República Argentina, Martín Redrado, pela presidente da Argentina, Cristina Kirchner, revela a fragilidade política do clã dos Kirchners, mas é, também, uma oportunidade para entender melhor o que significa a autonomia operacional de um banco central.
Primeiramente, os fatos. O governo argentino esperou que o Congresso entrasse em recesso para baixar, em 14 de dezembro, um decreto com força de lei pelo qual determinava que o Banco Central repassasse ao Executivo o equivalente a US$ 6,6 bilhões das reservas externas argentinas (de um total de US$ 48 bilhões) para o Fundo do Bicentenário para o Desendividamento e a Estabilidade, com objetivo declarado de resgatar títulos de dívida pública externa.
Redrado entendeu que o decreto contrariava a Constituição na medida em que usava reservas monetárias para cobrir despesas correntes. Por isso, em vez de obedecer prontamente à determinação presidencial, decidiu submeter a matéria a análise jurídica. Por entender que Redrado estava resistindo ao cumprimento do decreto, Cristina pediu sua renúncia. Redrado avisou que não pretendia deixar o cargo uma vez que seu mandato expiraria dentro de seis meses. Na Argentina, a nomeação do presidente do Banco Central é referendada por uma comissão do Senado, mas, valendo-se do recesso parlamentar, Cristina o demitiu.
O desfecho não acabou com a crise política. O Executivo argentino aparentemente já não conseguiria arrancar pelos trâmites normais a destituição de Redrado. De 2002 até agora, o Banco Central argentino teve seis presidentes e nenhum deles terminou seu mandato. É preciso ver como o Senado reagirá agora ao fato consumado. Mesmo se não reagir, parece difícil que o governo consiga reverter sua perda de autoridade.
Do ponto de vista institucional, foi atropelado o estatuto da autonomia do Banco Central, exigência de um Estado moderno cujo objetivo é garantir condições para o fortalecimento do patrimônio econômico mais importante de um país, que é a sua moeda. Deixar a guitarra monetária nas mãos dos políticos, que adoram gastar, é uma temeridade, como já começou a acontecer na Argentina. A autonomia do Banco Central poderia não ser reconhecida, como acontece em muitos países. No entanto, na Argentina ela está assegurada pela Carta Orgânica do Banco Central.
No caso da alocação das reservas argentinas, há enormes evidências de que se trata de financiamento de despesas correntes com recursos monetários. O objetivo declarado da operação é resgatar títulos do Tesouro argentino, que foram emitidos no passado para dar cobertura a esse tipo de gastos. Não bastasse isso, como informou o diário La Nación, o orçamento aprovado deste ano já prevê recursos suficientes para o pagamento da dívida. Por aí se vê que o objetivo real desse fundo é garantir mais recursos para a gastança oficial do governo central argentino.
No Brasil, a autonomia operacional do Banco Central não está sacramentada em lei. Pelo menos nos últimos dez anos, ela prevaleceu de fato. Mas muita gente por aqui prega a submissão da instituição às decisões dos políticos. O que está acontecendo na Argentina é boa ocasião para repensar o assunto.
Sem corrida - Em 2009, o saldo das cadernetas aumentou 17,9%. A redução dos juros básicos na economia deixou a caderneta mais atraente, mas não houve o esvaziamento dos fundos de renda fixa que o ministro Mantega chegou a temer.
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