O governo parece ter finalmente acordado para o nível escorchante de juros cobrado pelos bancos nos cartões de crédito.
Terça-feira, o presidente Lula reclamou que os bancos se comportam quase como assaltantes nos juros do cheque especial e nos do cartão de crédito.
No cheque especial, são de 160% ao ano; e no cartão de crédito, de 240% ao ano. Apenas para comparar, o nível dos juros básicos, a Selic, que tantos analistas consideram despropositado, é de 8,75% ao ano.
Até agora, o Banco Central não se mostrou nem um pouco preocupado com o assunto. No caso dos cartões de crédito, está mais interessado em acabar com a verticalização dos serviços prestados pelas administradoras de cartões do que em acabar com esses juros aí - embora o perfil dessas empresas também tenha de ser atacado.
As administradoras dos cartões de crédito, ou seja, os bancos atrás delas, alegam que os juros têm de ser esses porque a inadimplência nesse segmento é alta demais, de 30%.
Como esta coluna já comentou em sua edição de 23 de agosto, essa é uma desculpa esfarrapada. Para uma população que ainda não chegou a 200 milhões de habitantes, há hoje mais de 552 milhões de cartões (incluídos os de crédito, os de débito e os de loja). Cartões de todas as bandeiras são empurrados para qualquer um. As administradoras assediam os candidatos a mais um cartão por telefone, por e-mail, por mala direta ou pelos gerentes das agências bancárias. Com juros tão elevados, a inadimplência tem mesmo de ser alta. Quem cai nessa vida não sai dela facilmente.
Tanto se fala em cadastro positivo, ou seja, em cobrança de juros diversificada conforme o perfil do cliente e, no entanto, os bancos relutam em adotar a novidade porque entendem que ganham mais sem esse instrumento. No cartão de crédito, a instituição de uma espécie de cadastro positivo seria ainda mais justificada.
As administradoras sabem com quem estão lidando. Detêm não só o perfil financeiro, como também o perfil de consumo do cliente. Poderiam perfeitamente trabalhar com juros diversificados, e a inadimplência talvez não fosse tão alta. Se não o fazem é, outra vez, porque entendem que ganham mais dinheiro assim.
Os cartões de crédito são um instrumento importante de racionalidade no sistema de pagamentos do País e de enorme redução de custos dos bancos.
Graças à sua disseminação, o volume de moeda manual na economia pôde baixar consideravelmente, o que beneficia o governo. E os bancos não só puderam reduzir o movimento de seus caixas e os cuidados com o transporte de numerário, como puderam gradativamente dispensar o uso do cheque, de alto custo operacional.
E, no entanto, em contraste com esse retorno tão substancial, os bancos mantêm em relação ao usuário do cartão um comportamento predatório.
O presidente Lula tem toda a razão de reclamar dos bancos. Como também tem razão de reclamar da passividade do usuário do cartão de crédito, que se sujeita a esse tratamento. Mas não pode fugir de suas responsabilidades. É o seu governo que nunca havia se importado com os quase assaltos.
Confira
Avanço na crise - Os números básicos dos cartões estão na tabela acima. Mais significativo é que, no período de 12 meses terminado em setembro, de forte crise global, a indústria dos cartões cresceu 10% em número e 19% em faturamento. |
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