quinta-feira, junho 18, 2009

CELSO MING

Rédea curta nos bancos


O Estado de S. Paulo - 18/06/2009
A cada farra nos negócios segue-se a adoção de regras de disciplina. A última foram as leis Sarbanes-Oxley, que chegaram em 2002, depois da lambança contábil das americanas Enron e WorldCom.

A próxima foi anunciada ontem pelo presidente Barack Obama. Pretende aumentar a regulação do sistema financeiro americano. Seu ponto central é enfeixar no Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) mais condições para fiscalizar e supervisionar a atividade das instituições financeiras bancárias e não bancárias.

Se a proposta a ser examinada pelo Congresso é aumentar os poderes do Fed, fica claro que até agora ele não teve poderes suficientes para regular o recentemente identificado sistema financeiro paralelo.

Isso dá certa razão ao presidente anterior do Fed, Alan Greenspan, quando afirma que não tinha mandato para executar as tarefas que hoje os críticos dele vêm cobrando.

Apenas os bancos comerciais estão hoje sob a tutela do Fed. Ainda assim, é um mandato com conflitos de jurisdição, partilhado com agências de atuação apenas estadual. O governo Obama põe sob a tutela do Fed não só bancos comerciais, mas, também, quaisquer instituições consideradas capazes de provocar risco sistêmico (quebras em cadeia), sejam elas bancos de investimento, seguradoras de crédito ou fundos de hedge. E anuncia organismos de supervisão também para sociedades de crédito hipotecário e administradoras de cartões de crédito.

Em compensação, o Fed não terá a mesma facilidade para agir nas emergências. Para abrir canais especiais diretos com o mercado para suprir os bancos em situações de bloqueio de crédito terá de pedir autorização prévia ao Congresso.

A nova batelada regulatória prevê a imposição de rédeas curtas a outros dois segmentos do mercado financeiro: ao mercado de derivativos; e à criação de instrumentos financeiros complexos, como os CDS (Credit Default Swaps), que empacotam ativos com o objetivo de escapar aos balanços das instituições financeiras e, portanto, a quaisquer organismos de regulação.

Boa pergunta consiste em saber até que ponto o governo Obama conseguirá se opor à atuação contrária a essa regulação dos lobbies das instituições financeiras, tão mal-acostumadas à permissividade que reinou até agora. Em todo o caso, há muito não se ouviam tantas e tão pesadas críticas à atuação dos bancos no Congresso americano.

Por mais abrangente que seja, a nova legislação esbarra em sérias limitações. Uma delas consiste em desconsiderar o caráter global da atividade financeira. De nada adianta botar tranca na porta da frente se canais subterrâneos permitirem a livre atividade dos bancos em outros países. No artigo que assinou anteontem em alguns jornais de circulação internacional, como o El País, de Madri, o presidente Lula perguntou se os países ricos estão de fato dispostos a aceitar a supervisão e o controle supranacionais que o sistema financeiro global requer. Não podem organismos de atuação apenas local pretender controlar instituições financeiras globais. Quer dizer, mais rigor nos Estados Unidos é necessário, mas não basta. É preciso estendê-lo ao resto do mundo e isso pede uma agência internacional de supervisão.

Confira

O Federal Reserve precisará se preparar para estar em condições de supervisionar as instituições financeiras num regime em que elas não podem quebrar. Terá de montar um enorme departamento de auditoria.

Não está claro como será feito o monitoramento dos bancos americanos fora dos Estados Unidos. E, se a fiscalização se estender aos fundos de hedge, o Fed terá de saber como atuam nos paraísos fiscais.

Falta saber como serão evitadas administrações irresponsáveis em grandes empresas não financeiras (como montadoras de veículos), que também não podem quebrar, como se viu.

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