segunda-feira, outubro 29, 2012

De volta às trevas orçamentárias - MAÍLSON DA NÓBREGA

REVISTA VEJA


Os governos do PT ressuscitaram danosas práticas orçamentárias que haviam sido sepultadas na segunda metade dos anos 1980. Por elas, o ministro da Fazenda tinha o poder de aprovar despesas públicas sem prévia autorização legislativa, à moda medieval. Isso acontecia através de um orçamento monetário pelo qual eram transferidos recursos do Tesouro ao Banco do Brasil e ao Banco Central. Tais recursos provinham da venda de títulos públicos federais a taxas de juros de mercado. Nada se cobrava das duas instituições, que por isso podiam conceder empréstimos a taxas inferiores às do mercado e ainda assim auferir lucros. Qual a mágica?

Na verdade, esse esquisito arranjo institucional gerava uma despesa pública oculta, a qual, grosso modo, decorria da diferença entre as duas taxas de juros, a dos títulos federais e a dos empréstimos. O gasto implícito nessas operações era coberto por novas emissões de títulos do Tesouro, numa espécie de rosca sem fim. Tratava-se, pois, de um orçamento paralelo, que permitia a expansão indefinida da despesa e da dívida, sem o conhecimento do Congresso e da sociedade. Acontece que esse processo subterrâneo manifestava seus efeitos na elevação do endividamento federal, na má alocação dos recursos e nas pressões inflacionárias.

Sob distintas formas, esse arranjo funcionou desde os tempos do Brasil colônia. Suas origens remontam ao absolutísmo português, que sobreviveu por muito tempo à onda de reformas iniciadas na Europa no século XVII, as quais puseram fim ao arbítrio em questões orçamentárias. O poder de dispor sobre a despesa pública foi transferido ao Parlamento, um passo fundamental na longa caminhada rumo à moderna democracia. O rei não podia mais gastar a seu talante nem declarar guerra — que exige o aumento de gastos — sem prévia autorização legislativa. Mais tarde, o orçamento viria a ser o mecanismo básico de planejamento das ações do estado e da promoção do desenvolvimento econômico e social.

Por força talvez das tradições herdadas da metrópole, o valor econômico, social e político do orçamento não se enraizou na sociedade brasileira. É amplamente aceita a ideia equivocada de que o orçamento é autorizativo. Salvo as despesas obrigatórias, admite-se que o Executivo pode não cumprir partes da lei orçamentária. Neste momento de crise, a Europa é exemplo a ser observado: os cortes de despesas associados a programas de austeridade fiscal foram previamente aprovados pelos parlamentos, inclusive o de Portugal.

A partir de 1986, o Brasil começou a adotar saudáveis princípios orçamentários. Extinguiu-se o orçamento monetário, o que pôs fim ao suprimento automático de recursos do Tesouro ao Banco do Brasil e ao Banco Central. Criou-se a Secretaria do Tesouro Nacional, que assumiu a gestão da dívida e do orçamento federais. A Lei de Responsabilidade Fiscal (2000) fixou regras para o controle da despesa e do endividamento da União. Subsídios e subvenções, explícitos ou implícitos, deveriam constar do orçamento aprovado pelo Congresso. Esse ciclo modernizante ainda precisa ser complementado com a reforma do antiquado processo de elaboração e controle do orçamento (Lei n° 4320, de 1964), o que está em discussão no Senado.

Os governos do PT deram marcha a ré nessa trajetória. Passaram a suprir o BNDES de recursos via medidas provisórias que ampliam a dívida pública, como no passado. Têm contado, para tanto, com a omissão do Congresso, que renuncia às prerrogativas no processo orçamentário e chancela essa conduta. Como nos tempos antigos, o Tesouro transfere os recursos a taxas de juros inferiores às que paga aos detentores dos respectivos títulos. Recentemente, a manobra foi estendida ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica Federal. Tal qual nas trevas do passado, o processo ressuscitado gera duas disfunções: (1) burocratas realizam gastos sem autorização legislativa; e (2) os subsídios implícitos nessas transações não constam do orçamento. Sem o registro dos respectivos gastos e sem transparência, dribla-se a fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU). Essa involução institucional precisa ser contida. Com a palavra, o Congresso e o TCU.

Data Venia - ROBERTO POMPEU DE TOLEDO

REVISTA VEJA


Com o julgamento da Ação Penal 470, vulgarmente apelidada de "mensalão ( big monthly stípend", segundo a revista The Economist), chegando ao fim, a coluna sente-se liberada para divulgar o que ocorre nesse evento entre todos sagrado e secreto que é a hora do lanche dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Segue-se transcrição de gravação clandestina feita no local.

Presidente (entrando) — Sentemo-nos. Com o número regimental, declaro aberto este nosso sempre bem-vindo momento de descontração e fruição, momento que até sou tentado a classificar, com o poeta, de "luxo, calma e voluptuosidade". A mesa, como vossas excelências sem dúvida se dão conta, com a lucidez que os caracteriza, está posta. Para melhor compreensão do que temos à frente, um vade mecum gastronômico, se é que posso me expressar assim, ou cardápio, como se diz popularmente, encontra-se à frente de cada um.

Ministro A - Com a devida vênia, se vossa excelência me permite, eu o chamaria de charta, antes de vade mecum. Charta em latim significa papel, mas também uma folha escrita, e veio a gerar carta em italiano e carta em francês, termos usados, entre outros sentidos, também no deste "cardápio" tão singularmente brasileiro.

Ministro B - Se me é permitido um adendo, também entre nós "carta", do latim charta/ chartae, tem esse significado de ementa, lista, preçário.

Presidente - Agradeço por igual a pertinente colaboração de vossa excelência.

Ministro C (ao que se conclui, lendo o cardápio) — Eu apreciei sobremaneira a empadinha que nos foi oferecida ontem, mas vejo com tristeza que hoje não consta do cardápio.

Ministro D - Se vossa excelência me permite, o prato com as empadas está sobre a mesa.

C - Como posso aceitar isso? Quod non est in actis non est in mundus, qual seja, o que não está nos autos não está no mundo. Mutatis mutandis, permito-me concluir, por analogia, que quod non est in cardápio—ou in charta, como bem lembrou o eminente colega—non est in mundus.

D - Se vossa excelência se tivesse dignado a levantar os olhos da charta...

C - Não entendo a ironia. Vossa excelência quer me fazer crer que não devemos confiar no cardápio? Esta corte conta com servidores da mais alta qualificação. São impecáveis na criteriosa disposição da toga sobre nossos ombros como o são nos cuidados da cozinha e na preparação do cardápio respectivo. Em tantos anos de tribunal, jamais observei a existência na mesa de item que não constasse do cardápio. Ademais, se algo a vida me ensinou, é respeitar o que está escrito. Verbi volent, scripta manent.

Presidente — Vossa excelência expressa-se com a perspicácia costumeira e apresenta justificados argumentos, mas me permito esclarecer que as empadas realmente se encontram sobre a mesa, mesa esta que, não resisto a acrescentar, com o poeta das Gerais, é de madeira "mais de lei que qualquer lei da República".

C — Agradeço a observação de vossa excelência. Quero manifestar no entanto, senhor presidente, minha mais veemente repulsa à tese de que se deve observar o que há na mesa antes de consultar o cardápio, tornando-o assim

(ao cardápio) instrumento absolutamente despiciendo.

D — Isto é um desrespeito! (Ouve-se ruído que parece ser de chute desferido por baixo da mesa.)

C — Vossa excelência não admite discordância? (Ruído de chute igual.)

D — Vossa excelência faz vistas grossas! (Ruído do que é sem dúvida o prato de empadas lançado à cara do oponente.)

C — Vossa excelência não me convencerá com argumento dessa natureza. (Travessa, parece que de um bolo, pelo ruído fofo, arremessada em resposta.) Doravante, considerarei o cardápio cum grano salis. (Barulho de empadas, tortas e bolos zunindo no ar, pratos que se espatifam. Alguém tenta ser ouvido, ao fundo.)

Ministro K — Por falar nisso, dada a máxima vênia, vossa excelência me passaria o sal? (Ruídos do que parecem ser socos e pontapés. Interjeições de dor. A gravação se interrompe).


Um aparente paradoxo - CARTA AO LEITOR - REVISTA VEJA

REVISTA VEJA


Uma reportagem desta edição de VEJA se detém diante de um aparente paradoxo. Apesar de o Brasil ocupar apenas a 130ª posição no ranking anual Doing Business, que classifica 185 países por seu bom ambiente de negócios — o que nos deixa nas imediações de Uganda, Etiópia e Quênia —, somos o sexto maior receptor de investimentos estrangeiros do mundo. Com 60 bilhões de dólares estimados para o fim de 2012, o país fica atrás somente de China, Estados Unidos, Hong Kong, França e Reino Unido. Como se explica a coexistência de fenômenos tão díspares no Brasil?


O primeiro impulso é concluir que os investidores estão mal informados sobre a insanidade burocrática, o labirinto fiscal, a ingerência exagerada do governo na economia e a fúria legiferante, realidades que nos equiparam aos países mais hostis à atividade produtiva. Não. Os investidores sabem muito bem as dificuldades de se estabelecerem no Brasil. A conclusão correta é que eles vêm para cá apesar de todos os obstáculos.

O Brasil tem o agronegócio exportador mais produtivo do mundo, tem minério, petróleo, mas, principalmente, tem um grande mercado interno, que agregou no decorrer da última década 40 milhões de novos e ávidos consumidores. Eles são a garantia de demanda aquecida. O governo não perde uma chance de reafirmar que, para ter acesso sem barreiras aos consumidores brasileiros, é preciso fabricar no Brasil. Por isso, mais de 40% dos dólares investidos no país miram o mercado consumidor de produtos ou serviços. Seguindo o caminho da Peugeot Citroen, Toyota, Honda e Hyundai, a alemã BMW anunciou na semana passada que vai erguer uma fábrica em Araquari, no norte de Santa Catarina. O entrevistado das Páginas Amarelas desta edição, Edson de Godoy Bueno, da Amil, é o exemplo mais recente no setor de saúde. Ele vendeu parte de sua empresa a um grupo americano por mais de 6 bilhões de reais.

Com tanta coisa a favor, é de imaginar o salto de qualidade de vida que o Brasil daria a sua população se capinasse a selva burocrática, racionalizasse a cobrança de impostos e incinerasse as resmas de leis inaplicáveis ou inúteis. Mudaria de patamar econômico. Livre desses entraves à atividade produtiva, o Brasil certamente sairia do último vagão dos países de ambiente empresarial inóspito para disputar um lugar de locomotiva.

Barriga de aluguel - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 29\10

Dilma tem dito a amigos que o PSB de Eduardo Campos terminou sendo uma espécie de barriga de aluguel para candidatos do partido próximos de Aécio Neves e a Geraldo Alckmin.
Ou seja
Muy amigo.

No mais...
Quatro ferrenhos críticos de Lula na época do mensalão — Eduardo Paes, Gustavo Fruet, Arthur Virgílio e ACM Neto — foram eleitos prefeitos.
Isto significa que... não sei.

Em tempo
Paes e Fruet foram eleitos com o apoio de... Lula.

Ladrões do povo

Dilma ainda não confirmou se vai à posse de Joaquim Barbosa na presidência do STF dia 22 de novembro.
Mas dez moradores da favela Dilma Rousseff, localizada na divisa de Campo Grande com Nova Iguaçu, no Rio, irão de ônibus a Brasília carregando a seguinte faixa: "Ministro, desejamos saúde e contamos com o senhor para prender os ladrões do povo.”

No mais...

Passada a eleição municipal, o Congresso deve esquentar com a votação da lei de royalties.

Aliás...

O senador petista Wellington Dias, um dos líderes da intentona contra os royalties do petróleo do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, não conseguiu nem passar para o segundo turno na eleição para prefeito de Teresina.
É aquela história: Deus castiga.


Produtividade da Justiça

Em 2011, cada juiz paulista julgou, em média, 1.779 processos. Já no Rio de Janeiro a produtividade média foi bem maior: 2.913.
Mas a situação é pior em outros estados. Em Minas Gerais e em Goiás, cada magistrado deu, em média, pouco mais de mil decisões em 2011.No Ceará e no Piauí, a média cai para 451 e 396 sentenças por magistrado, respectivamente.

CNJ

Os dados são da pesquisa Justiça em Números, que o Conselho Nacional de Justiça divulga hoje.

Harry para colecionador

A Rocco põe nas livrarias em novembro uma edição para colecionador dos sete livros da série "Harry Potter’,’ maior fenômeno editorial de todos os tempos, com mais de 450 milhões de exemplares vendidos em 70 idiomas.
Os sete capítulos da saga criada por J. K. Rowling ganharão capa dura, ilustrações inéditas e virão numa caixa especial.

Nova York é nossa

Gil fará um show no Carnegie Hall, dia 12 de novembro, e Bibi Ferreira, no Lincoln Center, dia 21.

O garoto de Ipanema

Ana Duarte, a produtora e viúva de Pery Ribeiro (1937-2012), organiza um show, para depois do carnaval, em celebração à memória do saudoso cantor — que, aliás, faria 75 anos no sábado.Estarão no palco estrelas como Emílio Santiago, Leny Andrade e Roberto Menescal. No show, será lançado um CD inédito que Pery finalizava.

Aliás...

Haverá uma surpresa para os fãs. O diretor Bernardo Martins, filho de Ana e Pery, prepara um DVD com os melhores momentos de shows do pai.

O peito cresceu

Parceira da coluna pagou R$ 89,90 por um sutiã na loja Loungerie, no Rio, e gostou tanto do modelo que resolveu dar um igual para a mãe.Voltou lá dois dias depois, mas... o mesmo sutiã já custava R$ 149,90.
Segundo a vendedora, a loja descobriu que estava cobrando menos que a concorrência. Ah, bom!

Quiznos no Rio

A americana Quiznos, rede de franquias de fast-food com mais de três mil lojas no mundo, vai abrir sua primeira lanchonete no Rio no Shopping Nova América.

O acervo de Talarico

Metade dos mais de mil livros deixados por José Gomes Talarico foi doada por sua viúva, Francisca, a bibliotecas de comunidades pobres do Rio.
Ex-deputado do PTB de Jango e do PDT de Brizola, Talarico faria 97 anos dia 11 de novembro agora.

No mais...

É impressão minha ou as chamadas redes sociais não foram tão importantes assim nestas eleições municipais?

Os efeitos para 2014 - JOÃO BOSCO RABELLO


O Estado de S.Paulo - 29\10


Em eleições municipais, o eleitor olha gestão; nas presidenciais, faz política. Com a imprecisão de toda a síntese, esta parece aplicável ao pleito que o 2.º turno encerrou ontem. Ele mostra as eleições municipais imunes ao jogo político nacional, em diagnóstico de mão única, pois seus resultados, ao contrário, já influem nos movimentos vinculados à sucessão presidencial de 2014 - e até mesmo na de 2018.

Ainda que o conceito de boa gestão seja morada de cada eleitor, onde essa avaliação foi majoritária, de modo geral, deu-se a reeleição. Exceções à regra certamente encontrarão explicação no apoio de governadores bem avaliados a gestores nem tanto, mas favorecidos pela escora maior.

O eleitor insatisfeito escolheu novos perfis ou, à falta deles, recorreu a antigas lideranças que condenara ao purgatório, para mais uma chance. Caso de Aracaju, por exemplo, onde o veterano João Alves (DEM) conseguiu uma vitória esmagadora.

Ocorre com frequência essa espécie de rodízio, ainda que, às vezes, possa vir travestido do novo - caso de São Paulo, onde o conceito é estritamente etário e repete o revezamento histórico entre o PT e o PSDB.

Aqui houve renovação de quadro, mas não da política partidária que Fernando Haddad representa. Seu perfil pouco característico do PT acabou palatável ao eleitor tucano insatisfeito com a repetição do velho filme e personagens.

A considerar a influência da eleição municipal na presidencial, o 2.º turno amplia e reafirma o fortalecimento do governador de Pernambuco Eduardo Campos, principal beneficiário das vitórias estratégicas de seu partido, o PSB, algumas delas impondo-se à vontade imperial do ex-presidente Lula sobre seus aliados.

O partido de Campos venceu em capitais estratégicas como Belo Horizonte, Recife e Fortaleza, também em Cuiabá, em confronto direto com o PT, que custou o rompimento da aliança entre ambos. Fez ainda Porto Velho e, no plano das cidades médias, venceu em Campinas, reduto petista. No Rio, venceu em Duque de Caxias e Petrópolis, importantes redutos peemedebistas.

E é nesse contexto que o PSB ganha capilaridade, visibilidade nacional e dimensão política, fatores que o beneficiam com maior autonomia de movimentos e lhe impõem exercício mais pragmático na administração de suas alianças.

O partido segue a corrente natural que estende os movimentos de independência do partido às cidades em que for perceptível a possibilidade de voo solo. É a regra natural da política que foge ao controle de cúpulas, porque determinada pelos interesses regionais.

É um cenário que dita também a necessidade de diversidade nas alianças, o que se traduz por uma gradual renovação de parceiros e redução da centralização das negociações numa só grande legenda, ainda que esta, no caso do PT, tenha o poder federal como forte polo de gravidade a atrair e sustentar linhas auxiliares.

Ao lado de Aécio Neves, o governador de Pernambuco consolida o protagonismo na cena presidencial ensaiado no 1.º turno: qualquer que seja seu papel, as sucessões de 2014 e 2018 passam por ele e por seu PSB.

No caso de Aécio, a derrota de José Serra em São Paulo abre o caminho para uma candidatura que andou sempre à base do conflito interno e que agora pode se firmar sem contestações. Mais que isso, crismada pela confirmação do erro do rival partidário em recusar a renovação que Lula impôs ao PT com êxito.

Campos e Aécio se beneficiam ainda das derrotas da presidente Dilma e do ex-presidente Lula em Salvador e Manaus, onde ambos empenharam prestígio e popularidade e foram derrotados por adversários históricos.

Nossos vereadores sem representatividade - MARCO ANTONIO RAMOS DE ALMEIDA

FOLHA DE SP - 29\10


Os eleitos tiveram só 33,6% dos votos, se somados. No Brasil, o cidadão vota em um vereador e acaba elegendo outro. É preciso adotar logo o sistema distrital

É comum o cidadão ser acusado de não se lembrar do vereador ou deputado no qual votou na última eleição. Mas isso não é culpa do cidadão. É que, normalmente, a imensa maioria do eleitorado vota em candidatos que não são eleitos. Foi o que mais uma vez aconteceu na eleição do dia 7 de outubro último.
Em São Paulo, 1.167 candidatos que disputavam uma das 55 vagas na Câmara Municipal.
Os 55 vereadores eleitos obtiveram juntos, exatos 2.367.187 votos -33,6% do total dos votos computados. Ou seja, 4.659.261 eleitores -ou seja, 66,3% dos que votaram, excluindo as abstenções- não votaram diretamente em nenhum dos eleitos.
Além disso, 67 candidatos não eleitos tiveram, cada um deles, mais votos que o candidato eleito menos votado (que teve apenas 8.722 votos).
Esses números demonstram a absoluta incongruência do atual sistema adotado no Brasil para a eleição de vereadores e deputados -o sistema proporcional.
Por ele, conta-se os votos que cada partido teve ao todo. A partir disso, determina-se quantas cadeiras aquele partido vai ocupar. O número mínimo de votos que o partido precisa ter para ocupar uma vaga é chamado de quociente eleitoral. São considerados eleitos os mais votados da coligação ou partido.
Dos eleitos nesta última eleição, só três -os candidatos Roberto Tripoli (PV), Andrea Matarazzo (PSDB) e Goulart (PSD)- atingiram, individualmente, o quociente eleitoral.
Isso acontece porque, nesse sistema, a imensa maioria dos eleitores vota num candidato, mas elege outro, ainda que da mesma coligação. Os adversários de um candidato não são os candidatos dos outros partidos, mas sim seus companheiros de legenda, que ele precisa superar para ganhar sua vaga.
Como o cidadão vota em um e elege outro, os eleitores não têm vínculos com os eleitos e vice-versa.
Além disso, é impossível que o eleitor consiga sequer saber quem são os mais de mil candidatos para poder, dentre eles, escolher aquele para o qual vai para dar seu voto.
Em contraponto a esse sistema, há o sistema distrital, adotado na imensa maioria das democracias.
No caso de São Paulo, pelo sistema distrital a cidade seria dividida em 55 distritos eleitorais, com aproximadamente 160 mil eleitores cada. Cada partido ou coligação indicaria um único candidato por distrito. Os eleitores de cada distrito escolheriam seu representante (vereador) dentre poucos candidatos, que teriam a oportunidade de discutir seus planos e ideias com a comunidade local. Inclusive poderiam ser promovidos debates entre os candidatos de um mesmo distrito.
Seria eleito o candidato mais votado do distrito. Alguns países adotam inclusive o segundo turno para eleições legislativas, quando o candidato mais votado não supera a marca de 50% dos votos.
Para os candidatos, a campanha eleitoral seria muito mais focada, pois, em vez de trabalhar com um conjunto teórico de quase 9 milhões de eleitores, trabalhariam com um conjunto real de cerca de 160 mil, agrupados numa mesma região.
Uma vez eleito, o vereador passa a ser o vereador de toda a comunidade do seu distrito. E é à comunidade do seu distrito que o vereador tem de prestar contas de sua atuação. E é dele que a comunidade do distrito tem de cobrar atitudes e votos no Legislativo municipal.
Isso também evitaria, ou pelo menos minimizaria, a preocupante tendência, que cada vez mais se observa, de vereadores representarem setores específicos e corporativos como igrejas, categorias profissionais, clubes de futebol, perueiros e outros setores organizados, em detrimento do interesse coletivo.
Mais simples e compreensível, menos susceptível ao poder econômico, mais fácil para o eleitor controlar a atuação dos eleitos. Talvez por isso não seja o adotado entre nós.

Terceiro turno - DENISE ROTHENBURG


Correio Braziliense - 29/10


Começa agora oficialmente a campanha para a presidência da Câmara e do Senado. E quem surge como fiel da balança nesse novo tabuleiro é o PSD de Gilberto Kassab, afastado do PSDB e disposto a se aproximar mais do governo Dilma


Virada a última página das eleições municipais, abre-se o livro da campanha para presidente do Senado e da Câmara dos Deputados. Se tudo correr conforme indica o figurino, caberá ao PMDB comandar as duas casas. Mas em política nem sempre a matemática é assim tão simples. Há quem tenha um certo receio de entregar o comando das duas casas legislativas aos peemedebistas. E, como não dá para fazer muita marola no Senado, onde o PMDB tem a maior bancada e aliados com uma certa folga em termos de votos, os ventos indicam que a confusão política está mais para a Câmara, onde os resultados eleitorais têm mais influência sobre o humor dos parlamentares.

A situação de Juiz de Fora (MG) neste segundo turno pode ser vista como um exemplo. Lá, o PT disputou contra o PMDB. A candidata do PT, Margarida Salomão, obteve o apoio do PSB do deputado Júlio Delgado, que desponta no Congresso com potencial de atração daqueles insatisfeitos com o resultado das eleições municipais. O gesto obviamente não levará todos os deputados do PT de Minas Gerais a apoiar Delgado, mas, entre os socialistas, há quem acredite ser possível angariar alguns votos por ali. Além de tentar contar com todos aqueles que brigaram com o PMDB nas eleições municipais, aliados de Júlio Delgado desejam atrair todos aqueles interessados em balançar a união entre PT e PMDB para ocupar o lugar dos peemedebistas no casamento com Dilma em 2014. Nesse segmento, a intenção de Delgado é tentar buscar o PSD do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Afinal, se Delgado ficar apenas com o PSDB e o DEM se caracterizará como um candidato de oposição ao governo, coisa que ele não deseja.

Por falar em Kassab...
O prefeito paulistano considera cumprida a sua missão junto ao PSDB. Com José Serra derrotado, acaba o casamento entre os dois partidos. Livre para seguir outros caminhos, Kassab não vai fechar logo com ninguém rumo a 2014. Seu primeiro gesto nesse período pós-eleitoral será no sentido de se aproximar do governo federal. Mas não tanto que pareça adesismo puro e simples da parte dele. O sinal de aproximação virá revestido num discurso para evitar o uso da disputa pela presidência da Câmara ou do Senado como um terceiro turno. E os objetivos desse gesto, além, é claro, de fortalecer o vínculo com o governo e criar pontes com quem o novo partido tem apenas pinguelas. Para levar avante esse projeto de criar laços políticos, a ordem entre os aliados de Kassab hoje é apoiar a candidatura de Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), partido com o qual os kassabistas têm um relacionamento meio distante hoje. Assim, Kassab espera deixar claro ao governo que seu partido está afastado do PSDB e não tem compromisso firmado com ninguém no futuro. Ou seja, pode apoiar a presidente Dilma Rousseff numa campanha reeleitoral ou, se for o caso, seguir com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Embora tudo indique que seja um nome a se apresentar em 2014 para a campanha presidencial, ainda não se pode afirmar com plena certeza que o socialista seguirá esse caminho.

Enquanto isso, na sala de Dilma...
Fortalecida pela vitória de Fernando Haddad em São Paulo, a presidente Dilma Rousseff vai cuidar agora da política. Aceitará de bom grado a aproximação com Kassab, que já avisa de antemão que não deseja ser ministro, embora apresente sua bancada para que a presidente escolha quem desejar. Nesse sentido, de reforçar laços, não será surpresa ainda se Dilma chamar o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, para uma conversa "americana", ou seja, "olho no olho" para tentar desfazer qualquer rusga eleitoral. Afinal, a presidente tem dito a amigos que o PT tem que ser grande na vitória. Ela espera que todos tenham juízo para não deixar crescer o clima de terceiro turno.

Protecionismo - o debate equivocado - SANDRA POLONIA e JOSÉ TAVARES


O ESTADÃO - 29\10


Nas últimas semanas a questão sobre o aumento do protecionismo no Brasil tem ocupado espaço importante no debate nacional. Às acusações de que o País está recorrendo crescentemente a medidas de proteção, ultrapassando em alguns casos a linha da ilegalidade em relação a suas obrigações na Organização Mundial do Comércio (OMC), o governo brasileiro reage argumentando que age no limite das normas multilaterais de comércio e que nada mais faz do que defender a indústria nacional das medidas protecionistas dos demais.

Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo do dia 23/10, o secretário executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Alessandro Teixeira, classificou de "ultrapassadas" as regras de defesa comercial da OMC e reagiu às acusações de protecionismo: "Jogamos dentro das regras do jogo. E, dentro das regras, jogamos para ganhar. Ponto". Um mês antes, o ministro Guido Mantega havia recorrido ao ranking de países mais protecionistas elaborado pelo Global Trade Alert (http://www.globaltradealert.org) para refutar a visão de que o Brasil é protecionista. O ranking colocava o Brasil em 9.º lugar na lista, atrás de Rússia, Argentina, Índia, Estados Unidos e China, entre outros.

Esse debate parece um tanto equivocado. Em primeiro lugar, porque não faz sentido contar e comparar medidas de caráter completamente diferentes implementadas por países com graus variados de abertura ao comércio. O Brasil já é a economia mais fechada do mundo. Em segundo lugar, mais importante que discutir se "jogamos dentro das regras do jogo" é avaliar se essas medidas são adequadas aos objetivos de crescimento e desenvolvimento da indústria nacional.

O Brasil vem recorrendo de forma mais intensa a medidas de proteção desde meados de 2010. O arsenal de instrumentos que vêm sendo utilizados é variado e inclui, entre outros, a elevação de tarifas de importação, medidas antidumping, medidas não tarifárias e o amplo recurso à exigência de conteúdo nacional para acesso preferencial a compras governamentais ou a incentivos fiscais e creditícios. Exemplo recente de medida protecionista que pode ter efeitos deletérios sobre a competitividade da indústria brasileira foi a elevação das tarifas de importação para 100 produtos, de acordo com a Resolução Camex de 28 de setembro (implementando a Decisão 39/11 do Mercosul).

A média das tarifas aplicadas aos 100 produtos incluídos na lista antes da Decisão era de 13,7%. Essa média foi elevada para 23,6% - um aumento de cerca de 10 pontos porcentuais. A composição da lista é surpreendente para quem está preocupado com questões de competitividade: com exceção das batatas, talheres e alguns tipos de papéis, os demais produtos da lista são insumos (químicos e siderúrgicos em sua maioria), partes e peças para produtos diversos e bens de capital. Não é provável que o aumento da proteção desses produtos contribua para a competitividade da indústria brasileira, principalmente dos produtos a jusante nas cadeias produtivas que empregam esses insumos, partes e peças ou bens de capital.

A preocupação aumenta quando se comparam as tarifas cobradas no Brasil com as de outros possíveis concorrentes nos mercados internacionais com produtos manufaturados brasileiros: na África do Sul, a média das tarifas desses 100 produtos é 5%; na China, 7,5%; na Coreia do Sul, 5,1%; na Índia, 8,5%; no México, 4,5%; e na Turquia, 3,7%.

Ora, sempre se pode argumentar que os impostos de importação dos insumos e partes e peças podem ser rebatidos, por meio do uso do drawback, se os produtos que os utilizam forem exportados. Portanto, a competitividade das exportações não seria prejudicada. Mas nem todas as empresas conseguem fazer uso desse instrumento e, se as vendas forem destinadas ao mercado doméstico, os impostos pagos sobre os insumos não serão rebatidos. Resultado: as medidas implementadas pelo governo em 28 de setembro irão exacerbar as desvantagens comparativas das indústrias produtoras de bens finais em relação às suas congêneres no resto do mundo.

A política de proteção faz parte de um estilo de política industrial que foi usado com relativo sucesso no Brasil durante a segunda metade do século passado, mas que não mais atende aos desafios que a indústria nacional enfrenta nos dias atuais, por uma razão simples: a natureza dos problemas vividos pelo País naquela época é radicalmente distinta daquela que vigora hoje.

O principal problema da indústria brasileira hoje em dia não é o de aumentar o conteúdo doméstico da produção, mas o de ser capaz de acompanhar o ritmo do progresso técnico internacional e se inserir competitivamente nas cadeias globais de valor. Na verdade, após dez anos de apreciação cambial, o Brasil continua sendo a economia mais fechada do mundo: em 2010, a parcela do PIB relativa a importações de bens e serviços foi de apenas 12%. Nada indica que, passados dois anos de uso mais intensivo de medidas voltadas a proteger a produção doméstica, estejamos indo na direção esperada: recuperação da indústria com maior produtividade e crescente inserção internacional. Enquanto isso, a muito mais promissora agenda do "custo Brasil" continua encalhada em Brasília.

Uma morte anunciada - LÚCIA GUIMARÃES


O Estado de S.Paulo - 29\10


NOVA YORK - "O Paraíso é real". A manchete na capa acompanhava a foto da mão estendida para o céu. Na redação que produziu a reportagem, o ambiente estava mais para o purgatório ou o inferno da perda de emprego, iminente ou adiada. Não há coincidência entre o tema da capa sobre um neurocirurgião americano que narra em livro sua experiência em estado de coma e o anúncio de que a estimada revista Newsweek, marca mundial do jornalismo americano, não vai comemorar seus 80 anos na bancas.

A editora chefe Tina Brown, que forçou, em 2010, o casamento incompatível do site agregador Daily Beast com a revista semanal, não pode ser culpada por tentar apresentar a situação como uma passagem ditada pelo tsunami da tecnologia digital. Estamos abraçando o futuro, disse ela. Uma Newsweek Global emerge on-line a partir de janeiro e torço por ela. Mas Tina Brown, com seu sensacionalismo e, antes dela, o editor Jon Meacham, com seu fastio nostálgico, podem assumir parte da responsabilidade por desfigurar uma publicação, com suas receitas opostas para enfrentar a crise da mídia impressa.

Este ano foi particularmente cruel para as tropas de Tina. Capas bombásticas comoMuslim Rage (A Ira Muçulmana), demonizando boa parte da população do planeta, ou Hit the Road, Barack (Pega a Estrada, Barack), em que o pusilânime Niall Ferguson fez picadinho de dados econômicos e foi rechaçado com veemência, atraíram escárnio. A capa da princesa Diana envelhecida por photoshop foi de um mau gosto fenomenal.

Estrela do papel e tinta criada em meio aos excessos dos anos 90, ex-editora da Vanity Fair, da New Yorker e da defunta Talk, Tina tinha fama de consumir orçamentos com o mesmo apetite com que buscava atenção. Ao relançar a Newsweek impressa, no ano passado, ela prometeu modéstia, mas suas capas cortejavam clicks on-line e não prestígio editorial.

Não me arvoro a especialista na economia desta indústria, mas chamo atenção para o fato de que a Time, eterna concorrente da Newsweek, vai bem de saúde, sem baixar o nível editorial. É o mesmo caso da revista Esquire, bastião do Novo Jornalismo, na década de 60, e comatosa em 2009, que viu sua receita publicitária aumentar.

"A Newsweek não morreu, ela cometeu suicídio", disse à Associated Press o professor Samir Husni, que dirige um centro voltado para a inovação em revistas da Escola de Jornalismo da Universidade do Mississippi. Husni acha que a direção editorial e não o efeito da Grande Recessão desferiu o golpe fatal. A mesma reportagem da AP afirma que 2012 registrou um aumento modesto das assinaturas de revistas e da receita publicitária.

Como ficou claro na recente reunião da Sociedade Interamericana de Imprensa, em São Paulo, as transformações na indústria da informação têm seu lado brutal. Mas não é preciso um MBA em Harvard para usar o bom senso. E lembrar que o rádio ia matar os jornais, a TV ia matar, não só o rádio, mas também o cinema, a TV a cabo ia matar a TV aberta e a internet ia matar o livro. Todas essas mídias se adaptaram a novas realidades, às vezes, cortejando segmentos e não unanimidades.

O cobiçado jovem consumidor, que cresceu sem ler jornal impresso e lê notícia de maneira mais pulverizada e autorreferente pela mídia social, vai, por virtude da educação e do passar dos anos, se transformar num leitor mais exigente. Apostar na infantilização do público, como fez a Newsweek, faz lembrar a ansiedade para cortejar a classe C no Brasil. Acredito que o leitor educado fareja asneira e desespero para chamar atenção. Assim como o elusivo eleitor indeciso desta eleição americana, estas construções de supostos públicos-alvo me parecem tão reais quanto o unicórnio.

A filosofia de lavar a louça - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 29\10


Estudar, contemplar, trabalhar. Um ato alimenta o outro, e os três formam o espírito


Fala-se muito de como o "Primeiro Mundo é isso e aquilo". Acho isso papo de vira-lata. Toda vez que você ouvir alguém falando que a Europa "é outra coisa", você está diante de um vira-lata rondando a lata de lixo dos outros. A mesma coisa vale para os EUA, ainda que, nesse caso, vira-latas de esquerda jamais elogiem os EUA, mesmo que comprem iPads lá.
Mas independentemente dessa breguice de vira-lata querendo fingir que entende de vinhos, há um detalhe na vida europeia e norte-americana que vale a pena discutir: a vida doméstica e suas tarefas.
Mas, sintomaticamente, os vira-latas nunca falam disso, porque a própria condição de vira-lata os impede de entender ou mesmo enxergar esse detalhe. O sonho do vira-lata é fingir que é llhasa apso e por isso acha que ser um llhasa é desfilar bolsa Prada no JK Iguatemi.
O Brasil é terra de atrasado, corrupto, esculhambado, inculto, novo rico e por aí vai. Tudo isso é verdade. A prova disso é que aqui luxo é ostentação. Suspeito que grande parte do que há de fato de bom na Europa e nos EUA em termos de hábitos e costumes (portanto, estamos falando de moral) se deve ao fato de que nesses lugares as pessoas se movimentam de modo diferente no cotidiano das suas tarefas.
Sempre ouvi os mais velhos dizerem que "o costume de casa vai à praça" e isso é a mais pura verdade. Além de fazerem sexo melhor, suspeito também que os mais velhos entendiam bem melhor do que é essencial, principalmente porque não tinham essa parafernália de ideologia e outros quebrantos bobos como ferramenta de análise do mundo.
Eles observavam a vida sem a presunção de ter descoberto a chave do mundo, como nossos contemporâneos viciados em "teorias de gabinete", como dizia Edmund Burke.
Lembro-me bem que minha filha, chegada à França com cerca de dois anos de idade, chorava porque não podia lavar louça como meu filho, seu irmão, mais velho do que ela nove anos. Isso é sintomático de muitos outros pequenos detalhes: para ela, lavar a louça era parte de ser da família. Meu filho, minha mulher e eu partilhávamos todo o cuidado com a vida cotidiana, inclusive o cuidado com a caçulinha.
Em países como a França, Alemanha, Israel, EUA e outros semelhantes, você é responsável por tudo que acontece na sua casa. Roupa, comida, limpeza, compras, resolução de pequenos problemas logísticos, enfim, da sustentação da vida.
As casas (menos nos EUA, mas ainda assim a ocupação de espaço é diferente da nossa) são menores e mais simples, mesmo que com mais parafernália tecnológica, quando você tem condição de tê-la.
O que me chama atenção em relação às casas não é só seu tamanho, mas a ocupação do espaço. No Brasil temos a famosa sala de visita que, se você "está bem de vida", deve ser completamente inútil e parecer desocupada. Por isso, sempre suspeito que manter uma parte da casa sem uso é signo de vira-lata.
As aristocracias antiga e medieval, as únicas verdadeiras, também não tinham castelos sem uso. Burguês, e aristocracia falida, com "castelo" na zona leste ou nos Jardins é coisa de "wannabe", como dizem meus alunos.
Goethe, em seu maravilhoso "Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister", descreve o que é a casa de um burguês: ter mais coisas do que precisa e não ter uma relação de uso e necessidade real com os objetos da casa.
Este é o caso. Uma sala de visitas imaculada faz você parecer rico o bastante para manter parte da sua casa sem uso e, com isso, você trai sua breguice burguesa. Acho que grande parte de nossas agruras vem do fato de que não lavamos louça com frequência e de que temos cômodos dissociados de nosso cotidiano e necessidades.
Basílio Magno (século 4) criou a regra da vida monástica: estudar, contemplar, trabalhar. Uma atividade alimenta a outra, e as três formam o espírito. A sabedoria monástica é uma das maiores criações do espírito humano.
Entre nós, dar "tudo" para os filhos até os 40 anos de idade é signo de sermos bons pais. E com isso preparamos adultos retardados e com futuras salas de visita cheias de fantasmas de nossa pobreza de espírito.

Fins de papo - HUMBERTO WERNECK


O Estado de S.Paulo - 29\10


Ainda que seja a última coisa que eu faça, estou mergulhado num livro farto em últimas palavras de gente famosa. Vou avisando: não se trata de uma Caras terminal (umaEsgares, algo assim). É obra douta e séria, mais que isso, francesa, ao largo de frivolidade ou voyeurismo.

Mortes imaginárias, de Michel Schneider, é bem mais que uma coletânea de frases exaladas in extremis por grandes escritores - de Stendhal a Truman Capote, de Rilke a Nabokov. Mas confesso que o que me pega, até o ponto da leitura em que me encontro, é o lance das últimas palavras - pérolas pré-fúnebres que me senti tentado a ir catar também no balaio menos rigoroso do Google.

Palavras como as de Laurence Sterne, o autor de Tristam Shandy, que ao sentir a aproximação da morte não se equivocou: "Agora sim. Ela chegou." Ou as do francês Léon-Paul Fargue, que não quis delongas: "Depressa! Depressa!" Ou, ainda, do poeta Byron, outro que não opôs resistência à Indesejada das Gentes - e até liquidou seu estoque de pontos de exclamação: "Morrer! Dormir! Finalmente dormirei!" Timothy Leary, exemplo de rebeldia, entregou os pontos ao constatar que na órbita vazia da caveira lhe piscava um olho: "Por que não?"

"Não, não", esperneou Emily Brontë diante de ventos mais que nunca uivantes. "O horror, o horror!", arrepiou-se Joseph Conrad ao pressentir o verdadeiro coração das trevas. Aos 80 anos, Anatole France pediu colo: "Mamãe, mamãe!". Dono de escrita para muitos impenetrável, James Joyce exasperou-se: "Será que ninguém entende?". E o pai da psicanálise, no divã da morte, deu sinais de estar diante de algo que nem Sigmund Freud explicava: "Isso é um absurdo!

Estilista, Henry James não deixou de fazer texto no instante derradeiro: "Eis, finalmente, a coisa admirável". O inconformista André Gide mansamente se deixou levar: "Está bem". Ou terá dito "Não é nada", como dão conta testemunhas de seu passamento? Quando se trata de últimas palavras, nem sempre batem as informações. Segundo São João, Cristo se entregou ao Pai com um lacônico "Está consumado", mas o não menos santo e evangelista Lucas registrou arremate mais elaborado: "Pai, em Tuas mãos entrego o meu espírito." Também no caso de Rabelais há controvérsias: uns dizem que o escritor francês foi teatral na despedida - "Fechem as cortinas, a farsa acabou" -, mas há quem assevere ter o criador dos gigantes Gargântua e Pantagruel anunciado a intenção de ir "em busca de um Grande Talvez", seja lá o que for isso.

Aqui e ali, há que suspeitar de mão alheia no embalsamamento das últimas palavras, no afã de melhorá-las - com o risco de trair o estilo ou a filosofia do finado. Bem obrou Getúlio Vargas ao declarar por escrito que deixava a vida para entrar na História. Difícil crer, em todo caso, que Voltaire tenha encerrado seus dias com semelhante retórica: "Por todo o dinheiro da Europa, não quero ver mais um incrédulo morrer!"

A julgar por depoimentos de quem lá chegou, na hora do vamos ver a coisa em mais de um sentido fica preta. "Eu vejo uma luz negra", fez saber Victor Hugo. O historiador inglês Edward Gibbon revelou que "tudo é escuro e duvidoso" - razão pela qual o alemão Goethe clamou por "mais luz". Foi o que pediu também - "Acenda as luzes, não quero ir para casa no escuro" - o contista americano O. Henry. Mas Thomas Edison, o inventor da lâmpada elétrica incandescente, mesmo sem ela gostou do que viu: "É muito lindo ali", sussurrou. Thomas Hobbes, o filósofo inglês, experimentou sensação de abismo: "Estou diante de um terrível salto nas trevas" - escuridão pela qual seu colega David Hume terá ansiado, pois há indícios de que foi parar em lugar pior: "Estou nas chamas!", gritou ele.

Arrependido da luxúria a que escancaradamente se entregara, ou querendo mais, o papa Alexandre VI pediu tempo ao ver chegar a dama de alfanje em punho: "Espere um momento..." É o que pede também este cronista, pois sobre o assunto não serão estas as suas últimas palavras. Tem mais para a semana que vem.

Neurônios demais - RUY CASTRO

FOLHA DE SP - 29\10


RIO DE JANEIRO - Pesquisa de cientistas brasileiros, divulgada internacionalmente, comprovou que o cérebro humano só se diferenciou do dos outros primatas quando o homem aprendeu a cozinhar. Mas, atenção -não significa que você tenha um cérebro superior ao dos seus amigos apenas porque às vezes cozinha um macarrão para eles no seu apartamento.
A pesquisa se refere ao princípio do uso do fogo pelo homem, entre 600 mil e um milhão de anos atrás. Naqueles tempos pré-internet, uma novidade levava séculos para viajar de uma caverna a outra, mas o fogo foi algo tão espetacular que se disseminou como um viral. Os alimentos cozidos, mais fáceis de mastigar e digerir, permitiram maior absorção de calorias, levando ao aumento da massa encefálica e do número de neurônios do cidadão. Ato contínuo, ele desceu da árvore e começou a ler Kierkegaard. Bem, deu no que deu.
A ideia é a de que, enquanto passava a folhas, sementes, raízes e outros alimentos hoje preconizados pelos naturebas, o homem não consumia calorias suficientes para uma produção decente de neurônios. Além disso, o esforço de mastigação requerido por aquela dieta crua fazia com que não tivesse tempo para mais nada. O cozimento dos alimentos deu-lhe horas livres, que ele usou para desenvolver sua vida social -como sair para almoçar com a turma, do que resultaram ainda mais neurônios.
De repente, o homem se viu até com mais neurônios do que precisava -86 bilhões, pela última contagem. E, de certa forma, até hoje é assim, razão pela qual as pessoas se dedicam a apagar alguns milhões de uma sentada, tomando porres, queimando fumo ou lendo "Crepúsculo".
Os orangotangos e os gorilas, ex-colegas de turma do homem, continuaram com a sua dieta básica e ficaram para trás, repetindo ano. Mas, na sua modéstia, não estão se queixando.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO


FOLHA DE SP - 29;10


Desnível salarial entre sexos alcança 53,8%
A diferença salarial entre homens e mulheres é maior entre profissionais com nível superior completo, segundo pesquisa do Insper.

O estudo mostra que a discrepância de remuneração no país é de 16%. Quando são consideradas apenas as pessoas com maior escolaridade, no entanto, esse número salta para 46,9%.

O desnível é ainda mais acentuado entre os profissionais com nível superior e renda mais elevada. Nesse grupo, a diferença alcança 53,8%. Na parcela com rendimentos menores, a média é de 36,8%.

A divergência ocorre em decorrência do fato de as empresas promoverem com menor frequência as mulheres aos cargos de presidência.

"Os homens alcançam esse nível antes. Então a experiência no cargo é muito maior e o salário, também", afirma a professora Regina Madalozzo, uma das responsáveis pela pesquisa.

"Esse resultado acontece também em outros países. É o que chamamos de 'teto de vidro'. Não existe uma barreira visível, mas as mulheres dificilmente conseguem passar [a cargos de alta gerência]", acrescenta.

"Isso pode ter uma consequência grave, que é a mulher ficar desestimulada para se qualificar."

O estudo também aponta que 68,2% das pessoas formadas em uma universidade realizam algum trabalho em casa durante a semana. Entre as mulheres, porém, a parcela é de 81%, enquanto entre os homens fica em 51%.

A pesquisa usou como base o Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2007, 2008 e 2009.

ENGENHARIA ESTUDANTIL
A Ideal Invest, gestora do crédito universitário Pravaler, vai investir mais de R$ 100 milhões nos próximos anos em ampliação de equipe, sistemas e comunicação.

A meta é beneficiar mais 100 mil estudantes no país em cinco anos, além dos 30 mil já registrados, segundo Oliver Mizne, presidente da Ideal Invest.

A demanda cresce especialmente entre engenheiros, fonte de carência para o avanço da infraestrutura brasileira, segundo Mizne.

A empresa registrou 3.000 engenheiros beneficiados pelo programa.

"Quase 90% dos nossos estudantes estão fora de São Paulo e Rio. Muitas universidades abriram cursos de engenharia no país", afirma.

100 mil é o numero de alunos que a empresa pretende adicionar nos próximos cinco anos

88% é a parcela dos estudantes beneficiados pelo programa que vivem fora de São Paulo e do Rio de Janeiro

Crédito na... 
O consórcio Embracon e a KMX do Brasil fecharam parceria para começar a vender um novo consórcio de máquinas para pintura e acabamento.

...parede 
O público dos planos, de 25 a 36 meses, serão pequenos empreendedores e grandes empresas de construção. As linhas de crédito vão de R$ 4,5 mil a R$ 30 mil.

TRANSFORMAÇÃO FINANCEIRA
Após finalizar o processo de aquisição da Banif Corretora, em junho, a CGD Securities, do Grupo Caixa Geral de Depósitos, vai lançar sua nova marca de varejo.

O portal financeiro DirectaInvest irá substituir o antigo BanifInvest, segundo Fábio Feola, diretor-presidente da CGD Securities.

"Foi feita a reformulação de aspectos tecnológicos e adicionamos novas plataformas de produtos", diz.

Haverá equipes no Brasil e em Portugal para atender investidores e a plataforma tecnológica da CGD poderá fornecer serviço para outras corretoras ou bancos, de acordo com Feola.

A corretora tem 58 mil clientes ativos e volume diário de R$ 80 milhões, segundo a empresa.

Construção pesada registra queda de nível de emprego em SP

Após a redução do nível de emprego na construção civil no Estado de São Paulo em setembro, a construção pesada registrou também números negativos.

O mês foi o primeiro do ano em que o setor apresentou queda, de mais de 400 vagas, ante uma alta de quase 500 em agosto, segundo o Sinicesp (sindicato da indústria).

O ritmo de desaceleração teve início em março.

"As obras estão saindo, mas esperávamos mais obras e em maior velocidade. Acreditávamos que as concorrências sairiam mais cedo", afirma Helcio Farias, do Sinicesp.

Em setembro do ano passado, o número de emprego ficou positivo em mais de 300 vagas, segundo o sindicato.

Apesar do resultado do mês, o desempenho de 2012 é superior ao ano passado.

O acumulado deste ano registra aproximadamente 11,7 mil trabalhadores, crescimento de mais 11% na comparação com 2011.

"Ainda temos perspectiva de que volte a melhorar, com novas obras nos próximos meses", afirma Farias.

Edifício do poder, sem nº - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO


O Estado de S.Paulo - 29\10


Mudam divisórias, PT e PSB ganham mais espaço, PMDB e PSDB perdem salas, mas as estruturas do edifício do poder continuam inalteradas no Brasil. Os petistas ocupam a cobertura há 10 anos, mas o restante do prédio é dividido entre 30 condôminos. O PT elege o síndico, mas não administra o condomínio sem ceder poder a outros. Ninguém tem hegemonia. E é bom que seja assim.

O PT sai maior das urnas, mas com direito a ocupar apenas 11% das prefeituras e a governar 20% do eleitorado local. Tudo bem que isso inclui o canto mais populoso do edifício, a sala São Paulo, mas está longe de configurar um domínio da política brasileira. O partido de Lula cresce, mas não é o único. O PSB vem na cola e tem seus próprios planos.

O partido do governador Eduardo Campos, de Pernambuco, elegeu 131 prefeitos a mais do que em 2008 e entrou para o seleto clube dos 10%: os prefeitos do PSB passarão a governar uma fatia que corresponde a 11% do eleitorado local a partir de janeiro. A sigla dobrou o que conseguira quatro anos atrás: governará 15 milhões de eleitores. Só outros três partidos estão nesse clube.

A base municipal obtida pelo PSB é necessária para o partido barganhar melhores condições numa coligação presidencial, mas, sem articulações com outras siglas, é insuficiente para lançar o governador pernambucano à sucessão de Dilma Rousseff (PT) na disputa de 2014. Por isso, devem crescer as conversas de Campos com os tucanos, por exemplo.

O PSDB viu sua participação no bolo do eleitorado municipal cair de 14% para 13% nesses quatro anos. A maior queda foi a do PMDB: de 22% para 17% do eleitorado municipal. A fatia do PT cresceu de 16% para 20%.

Todas essas participações são maiores do que o pedaço do bolo que está no prato de Eduardo Campos, por enquanto. Mas o tamanho e a distribuição das fatias devem continuar mudando mesmo depois de terminada a apuração.

Há, por exemplo, as conversas de fusão entre o PP de Paulo Maluf com o PSD de Gilberto Kassab. O primeiro encolheu, e o segundo roubou prefeitos e prefeituras de todos os partidos médios e virou uma sigla com boa penetração nos rincões do Brasil profundo. O PSD é uma contradição em termos: cresceu, mas encolheu. Os seus 497 novos prefeitos governarão, juntos, um eleitorado equivalente ao que Kassab deixará de governar.

Mesmo assim, se PSD e PP virarem PSDP ou PPSD comandarão 966 prefeituras e governarão 16 milhões de eleitores. Ficariam em segundo lugar no ranking de prefeitos e em quarto no de eleitorado a governar. Como serão, na imensa maioria, cidades pequenas, não devem movimentar muito dinheiro, mas, a depender a distribuição geográfica, têm potencial para eleger a terceira ou quarta maior bancada de deputados federais em 2014.

Falsa hegemonia. Colocados em perspectiva, os avanços do PT mostram que o partido de Dilma e Lula está longe de ter se tornado hegemônico: 89% das prefeituras e 80% do eleitorado municipal estarão nas mãos de outras legendas partidárias. Não dá para fazer o que bem entender na assembleia do condomínio sem colher uma reação negativa dos outros condôminos. O poder petista é consorciado. Para ser exercido continuará dependente de alianças.

O resultado do 2.º turno em si mostra que quando o PT enfrenta um duelo dois a dois e seu desempenho piora bastante. Dos 22 segundos turnos que disputaram, os petistas ganharam só em oito municípios. A taxa de sucesso foi de apenas 36%, praticamente duas derrotas para cada vitória.

Essa é uma característica do PT. Para continuar crescendo, o partido de Lula precisará fazer um esforço cada vez maior. Como elege proporcionalmente menos candidatos do que o PMDB e o PSDB, por exemplo, precisará lançar um número ainda maior de postulantes a prefeito em 2016 para aumentar sua fatia de poder municipal. Até agora tem conseguido, mas a um custo relativamente mais alto do que o de seus aliados e rivais.

O PT chegou ao posto de maior partido brasileiro graças a uma organização nacional, a um projeto de poder e a lideranças carismáticas. Seu principal concorrente, o PSDB, tem uma lição de casa mais trabalhosa. Precisa renovar suas lideranças, ajustar seu discurso eleitoral e corrigir deficiências regionais.

Das sete centenas de prefeitos tucanos, 45% estão concentrados em São Paulo (176) e em Minas Gerais (142). Isso pode ser um problema para o PSDB eleger deputados federais em 2014, principalmente no Ceará, na Bahia e no Rio Grande do Norte.

Saída é a inovação - PAULO BORNHAUSEN


O Globo - 29/10


A vinda da BMW abre uma nova fronteira automotiva no Brasil.

Trata-se de um marco histórico para a nossa economia, mas deve ser vista, também, como uma nova era para a economia do país, focada na inovação e na sustentabilidade.

Em Santa Catarina, passamos por um processo de reavaliação e de valorização de nossas qualidades específicas a partir do momento em que o governo tomou a decisão de dar prioridade ao investimento em inovação.

Isso foi antes da Resolução 13, da "guerra dos portos", que, de certa forma, reforçou a determinação de trazermos uma empresa mais preocupada com as condições estruturais do estado, do que propriamente com incentivos fiscais e econômicos - claro, sem deixá-los de fora.

A exemplo do que foi feito pelo governo federal, criamos nosso próprio regime automotivo. Mas estabelecemos, como limite, não sacrificar o equilíbrio orçamentário do estado.

Construímos um modelo baseado no desenvolvimento econômico que queremos.

Queremos indústrias que trafegam na fronteira do conhecimento, não só no setor automotivo, mas também aeroespacial, aeronáutico e de defesa, integrados ao programa apresentado à BMW.

Estamos gerando emprego de qualidade e formação profissional de alta qualificação.

É importante frisar que, mesmo com os benefícios que estará recebendo, esta empresa e outras que virão, com certeza, não deixarão de recolher impostos ao estado em momento algum. E tudo que lhes é oferecido, as empresas catarinenses têm direito ou já usufruem.

Queremos a BMW e tantas outras grandes empresas que possam agregar valor à nossa economia. No entanto, antes disso, estamos investindo fortemente na indústria aqui instalada, sempre em parceria com o Sebrae de Santa Catarina.

Fortalecemos a microeconomia, investindo nos microempreendedores individuais. Apoiamos as micro e pequenas empresas com o Nova Economia, com consultoria de gestão e de inovação.

Trabalhamos com 2.400 empresas de todas as regiões do estado. Investimos nos setores fundamentais, como metal-mecânica e outros, criando uma grande rede de fornecedores e de prestadores de serviços que atuarão no entorno das grandes empresas que aqui se instalarem.

Sem demérito de qualquer outra região brasileira que tenha se candidatado a receber a primeira fábrica da BMW na América Latina, o fato de a fábrica alemã ter sido a primeira a fazer acordo conosco é emblemático.

O estado recebe um selo de qualidade, um certificado de ISO 9000. E o Brasil também, haja vista a manifestação imediata de outras grandes empresas no sentido de virem para o nosso país.

Sonho de uma noite de primavera - RENATO JANINE RIBEIRO


Valor Econômico - 29/10


Hoje de manhã teve lugar a convenção do PT que indicou Fernando Haddad candidato a estas eleições presidenciais de 2022. O ex-governador nos recebeu minutos antes da plenária, enquanto dava o nó na gravata. Estamos concluindo um filme sobre a cidade de São Paulo, ele só teve essa janela em sua agenda e queremos ouvi-lo sobre sua primeira campanha eleitoral:

- Parece que foi ontem! diz, com sua voz rouca. Foi bonito. Quatro [filhos de] imigrantes disputando, dois oriundi e dois árabes... Parecia o mar Mediterrâneo. Foi um marco para São Paulo, por isso nem importa tanto quem ganhou, quem perdeu. Lembro o jantar que Russomanno preparou para o quarteto depois do segundo turno, todo de comida italiana - eu levei o babaganuch e o homus, Serra, os vinhos que conhecia do Chile, e o Chalita, esfihas inesquecíveis... Jogamos canastra, até dez mil pontos, carcamanos contra turcos, berrando como loucos.

A carreira política de Haddad fora irregular. Começou concorrendo a essa eleição, que teve várias reviravoltas, antes de um final inesperado, para a Prefeitura de São Paulo:

Carcamanos contra turcos, berrando como loucos

- E nunca antes na história do Brasil se viu isso, o vitorioso convidar os concorrentes para a posse e depois formar um conselho com eles e mais alguns ex-prefeitos da cidade, do Rio, de Curitiba... Melhor discutir com eles do que com vereadores, porque afinal um candidato precisa ter propostas, e alguns legisladores têm interesses muito locais, não têm visão do conjunto.

Baixa o tom de voz, fica íntimo, confidencial:

- Aprendi muito com esse conselho, porque antes eu só fui chefe, entendeu? Tive que lidar com iguais e superiores, dizem que isso reduziu uma arrogância e vaidade que eu nunca notei em mim, mas acho que saí disso um ser humano melhor, quem sabe, um político mais humano.

Depois, foi governador. Somando tudo, ganhara duas eleições e perdera duas. A voz embargada:

- Pena que Lula não pôde vir à convenção, mas está convalescendo e há de ficar bem.

O PT é detentor de um recorde na história do país, com dois presidentes sucessivos (o mesmo número que o PSDB), só que ambos reeleitos. A sociedade reduziu a miséria ao mínimo e se aproxima cada vez mais do sonho da ex-presidenta Dilma Rousseff: ser um país de classe média. Mas a Haddad cabe uma tarefa difícil, recuperar para o partido a Presidência perdida em 2018:

- Se conseguimos devolver à política paulista o respeito mútuo, o debate de propostas, por que não faremos isso na escala do Brasil?

Estamos rodando este filme há dez anos. Começamos em 25 de outubro de 2012, às vésperas de um segundo turno para a Prefeitura de São Paulo, quando entrevistamos José Serra; foi inevitável a conversa enveredar para o ano em que ele se elegeu presidente da República, sucedendo a FHC, ou seja, 1998:

- Não foi aprovada a reeleição para o Fernando [Henrique Cardoso], então o partido convergiu para o meu nome, com uma pequena ajuda minha (risos). E assumi no meio de uma crise braba, com os emergentes desabando. Foi a primeira vez que uma crise dessas foi resolvida sem derrubar a produção. Sempre me chamaram de desenvolvimentista, fiz jus ao nome. Segurei a moeda, mas não destruí a economia.

Perguntamos se sente mágoa porque não voltou à Presidência da República depois de seu único mandato:

- Bem, vocês leram "O economista e o presidente", a entrevista em que fiz o balanço de meu governo. Mas só consegui aprovar a reeleição no Congresso porque aceitei que não valesse para mim, apenas para meu sucessor. Isso, porque a oposição dizia que não era justo mudar as regras do jogo para beneficiar (imaginem só!) quem estava no poder. Foi a diferença entre meu projeto e o dos tempos do Fernando, que perdeu por pequeno número de votos. E me envolvi mesmo na discussão no Congresso, e consegui uma quase unanimidade. Mas com isso um único brasileiro ficava proibido de concorrer em 2002, e este brasileiro era o presidente da República. Salvei a economia, e fui punido.

Ele estava de saída para o Instituto José Serra, que trabalha em dobradinha com o iFHC, embora com vocações um pouco diferentes - o primeiro foca gestão, economia e saúde, enquanto o segundo prioriza a política, a cidadania, a educação. Os dois ex-presidentes tucanos almoçam juntos pelo menos uma vez por mês.

Enquanto dava a entrevista, bebia água aos poucos, hábito saudável que adquiriu quando ministro da Saúde:

- Como foi digerir a derrota para Lula em 2006?

- Bem que eu gostaria de concluir o que começamos. Mas é assim mesmo. A gente se esforça e outro colhe os louros.

Já no fim da entrevista, quando lhe perguntamos sobre sua decisão de concorrer agora à Prefeitura de São Paulo, eleição esta que perdeu duas vezes no passado:

- Termino por onde não comecei... É bonito ser prefeito da cidade em que a gente nasceu. Mas sabe, quero dizer uma coisa. Ser presidente é muito bom. Você realiza seus ideais. [Fernando] Collor não, está sempre irritado. Mas veja o Fernando [Henrique Cardoso], que sempre foi alegre, ficou ainda mais feliz. Mesmo Lula, que tanto tempo espumou de raiva, hoje é só sorrisos. E eu fiquei de bem com a vida. Qualquer resultado que obtenha, ninguém tira de mim o que fiz.

Uma risada envergonhada:

- O sucesso torna os homens bons. O sucesso, a glória... Todo mundo devia ser presidente da República por um tempo, é melhor do que análise, do que qualquer terapia.

A colheita fiscal da crise - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 29\10


A crise da indústria chegou aos cofres federais, derrubando a receita de impostos e contribuições e dificultando o cumprimento da meta fiscal estabelecida pelo governo. A arrecadação de setembro, de R$ 78,2 bilhões, foi 1,1% menor que a de um ano antes, descontada a inflação. Foi a quarta queda mensal consecutiva, nesse tipo de comparação. O crescimento real acumulado no ano ficou em 1,9%. Pela projeção anterior da Secretaria do Tesouro, o governo poderia recolher neste ano até 2% mais que em 2011, em termos reais. Diante de números bem piores que os previstos, a estimativa foi revista. A expectativa, agora, é de um aumento mais próximo de 1,5%, segundo o coordenador de previsão e análise da Receita Federal, Raimundo Elói de Carvalho. Apesar do cenário econômico adverso, o resultado de setembro foi frustrante, segundo ele. Mesmo assim, o secretário da Receita, Alberto Barreto, procurou exibir algum otimismo. Há sinais de reativação, segundo ele, e a arrecadação deverá evoluir em ritmo mais satisfatório em 2013. Pode ser, mas isso dependerá de uma recuperação substancial da atividade produtiva, principalmente da indústria de transformação. Até agora, os sinais positivos são muito moderados, apesar do crédito farto e dos incentivos fiscais concedidos pela Fazenda.

Esses incentivos custaram ao Tesouro R$ 2,2 bilhões em setembro, segundo tabela apresentada pelo secretário. Com o parcelamento de impostos atrasados, benefício vinculado ao programa Refis, a renúncia chegou a R$ 3,1 bilhões. Essas concessões serão compensadoras, em tese, se contribuírem para a reanimação dos negócios e para o recolhimento de tributos em atraso.

Os efeitos do Refis têm sido até agora muito limitados, como confirmam os balanços divulgados de tempos em tempos pelas autoridades. Grande parte das empresas inscritas continua sem pagar e apenas se beneficia de uma trégua temporária nas relações com o Fisco. Quanto aos estímulos anticrise, favorecem alguns segmentos da indústria, como o automobilístico, mas pouco têm ajudado os demais.

Em julho, como lembrou o secretário da Receita, a produção industrial foi 5,5% menor que a de um ano antes. Em setembro, a diferença havia recuado para 1,9%. Houve melhora, sem dúvida, mas o número continuou negativo, com a maior parte das atividades ainda estagnada.

O impacto fiscal da crise é muito claro, quando se examinam os números acumulados de janeiro a setembro. Descontada a inflação, os tributos arrecadados sobre extração de minerais metálicos, combustíveis, instituições financeiras, fabricação de veículos, metalurgia, telecomunicações, transporte aéreo, produção têxtil e fabricação de alimentos e de produtos metálicos, exceto máquinas e equipamentos, foram todos menores que os do ano passado.

No entanto, o consumo cresceu vigorosamente. Indicadores oficiais e privados confirmaram essa tendência ao longo do ano e o contraste entre consumo e produção industrial aparece também na análise divulgada pela Receita. Em julho, de acordo com uma das tabelas, as vendas de bens e serviços foram 12,3% maiores que as do ano anterior. Em setembro, a diferença aumentou para 15,7%. Nesse mês, a massa de salários foi 13,7% maior que a de setembro de 2011.

As tabelas mostram também para onde foi a diferença entre o consumo e a oferta interna. Entre janeiro e setembro, o valor das importações foi 0,8% maior que em igual período de 2011. As compras externas perderam ímpeto nos últimos meses, mas continuaram, apesar disso, absorvendo uma parcela importante da demanda.

Isso se refletiu também na arrecadação. Até setembro, a tributação das importações rendeu R$ 35,2 bilhões, 14,8% mais que no ano anterior, em termos reais, enquanto os impostos sobre a produção diminuíram.

Os números da Receita Federal confirmam, portanto, algo há muito tempo evidente para quem observa os fatos com alguma atenção: o governo concedeu estímulos generosos ao consumo, sem, no entanto, oferecer ao setor produtivo melhores condições para acompanhar a demanda. Os poucos estímulos foram localizados e de alcance restrito. O resultado é inequívoco.

Após as eleições - AÉCIO NEVES

FOLHA DE SP - 29\10


Acabado o segundo turno das eleições, é hora de os partidos e seus líderes se esforçarem para dar significado político ao resultado das urnas.

Teima-se em usar a lógica das eleições locais, ignorando suas circunstâncias próprias, como viés determinante para projetar o futuro. Assim, busca-se ajustar os resultados às conveniências do momento, daqueles que venceram ou sucumbiram ao voto popular.

A contabilidade mais importante, a que interessa, porém, é outra. Passadas a euforia e as comemorações, os novos prefeitos vão ter que se haver com uma dura realidade: o enfraquecimento continuado das nossas cidades -cada vez mais pobres em capacidade financeira e, por consequência, sem autonomia política.

Os novos administradores terão que governar com arrecadações e transferências de recursos em queda e responsabilidade administrativa cada vez maior, sem a necessária contrapartida financeira. Obrigatoriamente, serão instados pela realidade a esquecerem a briga política e os palanques para buscar parcerias e fazer funcionar uma inventividade gerencial, a fim de cumprirem os compromissos assumidos com os eleitores.

Lembro que a Constituição de 1988 tratou da distribuição de recursos entre os diferentes entes federados de acordo com suas obrigações e deveres com a população. Movia os constituintes a lúcida percepção de que não pode existir país forte com Estados e municípios fracos e dependentes, de pires na mão. Um crônico centralismo redivivo aos poucos permeou governos de diferentes matizes e se exacerbou agora, incumbindo-se de desconstruir a obra federativa criada naquele momento histórico, de revisão constitucional.

Fato é que, hoje, do total arrecadado no país, mais da metade fica nos cofres federais. Os Estados e os mais de 5.000 municípios brasileiros têm que sobreviver com percentuais muito inferiores, incluídas as transferências obrigatórias. Cada vez menos a União participa com recursos e responsabilidades das principais políticas públicas nacionais. Basta fazer as contas: nas principais áreas, a presença federal é minoritária, quando não decrescente.

A consequência, óbvia, consta de recente estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro: 83% dos municípios brasileiros simplesmente não conseguem se sustentar.

Impassível diante dessa realidade, o governo central ignora Estados e municípios como parceiros e poderosas alavancas para a produção de um crescimento diferenciado, descentralizado, mais inclusivo e também mais democrático, fundamental neste momento de crise, em que as fórmulas tradicionais estão esgotadas e fechamos o ano na lanterna dos países emergentes.

Primeiros passos - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 29\10


Fernando Haddad encomendou a assessores que devem atuar na transição diagnóstico técnico, jurídico e orçamentário para dar a largada a medidas emblemáticas de seu programa de governo já nos primeiros cem dias de mandato. A ideia do petista é delinear a ruptura de um ciclo, sinalizando ao eleitor providências imediatas quanto ao fim da taxa da inspeção veicular, a implantação dos 31 centros de saúde da Rede Hora Certa e a adoção do Bilhete Único Mensal.

Maioria Disposto a cooperar politicamente com Haddad, Gilberto Kassab contabiliza, em relatos a aliados, que o futuro prefeito deverá contar com o apoio de 28 a 30 dos 55 vereadores. A matemática inclui o bloco liderado pelo atual prefeito, formado por PSD, PSB, PV e PP.

Lá... Ocupando a vaga de Marta Suplicy, Antonio Carlos Rodrigues (PR) diz a interlocutores que quer permanecer no Senado, desencorajando tratativas para a presidência da Câmara paulistana.

... e cá A volta de Rodrigues a São Paulo levaria ao Senado o petista Paulo Frateschi. Se ficar em Brasília, sua cadeira de vereador será herdada pelo ex-comandante da PM Álvaro Camilo (PSD).

Terapia... Aliados de José Serra lamentavam ontem, no QG tucano, o tempo gasto na mobilização de evangélicos contra o kit anti-homofobia do MEC na gestão Haddad e o adiamento da divulgação do programa de governo.

... de grupo Lembravam que os dois temas mais relevantes da reta final -parcerias na saúde e a ampliação do Bilhete Único- só surgiram após tardio cotejo dos planos de Serra e Haddad.

Alta ansiedade Roberto Cláudio (PSB), eleito em Fortaleza após disputa acirrada, disse ter engordado na campanha. Ouviu de um aliado que o pior está por vir: a transição nada amistosa com a prefeita Luizianne Lins (PT).

Day after Guido Mantega convocou os governadores para uma reunião na quinta-feira, em Brasília. Na pauta, temas polêmicos de interesse dos Estados, como a divisão de royalties do pré-sal e a nova regulamentação do Fundo de Participação dos Estados.

Tudo dominado O diagnóstico feito por Lula e Dilma ontem, em conversa após a vitória de Haddad, é que o PSDB foi dizimado no Sul e no Sudeste. Citaram, além de São Paulo, Vitória como uma das principais derrotas dos tucanos. Avaliaram que o PSB de Eduardo Campos conquistou terreno da oposição.

Nem tudo Já Aécio Neves lista as vitórias de Arthur Virgílio (PSDB) em Manaus e de ACM Neto (DEM) em Salvador para relativizar o triunfo de Lula e Dilma. "Não há esse messianismo. Onde foram mais agressivos, perderam."

Aceno Aécio afirma que Serra terá peso na definição dos rumos dos tucanos. "Ele foi candidato porque o partido insistiu muito, contra sua vontade. Fez um sacrifício pessoal e sempre será ouvido e reconhecido no PSDB."

Vitrine Eduardo Campos, por sua vez, destaca a vitória do PSB em Campinas. "Abre a perspectiva de crescimento em São Paulo, vital para qualquer partido com aspiração nacional."

Parabéns O governador de Pernambuco telefonou para Lula no sábado para cumprimentá-lo pelo aniversário. Numa conversa rápida, ficaram de se encontrar para falar sobre política.

Petit comité Apesar de ter ficado fora da foto oficial, o ex-ministro Antonio Palocci estava entre os poucos convidados (entre eles Dilma) da festa de aniversário de Lula na sexta, em São Bernardo.

com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI

tiroteio

"O PT acha que manda nas camadas mais humildes. Mas a vitória de ACM Neto em Salvador mostrou que a pobreza sabe pensar."

DO PRESIDENTE NACIONAL DO DEM, JOSÉ AGRIPINO (RN), sobre a derrota de Nelson Pelegrino (PT), apoiado por Lula e Jaques Wagner, na capital baiana.

contraponto

Ouvido atento

Depois de votar, ontem, José Serra saía do colégio Santa Cruz com os netos Antonio, 9 anos, e Gabriela, 5 anos. A menina, ao avistar Gilberto Kassab, perguntou:

-O Kassab vai ser prefeito?

Seu irmão foi rápido na intervenção:

-Não, ele já é prefeito. Agora vai ser governador...

Antes que Geraldo Alckmin, também presente, se constrangesse, o neto de Serra emendou:

-É que o Alckmin vai ser presidente.

O vereador Floriano Pesaro brincou:

-Criança é assim: ouve os adultos e fala a verdade.

Solidão virtuosa - MARCELO DE PAIVA ABREU


O Estado de S.Paulo - 29\10


Difícil encontrar alguém que não tenha sido surpreendido pelas recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). Surpresa para os que estavam seguros de sua impunidade ou da impunidade de seus amigos. E, de outro lado, para os saudosos do STF da Terceira República, que terão tido orgulho do desempenho recente da Suprema Corte. Especialmente tendo em conta que as decisões alcançadas desmentiram a ideia de que ministros indicados por governos petistas tenderiam a demonstrar leniência com os réus envolvidos no "mensalão".

Houve fenômeno simétrico do que se registra nos EUA. Lá, indicações de juízes conservadores para a Corte Suprema por presidentes republicanos têm sido marcadas, em diversos casos, pelo abrandamento das posturas conservadoras dos indicados. Aqui, o que se viu é que diversos ministros indicados pelos presidentes Lula e Dilma demonstraram notável independência quando se tratou de julgar políticos do PT. Nunca a inamovibilidade dos magistrados pareceu tão essencial à defesa da democracia.

A pergunta que se coloca é se poderíamos esperar surpresa similar da parte dos demais Poderes da República. Por mais que se deseje que a postura de independência do STF influencie diretamente o Legislativo e o Executivo e, ao tornar mais arriscado o desafio às leis, dissuada práticas corruptas, são em princípio modestas as esperanças de que o salto qualitativo do STF seja imitado. Entretanto, o julgamento poderá afetar a coesão dos atuais partidos.

Tomando como marco de referência as experiências internacionais, em particular a britânica, fica claro que o começo do fim da corrupção sistemática - quando "a política corrompia a economia" pela via parlamentar - tem que ver com desenvolvimentos políticos que resultaram em ampliação de colégios eleitorais. A partir da década de 1830, o progressivo avanço das organizações sindicais e de partidos políticos que representavam os trabalhadores resultou em pressões que redundaram na neutralização da corrupção no âmago do sistema político, no quadro de um processo de amplas reformas com grande repercussão econômica.

A tragédia do PT, e em alguma medida do Brasil, é que exatamente as forças políticas que poderiam exercer papel preponderante para debelar a corrupção sistemática se envolveram em práticas corruptas que faziam parte da tradição brasileira.

Que impacto permanente terão as condenações da Ação Penal 470 sobre os partidos políticos? Constatado o "mensalão" em 2005, ao PT colocava-se clara opção. De um lado, autocrítica, expurgo dos corruptos e proposta de regeneração, em linha com a compungida reação inicial de Lula. De outro, a escolha que infelizmente prosperou: defesa intransigente das irregularidades detectadas, agasalhando-as com pretenso manto de legitimação partidária, na crença provável de que um STF com juízes majoritariamente indicados por governos petistas permitiria que tais crimes escapassem à justiça. Opção que agora se revela desastrada do ponto de vista estratégico e alimenta posições antidemocráticas de questionamento de decisões do STF.

É em parte melancólico, em parte revoltante, que esteja agora sendo esboçada a defesa de réus condenados pelo STF caracterizando-os como eventuais presos políticos. O ex-presidente Lula, em meio ao engajamento nas campanhas municipais, embora ainda não tenha endossado a tentativa de resgate de José Dirceu da condição de preso comum, tem demonstrado muita relutância em tomar distância em relação ao "mar de lama" partidário.

Será que uma vitória petista nas eleições municipais paulistanas poderá suprir argamassa suficiente para remendar a integridade partidária comprometida pelo "mensalão" condenado? Seria requerida de setores "autênticos" monumental capitulação à Realpolitik ancorada no mais rasteiro fisiologismo: "Afinal, é assim que se faz política no Brasil". E, para piorar as coisas, os "autênticos" têm ideias sobre a economia ainda mais arrevesadas do que os cultores do realismo fisiológico. A manutenção da unidade partidária do PT a qualquer custo poderá gerar uma aglomeração partidária semelhante ao PMDB, apenas com traços sindicalistas.

A menos de dois anos das próximas eleições presidenciais, não são animadores os prognósticos quanto à eleição de presidente que tenha compromisso com o controle da corrupção sistemática, idealmente como parte de estratégia que faça sentido do ponto de vista político e econômico.

O PT, ou suas facções organizadas em partido ou não, estará imerso nas dificuldades de enfrentar as tensões associadas à necessária autocrítica e combinar posições razoáveis quanto à corrupção e a um projeto estratégico que faça sentido. Com base na história recente, não há indícios de que o PSB, nova força política a ser levada em conta, tenha particular repugnância a arranjos fisiológicos, embora, em meio a um deserto de ideias, possa até ser capaz de formular projeto estratégico coerente. O PSDB, mirrado e inapetente, parece ainda dividido sobre o que de fato pretende.

Vamos ter de esperar mais tempo para comemorar que o Executivo ou o Legislativo seguiram o bom exemplo do Supremo.

Caminhos diversos - PAULO GUEDES

O GLOBO - 29\10


Na longa estrada de melhoria institucional que conduz à Grande Sociedade Aberta, o Brasil segue devagar na direção certa



A grande crise contemporânea se abate sobre os países da América Latina de forma assimétrica. De um lado, no cinturão do Pacífico, estão Chile, Peru, Colômbia e México. Transformando a crise em oportunidade, aprofundam reformas de modernização e mergulham suas economias nos mercados globais, em busca de uma integração competitiva à nova ordem mundial. De outro lado estão Cuba, Venezuela, Bolívia, Equador e Argentina, na rota equivocada das pequenas sociedades política e economicamente fechadas. Do trágico peronismo do século XX ao socialismo bolivariano do século XXI, acumulase a evidência empírica de um grande desastre causado por ideologias obsoletas.

Os países colhem prosperidade ou pobreza de acordo com as instituições que plantam. O Brasil tem rumo certo. O caminho brasileiro é o de uma Grande Sociedade Aberta. Democracia, ainda que emergente. Mercados, ainda que imperfeitos. Estado de direito, embora cego muitas vezes. Redes de solidariedade social, ainda que precárias. Imprensa livre, mesmo entre a cenoura e o chicote dos poderes políticos e econômicos. Moeda decente, apesar das indefinições nos regimes monetário e fiscal. Marcos regulatórios em construção, embora ainda instáveis. A estrada é longa. O histórico julgamento do mensalão, demarcando a independência do Poder Judiciário, é uma etapa fundamental nessa jornada.

Enquanto retrocedem institucionalmente os peronistas e os bolivarianos, capturados por uma inadequada visão de mundo, avançam celeremente os países da Aliança do Pacífico. O Chile, a exemplo do que acontece hoje na China e ao contrário do que ocorreu no Brasil e na Rússia, executou sua abertura econômica antes da abertura política. Seu extraordinário sucesso econômico inspirou históricos rivais, os peruanos, a aprofundarem suas reformas de modernização. E a Colômbia, notável por seu histórico democrático na região, mergulha também na Aliança do Pacífico em busca da prosperidade. O México, que já participa do Nafta, a zona de livre comércio com os Estados Unidos e o Canadá, amplia seus acordos comerciais com as economias mais dinâmicas da América do Sul. Tudo isso no vácuo de uma liderança geopolítica não exercida pelo Brasil. Somos agora os retardatários.

De trunfos e triunfos - DORA KRAMER


O Estado de S.Paulo - 29\10


O resultado de São Paulo foi uma derrota vergonhosa do PSDB e, para o PT, mais que uma vitória: um triunfo mais que suficiente para o partido sair desta eleição com dois trunfos.

A imposição de uma derrota ao PSDB dentro "de casa" e, além de tudo, disputando com um candidato tido inicialmente como imbatível é um deles. O mais substancioso.

O outro trunfo, a conquista de um estandarte para servir de contrapeso às condenações no Supremo Tribunal Federal, não tem validade prática. É meramente simbólico, mas pode funcionar para aplacar os brios feridos do partido.

Pelo menos durante esta semana as comemorações farão com que o STF passe alguns dias sem ser acusado disso ou daquilo. Ou não, porque sempre haverá quem alegue que o eleitor paulistano deu uma "resposta" ao Supremo elegendo Fernando Haddad prefeito.

Delírios à parte, fato é que na política o PT saiu desse 2.º turno como o grande vitorioso. Elegeu São Paulo como sua principal arena e nela venceu. Só que o conjunto não é feito só de vitórias. Houve derrotas importantes que não permitem ao PT conduzir-se como absoluto.

Se de um lado o ex-presidente Lula cumpriu com alto êxito seu objetivo na cidadela tucana, de outro viu emergir desta eleição uma inquietação no campo governista que terá trabalho para neutralizar.

Levado pelo sucesso em Recife em embate direto com o PT, o governador Eduardo Campos entrou na cena antes do esperado. Começa a trilhar caminho próprio, acumulando forças e agregando aliados para enfrentar a contraofensiva que vem logo adiante.

No campo oposicionista propriamente dito, não obstante ganhos significativos - Manaus e Salvador - em termos nacionais, o balanço é de acentuada perda pela exposição dos frangalhos do PSDB em São Paulo.

Pente Fino - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 29\10


Além de recorrerem a organismos internacionais, réus do mensalão estudam patrocinar o "julgamento do julgamento": juristas renomados analisariam os votos dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e a eventual fragilidade de algumas das decisões tomadas.

CONFLITO
Um dos problemas de colocar a ideia em pé é encontrar profissionais dispostos a questionar, publicamente, ministros do STF. A maioria de juristas e advogados tem causas no tribunal.

MUITO AMOR EM SP
Organizadores do festival Existe Amor em SP, realizado na semana passada com Criolo e Gaby Amarantos, comemoraram a única ocorrência policial registrada no dia: cinco pessoas ficaram peladas na praça Roosevelt. Já o Facebook bloqueou internautas que postaram a foto da cena em seu perfil.

STEVIE CHAMA
Stevie Wonder mandou uma canção para que o brasileiro Gilberto Gil coloque letra. Os dois vão se apresentar juntos num show de Natal, em Copacabana, no Rio. E já preparam o espetáculo. Gil já fez uma versão de "I Just Called to Say I Love You" (só chamei porque te amo), sucesso na voz de ambos.

BOM DIA
Andy Summers, ex-guitarrista da banda inglesa The Police, visitará as crianças da pediatria do Inca (Instituto Nacional do Câncer) hoje. Levará a cantora Fernanda Takai, do Pato Fu, que está com ele em turnê.

PÉS DESCALÇOS
A inglesa Joss Stone, que se apresenta descalça no palco, pediu bacia de água quente, pedra-pomes e gel para banho em seu camarim durante turnê no Brasil. Em São Paulo, seu show será em 11 de novembro, no Credicard Hall.

PRATO CHEIO
Bia Antony, mulher de Ronaldo, decidiu abrir a casa deles, no Jardim Europa, em São Paulo, para festão de aniversário no sábado.

POUPE-ME, BRASIL
"Olha, amor, caída não vou ficar nunca, nem com 90 anos", diz Luana Piovani, 36, mãe de Dom, nascido em março, e ansiosa por "mais três filhos". A atriz ainda não pensa em posar totalmente nua. "Se tivessem começado a fazer uma poupança quando me chamaram pela primeira vez, aos 18, já teriam conseguido me convencer."

Capa da "GQ Brasil" de novembro, ela fala sobre suas polêmicas no Twitter. "A pessoa me escreve dizendo: 'Como você está gorda!' Digo: 'Gorda, mas o seu namorado deve estar no banheiro com minha revista na mão'."

ESTAMPA POR MENOS
André Lima criou uma coleção para uma rede popular de lojas. O empresário Flavio Rocha, da Riachuelo, com a mulher, Anna Claudia, a apresentadora Mariana Weickert e a produtora Violeta Metsavaht compareceram ao lançamento, no shopping Vila Olímpia.

SAÍDA À FRANCESA
O estilista brasileiro Carlos Miele fechou sua loja em Paris há 15 dias.

A marca diz que o imóvel, na rua Saint-Honoré, está sendo reformado e que não há prazo estipulado para a reabertura.

CPF NA NOTA
A loja Alexandre Herchcovitch da rua Melo Alves, nos Jardins, exige que os consumidores façam um cadastro para emitir a nota fiscal paulista com seus CPFs. A prática, segundo o Procon, é ilegal, já que nenhum estabelecimento pode obrigar uma pessoa a preencher ficha. A marca Herchcovitch, por meio de assessoria, diz que não quer se pronunciar.

CADÊ O QUE EU PAGUEI?
E consumidores cadastrados no programa nota fiscal paulista têm descoberto no extrato que muitos lugares, principalmente restaurantes, prometem lançar os valores consumidos no número de seu CPF e não o fazem. A Secretaria da Fazenda de SP avisa que as pessoas lesadas podem denunciar os locais no site da NFP (Nota Fiscal Paulista).

MAMÃE, CHEGUEI
O Museu do Futebol vai abrir no próximo dia 6 uma exposição sobre árbitros.

Para mostrar como o trabalho deles é difícil, haverá no local aparelhos com as ilusões de ótica que um juiz pode ter dentro do campo e um videogame usado pela Fifa no treinamento de seus profissionais.

FECHADO PRA REFORMA
O Centro Cultural Banco do Brasil de SP inicia uma série de reformas no mês que vem -mas continuará funcionando normalmente. A repaginada vai começar pelo café e pelas áreas de convivência. Em janeiro será a vez das salas de exposição, que devem ficar prontas para o aniversário de 12 anos do local, em abril. A fachada, o cinema e o teatro serão reformados ao longo de 2013.

TETO DE VIDRO
A partir de 7 de novembro, uma caixa de vidro do tamanho de uma casa será montada na marquise do MuBE.

Dentro dela, haverá performances de duas horas da companhia J.Gar.Cia.

CURTO-CIRCUITO
O documentário "Helio Oiticica", de Cesar Oiticica Filho, será exibido na Mostra. Hoje, às 13h, no Espaço Itaú de Cinema. 18 anos.

Fernando Torquatto apresenta a nova coleção Make B. Miami Sunset, para a Boticário. Na SPFW.

O Design Trends Day acontece hoje, às 17h, na Casa Electrolux.

O Centro Universitário Belas Artes realiza de hoje a quarta a Coleção de Palavras de Moda.

O designer francês Joseph Altuzarra e Gordon Espinet, vice-presidente da M.A.C., fazem palestra na Faap amanhã, às 10h30.

Victor Hugo lança coleção inverno 2013 amanhã.