sexta-feira, outubro 28, 2011

REGINA ALVAREZ - Sinais mais claros



Sinais mais claros
REGINA ALVAREZ 
O GLOBO - 28/10/11


Nos últimos meses, os analistas do mercado elevaram o tom das críticas contra o Banco Central, e uma das queixas é a falta de norte para alinhar as expectativas em relação aos juros futuros e à inflação.

Depois que o BC decidiu baixar os juros quando a curva da inflação apontava para cima, azedou a relação do mercado com a autoridade monetária. Na ata da última reunião do Copom, pelo menos o problema de comunicação foi resolvido.

O mercado pode até não concordar com a estratégia do Banco Central para enfrentar o dragão, mas ficou bem claro para os analistas que o modelo chamado de alternativo para levar a inflação ao centro da meta é o escolhido. E a receita tradicional está descartada.

O economista Luiz Otávio Leal, do banco ABC Brasil, observa que a base da argumentação do BC para baixar os juros está na deterioração do cenário internacional, e o modelo tradicional só captaria isso lá na frente. O mercado considera uma aposta muito grande antecipar um movimento como esse.

Só lá na frente o BC poderá encerrar essa queda de braço com o mercado, ganhando ou perdendo, quando ficar comprovado qual modelo estava certo. Mas o economista considera os sinais da ata positivos: - Deixar explícito que esse modelo é o básico é mais coerente. É difícil medir o grau de aposta, porque o BC tem muito mais informações que o mercado.

Na visão de Leal, a ata também deixou mais claro que os cortes na taxa básica continuarão de 0,50 ponto e o limite para a queda é moderado, portanto de 10% e não de 9%, como previa antes de ler o documento. Ao limitar o tamanho do corte, o BC reduz o espaço para especulações e torna a trajetória da taxa de juros mais previsível. É esta a lógica do mercado. Quando não se sabe qual a taxa no futuro, o prêmio de risco embutido nos spreads aumenta e os juros futuros sobem. Já com maior previsibilidade as taxas de risco diminuem.

- Um BC previsível é bom não apenas para o mercado, mas principalmente para o consumidor final. A ata foi importante nesse sentido - destaca Leal.

Uma outra informação da ata que merece registro é relativa à política fiscal. O documento repete o cenário já apresentado anteriormente de política fiscal restritiva em 2012 e 2013, com superávits acima dos três pontos percentuais do PIB. Ou seja, sem desconto das despesas do PAC com investimentos.

Mas como o governo fará isso ainda não se sabe.

Tem um detalhe que intrigou o economista José Francisco Gonçalves, do Banco Fator. Trata-se de um parágrafo que não estava na ata anterior e tem relação com a pressão do reajuste do salário mínimo em janeiro sobre a economia e os preços.

A política fiscal está bem equacionada em 2011, avalia Gonçalves, mas ainda é um grande ponto de interrogação em 2012, por conta de vários fatores. O aumento das despesas obrigatórias com salários é um deles. As pressões no Congresso sobre o Orçamento, outro.

- Este ano, o governo deu demonstrações de que tem interesse em entregar o desempenho fiscal prometido. No ano que vem isso não está claro - afirma.

Carga pesada I

O termômetro criado pelo economista José Roberto Afonso para medir a carga tributária alcançou em setembro 30,7% do PIB, recorde histórico e 1,5 ponto percentual acima da carga medida há um ano. A expansão, segundo o economista, está sendo puxada basicamente pelos impostos federais. E está concentrada em dez setores, incluindo o financeiro, o extrativo mineral e o comércio atacadista. O ICMS dos estados, mais sensível à atividade econômica, está estagnado.

Carga pesada II

Mantida essa tendência, mesmo com hipótese de desaceleração no último trimestre, a carga tributária deve fechar o ano em 36,5% do PIB, confirmando o recorde histórico no ano, cerca de um ponto acima da carga de 2008, o recorde anterior. Tudo isso sem a CPMF, que o governo até hoje lamenta ter perdido.

Emprego desigual

A taxa de desemprego ficou estável em 6% em setembro, quando a economia dá sinais de desaceleração. Mas as desigualdades no mercado de trabalho continuam preocupantes e até se acentuaram em alguns segmentos. Os dados do IBGE mostram que a desocupação entre a população preta ou parda subiu de 7,1% para 7,3%. A desocupação entre as mulheres caiu um pouquinho em setembro, mas continua acima da média geral. Depois de três meses em 7,6%, passou para 7,5%, enquanto entre os homens é em 4,7%.

Renda desigual

A diferença entre os rendimentos dos trabalhadores tem caído nos últimos anos em ritmo muito lento. As mulheres ganham 72,1% do que recebem os homens; há oito anos ganhavam 70,2%. O rendimento da população preta ou parda equivale a 54,9% da renda dos brancos. Era 49,3% há oito anos.

- São mudanças pequenas, que ocorrem muito lentamente. Ainda existem mazelas no mercado de trabalho que não se desfizeram - afirma Cimar Azeredo, gerente da Pesquisa Mensal do Emprego (PME) do IBGE.

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