Problemas do transatlântico da economia do Brasil se multiplicam, mas não há firmeza no comandante
Nessa hora, de especial gravidade, não dá para separar política de economia. Do jeito como aconteceram na sexta-feira as demissões do então ministro Sérgio Moro e do diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, abrem enorme espectro de incertezas na área política que acabarão por ser descarregadas sobre a área econômica. O impacto sobre o câmbio e sobre o mercado de ações dá uma ideia disso.
A principal questão consiste em saber até que ponto o presidente Bolsonaro, que já vinha sofrendo sério desgaste político, conseguirá apoio mínimo para governar. Ele já se ressentia do isolamento a que vinha sendo submetido, a ponto de renegar a pretendida política nova, uma das principais bandeiras de campanha, para tentar se manter vivo. Depois de condenar o que chamou de métodos antigos, baseados em leilão de cargos, em toma lá dá cá e em arraigado patrimonialismo, que caracterizaram a chamada presidência de coalizão, Bolsonaro entendeu ser necessário atrair para sua órbita o chamado Centrão, constituído de políticos fisiológicos, muitos deles remanescentes do período do petrolão.
Esse ajuntamento apenas eventual de políticos é dotado de notável instinto de sobrevivência. Quase sempre é a primeira leva a pular de um barco que não lhes garante segurança. Foi assim no tempo do presidente Fernando Collor e foi assim, também, no segundo período da presidente Dilma Rousseff. Se as pernas da cadeira do presidente começarem a balançar, não continuarão gastando seu capital para fornecer o mesmo grude que os aglomera e estarão dispostos a mudar de lado.
A rede de apoio político do presidente não se limita às forças disponíveis no Congresso. Estende-se também para um grupo de governadores – cada vez mais diminuto – e para os oficiais militares que hoje circundam o presidente. Estende-se, também, para os segmentos da população que ajudaram a elegê-lo. Boa parte deles parece decepcionada pela atuação do presidente, especialmente depois que demitiu o ex-juiz que se notabilizou pelo mais extenso e mais profundo combate à corrupção do País.
A impressão que ficou da última semana de crise foi de que o presidente não concluiu sua operação de faxina no seu Ministério e de que agora parece determinado a dar um giro de 180 graus na sua administração.
Há outros ministros importantes em fase de fritura. O ministro da Economia, Paulo Guedes, por exemplo, foi surpreendido pela preparação de um Plano Marshall tupiniquim denominado Pró-Brasil, que prevê investimentos de R$ 250 bilhões com recursos privados e outros R$ 30 bilhões com recursos públicos. Trata-se de um pacote ainda em fase preliminar, preparado por assessores militares do Palácio do Planalto, que, no entanto, não passou pelo crivo da Economia.
A cabeça da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, também parece em processo de cozimento. Ela vem sendo obrigada a defender a China, o principal parceiro comercial do Brasil, dos ataques ideológicos desferidos pela trinca de filhos do presidente e pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub. Também vem sendo pressionada a optar entre a fidelidade a seu partido, o DEM, em conflito com o presidente, e seu cargo no governo.
No caso das escaramuças veladas a Guedes, o que pode ficar em questão é a linha de política econômica neoliberal adotada até aqui (pelo Posto Ipiranga), que poderia ser substituída por orientação de tipo populista ou intervencionista, mais parecida com a adotada na temporada do então ministro Guido Mantega, que deu errado e foi uma das causas do impeachment em 2016.
Independentemente dessas tensões, a ficha técnica da economia do Brasil já passa por enormes turbulências. A situação da contas públicas já era alarmante e ficou mais ainda depois do despejo de recursos e da provável expansão do endividamento, destinados ao apagamento do incêndio produzido pela crise do novo coronavírus.
O setor do petróleo, que até há dois meses era um dos pilares da economia, mostra rachaduras, em consequência da brutal quebra do consumo de derivados e do colapso dos preços. A indústria foi obrigada a paralisar suas máquinas, o comércio cerrou suas portas e o setor de serviços, com certas exceções, ficou estancado pelo confinamento da população. Mais que tudo, o consumidor perdeu emprego e renda e já não detém o mesmo poder de compra.
Ou seja, os problemas por que passam o transatlântico da economia se multiplicam e, no entanto, não se sente firmeza no comandante.
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