terça-feira, fevereiro 04, 2014

Duas biografias de brasileiros - CLÁUDIO SLAVIERO

GAZETA DO POVO - PR - 04/02

Há dois brasileiros cujas biografias certamente farão parte da história deste país. Antônio Ermírio de Moraes iniciou sua trajetória empresarial ainda jovem, estudando e formando-se em Engenharia Metalúrgica na Universidade do Colorado, nos EUA. A partir do Engenho Santo Antônio, iniciado por seus familiares e posteriormente junto com seus irmãos, construiu o que hoje é um dos maiores conglomerados industriais brasileiros, o Grupo Votorantim.

José Dirceu de Oliveira e Silva veio do interior de Minas Gerais, da cidade de Passa Quatro, filho do senhor Castorino e de Olga Guedes, mudou-se para São Paulo ainda jovem com o sonho de tornar-se presidente da República.

Enquanto Antônio Ermírio trabalhava na geração de novos negócios, investindo e recolhendo impostos, transformando o Grupo Votorantim em um dos 20 maiores grupos industriais brasileiros, com faturamento de R$ 40 bilhões e geração de 42 mil empregos, Zé Dirceu fazia parte da “turma dos canalhas” na PUC/SP. Pedro Caroço, como também era conhecido, não gostava de estudar, tornou-se líder estudantil ligado ao Partido Comunista Brasileiro e foi preso pela primeira vez por promover passeatas, quebra-quebras, greves e invasões na universidade paulista.

Trabalho e dedicação aos negócios sempre foram uma obsessão para Antônio Ermírio. Ele tornou-se um dos maiores líderes empresariais e sua voz era ouvida e seguida não apenas por empresários, mas também por governantes. Corajoso, dizia o que era preciso ser dito mesmo durante o regime militar. Estudioso, discorria sobre qualquer tema, de petróleo a energia atômica. Enveredou-se pela dramaturgia, escrevendo peças teatrais. Dedicou toda sua vida ao Hospital Beneficência Portuguesa, hoje referência em medicina. Arvorou-se pela política (nesta teve a maior decepção de sua vida), sendo candidato a governador de São Paulo com o intuito de dar sua contribuição ao estado que o acolheu.

Zé Dirceu, por sua vez, fugiu para Cuba. Integrante do III Exército Cubano, fez treinamentos de guerrilha, mas não resistiu. Levantaram-se suspeitas de ser amigo “muito íntimo” do comandante Alfredo Guevara, que lhe dava proteção em várias circunstâncias. Na ilha dos irmãos Castro, fez cirurgia plástica para não ser reconhecido pelas autoridades brasileiras. Era visto por alguns de seus companheiros como alcaguete de brasileiros aos cubanos. Seus antigos amigos do movimento revolucionário Molipo foram mortos e levantou-se a suspeita de que ele teria sido o delator do grupo. Trocava de nome e identidade como trocava de mulheres e sempre usou o dinheiro de suas companheiras para “crescer” na vida. Depois de sua queda no governo federal, no qual chegou a ser ministro, passou à profissão de lobista, na qual amealhou grande fortuna à custa de informações privilegiadas.

Zé Dirceu, ou Comandante Daniel, ou o argentino Hoffman, ou Carlos Henrique, ou Pedro Caroço, saíra de Passa Quatro na infância sonhando em mudar o mundo. Liderou um movimento de estudantes que pretendia enfrentar o regime militar, mas foi preso. Tentou voltar ao Brasil como líder de uma organização guerrilheira que derrubaria o governo pelas armas, mas acabou tendo de voltar à clandestinidade, com seu grupo dizimado. Ajudou a construir um partido dito de trabalhadores, que chegaria ao poder, porém, longe de cumprir as promessas de mudar as práticas políticas vigentes no país. Sonhara em ser presidente da República, seu sonho acabaria enterrado pelo mensalão, episódio pelo qual foi condenado. Ele, que já passara um ano na prisão, seis anos no exílio, quatro na clandestinidade e oito anos sem os direitos políticos, agora septuagenário foi condenado a mais dois anos de prisão em regime semiaberto. É um homem que jamais chegou a lugar nenhum.

Dois homens com lições de vida distintas. Qual delas você escolheria para seguir?

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