terça-feira, fevereiro 18, 2014

A vaquinha questionada - EDITORIAL ZERO HORA

ZERO HORA - 18/02

Gilmar Mendes expressa o desconforto de outros integrantes da Suprema Corte por ver a condenação dos mensaleiros ser tratada como perseguição política.


Ao questionar a origem dos recursos doados aos petistas condenados no mensalão, o ministro Gilmar Mendes acabou provocando uma reação forte da direção do Partido dos Trabalhadores, que o está interpelando judicialmente para que esclareça suas manifestações. Na troca de correspondência com o senador Eduardo Suplicy, Mendes alega que a campanha de doações sabota e ridiculariza o cumprimento da pena, que a Constituição considera pessoal e intransferível. O ministro também levanta suspeitas sobre a legitimidade do dinheiro, argumentando que falta clareza ao sistema de arrecadação porque alguns sites utilizados para esta finalidade são hospedados no Exterior, o que dificulta a fiscalização.
Não parece adequado que um ministro do Supremo trave debate público com políticos, especialmente sobre uma causa que ainda está sendo apreciada pela sua corte. Mas não há dúvida de que Gilmar Mendes cumpre o papel de expressar o desconforto de outros integrantes da Suprema Corte por ver a condenação dos chamados mensaleiros ser tratada como perseguição política por lideranças do partido que ocupa o poder.
Descontada a inconveniência, porém, não há como ignorar a procedência da suspeita. Causa perplexidade geral a facilidade e a rapidez com que os simpatizantes dos condenados levantam quantias elevadas, como se tivessem uma máquina de fabricar dinheiro. O mínimo que se espera, diante de tal fenômeno, é que as doações sejam registradas adequadamente, para não se transformarem nos tais “recursos não contabilizados” que acabaram dando origem ao processo do mensalão.
Também se espera que o constrangedor debate entre o magistrado e políticos petistas resulte numa investigação responsável por parte dos órgãos fiscalizadores, para que não reste dúvida sobre a legalidade e a legitimidade das doações. Tudo o que se deseja, no caso, é transparência e legalidade, para que a Justiça não seja desmoralizada depois de ter recebido o reconhecimento majoritário da população por ter condenado à prisão réus poderosos envolvidos com a corrupção.
A resposta epidérmica da direção do PT ao ministro também causa desconforto no governo, principalmente por manter nas manchetes o processo petista exatamente no momento em que o mensalão tucano começa a ser julgado. Socializar a multa dos condenados entre filiados e militantes já não está parecendo uma ideia tão boa assim, especialmente para os candidatos que querem passar ao largo desse debate e ficar bem com a opinião pública.

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