O Estado de S.Paulo - 05/06
Pressionados pela concorrência e perdendo espaço até na América do Sul e no protegido mercado nacional, industriais brasileiros passaram a cobrar do governo mais acordos de comércio para evitar um isolamento cada vez maior e mais danoso. A decisão dos empresários de mudar o jogo e os números da balança comercial de janeiro a maio, os piores da série histórica, foram divulgados pelo Estado na edição de ontem. No mesmo dia a Confederação Nacional da Indústria (CNI) reforçou a campanha, divulgando nota a favor da negociação de novas e mais ambiciosas parcerias. Segundo a nota, os empresários veem com preocupação os acordos postos à mesa, enquanto "o governo brasileiro assiste às discussões distanciado da realidade".
A acusação ao governo é bem fundada, mas parte da responsabilidade cabe aos industriais, com sua pouca disposição para se aventurar na troca de concessões dos acordos comerciais mais relevantes. Baixo poder de competição, horizontes comerciais limitados e perda de relevância nas transações externas caracterizam há algum tempo a indústria brasileira. O superávit comercial de US$ 760 milhões em maio foi 74,3% inferior ao de um ano antes.
O resultado teria sido bem pior, se só dependesse das vendas de manufaturados e semimanufaturados, 0,9% e 13,5% inferiores às de um ano antes. Só as exportações de produtos básicos superaram - pela margem de 1,7% - as de maio de 2012.
De janeiro a maio o País acumulou um déficit comercial de US$ 5,4 bilhões, com exportações de US$ 93,3 bilhões, 2,8% menores que as de igual período do ano passado, e importações 9,8% maiores. As vendas de manufaturados (US$ 36,2 bilhões) representaram apenas 36,9% do total embarcado. A receita dos básicos correspondeu a 47,6% do total e a dos semimanufaturados, a 31,2%. Em 2007, os manufaturados ainda proporcionaram 52,2% do valor vendido. A partir do ano seguinte, sua participação ficou sempre bem abaixo de 50%. O País acomodou-se na condição de exportador de commodities, beneficiado pela alta das cotações internacionais e, de modo especial, pela expansão chinesa.
A conversão do Brasil em fornecedor de insumos para a China e para o mundo desenvolvido resultou da combinação de vários erros de política. O primeiro foi o torpedeamento da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), por iniciativa dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner.
O terceiro-mundismo do governo petista deu prioridade às relações com países emergentes e até em estágios iniciais de desenvolvimento. A negociação de um acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia logo empacou, em boa parte por causa da resistência argentina a concessões comerciais. Assim, o Brasil fugiu de relações mais amplas com o mundo rico. A indústria pode ter achado confortável a opção, mas só até os estrangeiros começarem a tomar espaço até no mercado interno.
A maior parte dos erros é atribuível à política petista. O mercado interno cresceu com a transferência de renda e os aumentos reais do salário mínimo. Mas faltaram investimentos em infraestrutura, os tributos continuaram onerando a produção e a exportação, a política educacional negligenciou a formação básica e o governo esbanjou dinheiro e tolerou inflação alta. Os empresários deram sua contribuição, criticando principalmente o câmbio e os juros e dando menos atenção, durante anos, aos problemas estruturais de competitividade.
Como complemento do desastre, a Rodada Doha fracassou, outros países continuaram negociando acordos bilaterais, regionais e intrarregionais e o Brasil ficou cada vez mais isolado. Tem hoje 22 acordos de acesso preferencial, "a maioria pouco relevante", segundo a CNI. Enquanto isso, vizinhos já beneficiados por um número maior de acordos montam novas associações, como a Aliança do Pacífico, e os EUA acertam com potências grandes e médias uma Parceria Transatlântica e uma Transpacífica. Pelo menos a indústria acordou, mas com enorme atraso.
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