quinta-feira, maio 16, 2013

Teoria e prática - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 16/05
Aconteça o que acontecer com a Medida Provisória dos Portos, o que fica patente é que o governo não tem uma interlocução competente com sua base aliada. Com a adesão envergonhada do PSD, apesar da aceitação desavergonhada de um ministério, o governo tem, em tese, praticamente 80% do Congresso em suas mãos, seja de que maneira for: ou por meio da adesão ideológica ou do pragmatismo puro e simples.

Mas, na prática, a teoria é outra, e foi o PMDB, nada menos que o sustentáculo da coalizão governista, que demonstrou isso na votação da MP dos Portos. Deixar para a última hora a aprovação de matéria tão importante como maneira de pressionar os recalcitrantes não é a melhor maneira de vencer um embate como este. Corre-se o risco inútil de uma derrota.

Se o governo realmente considera que a MP dos Portos é fundamental para destravar a economia brasileira e dar a nossas exportações competitividade, por que não tratou o assunto com a prioridade que merecia, deixando que as negociações corressem soltas no Congresso como se a aprovação fosse automática?

Não é a intenção neste momento analisar os benefícios para a economia do país contidos na medida provisória, nem seus pontos negativos. O que é mais importante registrar nesta crise política é que o governo não tem uma linha lógica de atuação e, em consequência, não consegue guiar seus seguidores por um caminho que leve a bom porto, abrindo condições para disputas mais variadas de interesses contraditórios.

A falta de gosto pela negociação política, que já é uma marca da "presidenta", e a certeza de que essas questões se resolvem com a distribuição de benesses fizeram com que o Planalto se habituasse com a edição de medidas provisórias, acatadas submissamente por um Congresso subjugado. A coordenação política do governo e a própria presidente Dilma demonstraram não ter noção do ambiente no Congresso, ávido por se mostrar autônomo, especialmente diante da enxurrada de medidas provisórias que retira de seus membros a prerrogativa de legislar.

Exemplo disso é a exigência no Senado de duas sessões para a análise de medidas provisórias, rejeitando assim as decisões de afogadilho, que só fazem humilhar seus membros. Esse sentimento foi captado pelo líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha, que se aproveitou dele para defender interesses que estavam em jogo na disputa pelos portos, em direção oposta à visão do governo.

A derrota que, ao final, o Palácio do Planalto impôs a Cunha não compensa o desgaste a que o governo foi submetido nesse episódio, com as consequências eleitorais que deve provocar. A oposição se aproveitou da desorganização da base aliada para obstruir seguidas sessões, impondo uma derrota política tão importante quanto a importância que o governo dava à aprovação da MP dos Portos.

O desgaste sofrido pelo governo federal deixou evidente que seu prestígio junto à base aliada no Congresso está afetado seriamente, e mais ainda porque o próprio governo antecipou a disputa eleitoral, elevando o cacife de cada um dos partidos da base aliada, que venderão mais caro do que nunca os seus minutos de televisão.

Além de explicitar um esquema falho de relacionamento com o Congresso, a MP dos Portos evidencia também a incoerência do petismo no poder. Tratar a privatização dos portos como fundamental para o desenvolvimento do país, depois de passar tanto tempo criticando medidas nesse sentido tomadas pelos governos tucanos, é revelar que uma postura ideológica obsoleta fez o país perder um tempo inestimável em seu desenvolvimento.

Da mesma maneira que comemorar o sucesso do leilão de áreas de exploração de petróleo, utilizando o mesmo método de concessões do governo FH, processo que o próprio governo petista havia paralisado há cinco anos por questões ideológicas, é uma confissão de ineficiência na gestão pública que prejudica o país.

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