domingo, abril 21, 2013

Autonomia ao BC - agora vai? - SUELY CALDAS

O Estado de S.Paulo - 21/04

"No meu governo não tem ninguém autorizado a falar de inflação e juros sem ser o Banco Central. O ministro da Fazenda fala sobre dívida e superávit", respondeu a presidente Dilma Rousseff à pergunta de jornalistas sobre opiniões contraditórias de integrantes de sua equipe econômica. Ocorreu num café da manhã no Palácio do Planalto, em 28 de dezembro do ano passado, portanto, há apenas quatro meses. Pois se estrepou quem confiou na declaração da presidente.

Há 15 dias, em palestra a empresários, em São Paulo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, voltou a falar de juros e admitiu a possibilidade de elevar a Selic. E na terça-feira, véspera da reunião do Copom para decidir a taxa, a própria presidente Dilma tratou de antecipar a decisão e ainda deu a dica do porcentual de aumento: "Será possível fazer em patamar bem menor". No mercado, as apostas em aumento de 0,5% na taxa recuaram para 0,25%. E quem ainda tinha dúvida sobre se o governo interfere nas decisões do Copom passou a ter certeza.

Para cumprir com êxito a missão de "assegurar a estabilidade do poder de compra da moeda e um sistema financeiro sólido e eficiente", como está escrito em destaque em seu site, o Banco Central (BC) precisa trabalhar com autonomia, não sofrer influências políticas que o enfraquecem nos embates cotidianos com especuladores e dificultam o êxito de sua missão. Declarações inconvenientes contrariam objetivos do BC, do governo e da própria presidente. Quer ver um exemplo?

Durante a reunião dos Brics na África do Sul, no final de março, Dilma declarou discordar de políticas de combate à inflação que sacrifiquem o crescimento. Efeito imediato, a taxa de juros no mercado futuro despencou. Irritada, ela acusou agentes do mercado de manipularem suas palavras. Se tivesse ficado calada, nada disso teria acontecido, o mercado não teria motivo nem respaldo para criar volatilidade, instabilidade.

Nos países onde a autonomia ao BC é garantida em lei foi consolidado um entendimento geral - no governo, na sociedade, no mercado - de que decisões sobre juros e controle da inflação cabem exclusivamente ao BC. E ninguém questiona. Não se vê o presidente Barack Obama nem o primeiro-ministro inglês, David Cameron, darem palpite sobre juros, como fazem Dilma e seus ministros no Brasil. Aqui, vivemos um sistema híbrido em que a autonomia do BC foi respeitada por FHC e Lula, menos por Dilma, porém, por não estar regulamentada em lei, depende da vontade de quem ocupa o trono em Brasília.

Mas surgiu algo novo que pode mudar para melhor a estrutura do BC e o rumo dessa questão. Aparentemente sem o aval de Dilma, o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, senador Lindbergh Farias (PT-RJ), revelou à Agência Estado que vai discutir e colocar a autonomia em votação. O ponto de partida será um projeto do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), pelo qual o Conselho Monetário Nacional (CMN) define a meta de inflação e a diretoria do BC tem autonomia para decidir e executar políticas que garantam seu cumprimento. Para isso, os oito diretores terão mandato fixo de seis anos, durante os quais o presidente do País só poderá demiti-los por motivo grave definido na lei e com aprovação do Senado.

A proteção contra demissões injustificadas é o que garante independência, autonomia e liberdade para os diretores do BC tomarem decisões que contrariem a opinião ou o desejo do presidente, de ministros e da classe política, sem temer represálias. Por vezes, o combate à inflação exige decisões impopulares, de que os políticos não gostam, mas que são absolutamente necessárias.

A intenção de Dornelles é discutir e aprovar para a autonomia vigorar em 2015. O próximo presidente, portanto, poderá manter parcialmente ou mudar todos os atuais diretores. Mas, como o mandato é de seis anos, seu sucessor vai conviver por dois anos com toda a diretoria que encontrar. Não convém a coincidência do término de mandatos. Melhor alterná-los entre os oito diretores, como constava de projeto do BC no final da gestão de FHC.

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