O GLOBO - 18/04
É preciso colocar a economia em ordem, sem inflação, sem dívidas excessivas, abrir espaço para um futuro adequado
Tem jeito para tudo ou, vá lá, para quase tudo — é o que nos diz o FMI em seu último Panorama Econômico Mundial. Os alemães, por exemplo, dariam uma boa ajuda à Europa se gastassem mais, tanto as famílias quanto o governo. E deveriam gastar comprando coisas dos vizinhos em dificuldades, além de viajar para lá.
Já os franceses precisam trabalhar mais e economizar mais. Precisam também criar condições para isso, com uma boa reforma para aumentar a competitividade de seus produtos.
Italianos, portugueses e gregos não têm outro jeito senão prosseguir na austeridade para equilibrar dívidas públicas e privadas. Mas, cuidado. Excesso de austeridade pode matar.
Japoneses fizeram muito bem em iniciar políticas de estímulo ao consumo para sair da recessão. Uma "inflaçãozinha", uns 2% ao ano, seria boa ajuda para convencer as pessoas a gastar mais.
Mas o governo não pode se esquecer de que carrega uma dívida enorme que, em algum momento, terá de ser reduzida.
Isso também vale para os americanos. Tudo bem com a política de gastos agora, mas devem ao menos dizer quando voltam à austeridade para reequilibrar as finanças públicas.
Os emergentes fizeram um bom papel até aqui, mantendo um bom ritmo de crescimento, mas precisam voltar a cuidar dos fundamentos. Quais? Os clássicos: inflação baixa e estável, de menos de 3% ao ano, contas públicas equilibradas, dívida externa financiável.
E todos, literalmente, precisam fazer reformas estruturais. São de dois tipos. No primeiro grupo, estão as reformas destinadas a garantir financiamento de longo prazo para os gastos que mais pressionarão o bolso das famílias: aposentadorias e saúde. A causa é a mesma: com melhores condições, as pessoas estão vivendo mais.
Poderão dizer: mas isso é responsabilidade dos Estados. Tudo bem, mas continua saindo do bolso das famílias, que pagam os impostos direta ou indiretamente. Ou seja, a coisa é mais complicada: é preciso construir esquemas para financiar tanto gastos públicos quanto privados.
Isso exige a criação de estímulos e condições para que os jovens de hoje poupem para financiar seu futuro. Mas também exige que os, digamos, mais maduros, na ativa, trabalhem um pouco mais e contribuam um pouco mais.
Há aí uma clara dificuldade política e psicossocial: sacrifícios no presente para ganhos lá na frente e, em parte, ganhos da outra geração.
O segundo grupo de reformas tem como objetivo abrir caminhos para o desenvolvimento da educação, ciência, tecnologia e inovação. Considerem só um caso: comida.
A população mundial cresce mais no lado emergente, onde há também expansão econômica e, pois, ganho de renda. Portanto, são pessoas deixando a pobreza, ingressando nas classes médias, o que significa maior consumo de alimentos.
No outro lado da equação, há escassez de terra cultivável e ambientes já degradados. Conclusão: é preciso produzir mais alimentos, mais nutritivos, em espaços menores, sem destruir o que sobra de natureza e, de preferência, refazendo o que foi destruído.
Isso depende de ciência e tecnologia — ou seja, de boas escolas e institutos de pesquisa — mas também de instituições que permitam a passagem do conhecimento para a inovação prática nos campos e nas fábricas.
A Embrapa, por exemplo, está desenvolvendo uma vaca transgênica, de cujo leite se poderá extrair insulina. Em outras pesquisas, aqui e lá fora, nos setores público e privado, também estão sendo desenvolvidos bois e vacas que produzem carne mais saudável e mais nutritiva, em menos tempo de vida. Há uma vaca que produzirá leite sem lactose. E por aí vai — difícil e complexa realização. Entretanto, aqui no Brasil e em vários outros países, mais difícil e complexo será passar pelas diversas instâncias governamentais para obter a aprovação legal dessas vacas. Sem contar o inevitável debate "político" — seria a vaca transgênica um fruto proibido do agronegócio capitalista? — o que pode atrasar ainda mais esse processo.
Aqui também se está preparando o futuro. Esses alimentos ficarão prontos para as novas gerações, mas seu desenvolvimento tem de ser pago pelas atuais.
É verdade que sempre foi assim, uma geração preparando para a outra, mas nem sempre funciona. Não raro, os de hoje criam problemas para os de amanhã. E parece que o momento atual, no mundo, é decisivo. As gerações atuais usufruem de avanços extraordinários obtidos ao longo do século passado, graças aos quais vivemos mais e melhor, mas está chegando a hora de pagar a conta.
O que nos leva de volta ao começo: é preciso colocar a economia em ordem, sem inflação, sem dívidas excessivas, abrir espaço para um futuro adequado.
Falar é fácil.
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