domingo, março 17, 2013

Papa inesperado - LUIS FERNANDO VERÍSSIMO

O GLOBO - 17/03

Eu sei que ninguém mais diz coisas como “Pelas barbas do profeta!”, mas acho que deveríamos ter uma expressão parecida pronta para os casos de grandes surpresas (minha sugestão: “Pelas coxas da Beyoncé!”) como a eleição de um papa inesperado. Guardadas as óbvias diferenças, a escolha do argentino Jorge Mario Bergoglio equivale a um daqueles prêmios Nobel de Literatura dados a um autor que só dezessete pessoas no mundo conhecem, e dez estão mentindo. Na Venezuela corre a versão de que a escolha de Bergoglio foi resultado de um pedido feito pessoalmente a Deus pelo Hugo Chávez. Pode ser verdade, mas o que não contam é que a primeira reação do Senhor ao ouvir o nome do argentino foi: “Quien?”. As piadas proliferam. Já ouvi que, junto com a euforia, nota-se um certo desapontamento na Argentina pelo fato do novo papa ter preferido se chamar Francisco e não Diego Armando. A eleição do Jorge Mario, junto com os gols do Messi, espalham um certo temor pelo mundo: o de que a certeza argentina da sua superioridade sobre todos nós pode não ser megalomania!

É um pouco injusto evocar agora o suposto apoio ao regime, ou a suposta omissão, do novo papa durante a ditadura militar no seu país. A Igreja argentina sempre teve um poder junto à classe conservadora e o pensamento dos seus líderes muito maior do que a Igreja brasileira junto à nossa elite, por exemplo. O que de certa forma a exime, se não a redime. É compreensível que ela tenha sido cautelosa na preservação do seu poder em meio à selvageria, e que hoje se confunda isto com colaboração. Mas também é verdade que um regime repressor tão extraordinariamente brutal como foi o argentino deveria ter excluído qualquer prurido ou desculpa. Mas, enfim, os generais da repressão estão sendo responsabilizados e os torturadores estão indo para a cadeia (na Argentina, pelo menos) e o papa Francisco tem acesso direto ao ouvido de Deus, se sentir a necessidade de contrição. E se conseguir que o Hugo Chávez se cale.

CRÔNICA VOVÔ

Nossa neta Lucinda tem quatro anos e meio e sabe tudo. Há dias ela me mostrava a maneira correta de comer uvas. Meu argumento, de que já comia uvas setenta anos antes de ela nascer, não convenceu. Eu comia errado.

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