quarta-feira, março 06, 2013

Chávez, Lula e o povo - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 06/03

Emblemática a atitude do vice-presidente da Venezuela, Nicolas Maduro, ao anunciar a morte de Hugo Chávez, depois de uma longa luta contra o câncer. Maduro chegou conclamando o povo à união. Ele sabe que, passados os funerais, a vida não será fácil. Tem ainda plena consciência de que está em suas mãos o desafio de manter o chavismo sem Chávez, dentro de uma campanha política contra o líder oposicionista Henrique Capriles - aquele que perdeu o pleito no ano passado. O chamamento ao povo feito pelo vice-presidente representa, guardadas as devidas proporções, o que o lulismo sempre fez no Brasil. Se voltar àqueles que lhe levaram ao poder.

Em todos os momentos de dificuldades, Lula recorreu ao povo. Fez isso nos tempos em que o PT buscou o impeachment do então presidente Fernando Collor, hoje senador pelo PTB de Alagoas. Mais tarde, quando era Lula quem estava na berlinda com a crise do mensalão, em 2005, novamente o povo foi conclamado a demonstrar seu apoio ao petista. Com a ajuda do PCdoB, do PSB e dos sindicatos sempre prontos a sustentá-lo, o PT encheu a Esplanada dos Ministérios em atos públicos pela permanência de Lula no poder. Não por acaso, em 2006, o então candidato à reeleição se apresentou com o slogan “É Lula de novo com a força do povo”.

Em 2010, o mesmo discurso seria retomado como forma de eleger a presidente Dilma Rousseff. O jeitão paternal com que Lula se referia ao povo transformou Dilma em “mãe” do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), trazendo embutida a visão de mãezona do… povo.

Este ano, diante das dificuldades econômicas e o crescimento anoréxico de 2012, lá vem de novo o slogan, um governo do povo, pelo povo, para o povo, emprestado do famoso discurso de Abraham Lincoln, mais popular hoje em função do filme que deu a Daniel Day-Lewis seu terceiro Oscar de melhor ator.

Por falar em talento…

Para conseguir dialogar diretamente com o povo - como fazia Hugo Chávez e como faz hoje Lula - não é algo fácil. É preciso ter um talento tão estupendo quanto o que Lewis tem para atuar. A diferença é que, no cinema, os atores ganham prêmios. Na vida real, os políticos detentores do diálogo direto faturam eleições. Na Venezuela de hoje ainda não se identificou nenhum líder com o carisma de Chávez para carregar seu legado e nem ele teve tempo suficiente para passar esse bastão em vida. Apesar de todas as referências feitas ao seu vice, essa cadeira de herdeiro do chavismo está vaga.

No Brasil, Lula bem que tenta transferir esse seu legado político. Mas, até agora, não surgiu ninguém dentro do PT que tenha a sua capacidade de diálogo direto com o povo e competência política para aglutinar forças. Nem mesmo a presidente Dilma, escolhida para suceder Lula, tem esse poder. Tanto é que, dia sim, dia não, ela e Lula têm “aquela conversa” para, em conjunto, buscarem a saídas políticas capazes de acalmar os aliados.

A falta de um líder carismático dentro do PT capaz do diálogo direto que Lula exerce é que faz surgir novas promessas nacionais dentro da base governista, caso do governador de Pernambuco, Eduardo Campos. A pré-candidatura de Campos “pegou” na política que vê nele alguém com mais jeito para política do que a presidente Dilma.

Por falar em Eduardo Campos…

Os socialistas já definiram agosto como o mês em que o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, deverá finalmente anunciar sua pré-candidatura à Presidência da República. Assim, terá ainda algum tempo para promover filiações no PSB dentro do prazo legal para concorrer às eleições de 2014. Talvez com essa notícia o Planalto recue na sua intenção de aprovar uma “janela” na fidelidade partidária. O governo vê hoje a janela como uma forma de enfraquecer mais os oposicionistas. Pelo visto, a janela em vez de tirar base do senador Aécio Neves vai é fortalecer Eduardo Campos. Mas essa é outra história. Hoje, ficamos com a solidariedade ao povo venezuelano e o desafio de manter a paz e o ambiente democrático para as eleições. Afinal, qualquer coisa fora de uma nova eleição, terá cheiro de golpe. E, de golpe, caro leitor, a América Latina já encheu.

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