sexta-feira, dezembro 21, 2012

Conta-gotas - DORA KRAMER

O ESTADÃO - 21/12


Concluído o julgamento do mensalão, começam a ser revelados detalhes da nego­ciação de delação premia­da entre Marcos Valério Fernandes de Souza e o Ministério Público; apa­recem também as primeiras provas materiais.

As tratativas estão em andamento desde que o Supremo Tribunal Fede­ral decidiu pela condenação dele a 40 anos de prisão, mas foram manti­das em sigilo para não perturbar o processo em curso.

Primeiro soubemos que houve um depoimento no dia 24 de setembro. Recebido com bastante descrédito devido ao histórico do depoente, es­pecialista em ameaças não cumpridas. Os ministros do STF mantiveram-se dis­cretos, embora alguns (Joaquim Barbo­sa, Carlos Ayres Britto e Celso de Mello, pelo menos) tivessem pleno conheci­mento do que se passava.

O lance seguinte veio já na reta final do julgamento, quando tomamos co­nhecimento de que, para tentar conse­guir regime especial de execução das penas presentes e futuras, Valério acrescentou novidade ao caso, incluin­do o ex-presidente Lula no rol dos be­neficiários do mensalão.

Agora surgem os documentos, rela­ta reportagem do Estado. O braço exe­cutivo da quadrilha entregou à procu­radoria o número de três contas no exterior nas quais diz ter feito depósi­tos para pagamento de serviços de ar­tistas e publicitários para campanhas eleitorais do PT.

Anexou também às declarações fei­tas ao MP cópia do cheque no valor de R$ 98.500, emitido pela já notória SMPB à empresa Caso, de propriedade de Freud Godoy, amigo, guarda-costas-chefe de Lula.

A ofensiva de protestos contra a inclu­são do nome do ex-presidente na história do mensalão parece ter o intuito de intimidar o candidato a delator.

Inclui até governadores, mas não terá efeito prático se as provas de Marcos Valério forem consideradas suficiente­mente robustas para convencer a procu­radoria a recomendar à Justiça a conces­são de benefícios pela delação.

A rigor o desagravo seria desnecessá­rio, pois se as declarações dele forem infundadas, vão cair no vazio. O Ministé­rio Público só atenderá aos apelos do condenado se obtiver dele o máximo.

Valério, por sua vez, não teria inicia­do o processo de negociação sem ter como comprovar ao menos em parte o que diz. De 2005 até setembro passa­do, quando afinal caiu-lhe a "ficha", houve alguns ensaios. Chegou a ocor­rer ao menos um encontro não oficial com um procurador, mas nada pros­perou.

Mas agora o operador do mensalão não está mais na fase das meras amea­ças. Nessa altura são inúteis para ele.
Abaixo da crítica. Difícil saber o que é mais vergonhoso: o acúmulo de 3.060 vetos presidenciais na pauta do Con­gresso para serem apreciados ou os con­gressistas se disporem a votá-los ao rit­mo de toque de caixa para atender a um interesse específico e imediato.

Quis o bom senso que a intenção não se materializasse em gesto. Mas ficou a constatação, de resto batida, de que o Parlamento não se cons­trange com nada.

Disse ao País que regra ali existe para ser quebrada e que o costume é deixar por incompleto o proce s so le­gislativo, cujo início se dá com a apresentação de um projeto e se con­clui com a apreciação de vetos da Presidência, quando há.

Admitiu a hipótese de examiná-los agora sem o menor critério sobre o mérito de cada um e demonstrou também seu total menosprezo pela Constituição, que dá prazo de 30 dias para o exame de vetos.

Esse mesmo Congresso pretende ensinar padre-nosso ao vigário dan­do lições de legalidade ao Supremo.

Nasce torto
Ademais, é como reza a velha máxima: não se pode fazer tudo errado e esperar que no fim dê certo. Aplica-se à CPI do Cachoeira e também ao processo (in) decisó­rio sobre a lei de distribuição dos royalties do petróleo.

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