CORREIO BRAZILIENSE - 02/09
O velho recurso de contrate o melhor advogado da praça que está tudo certo parece não ter mais o mesmo efeito do passado. E isso está deixando os bastidores da política em polvorosa
O mundo político nunca esteve tão atônito quanto nesses dias de atenções voltadas para o Supremo Tribunal Federal. Isso porque, pela primeira vez em muitos anos, pelo menos até onde a vista alcança, há entre os grandes caciques partidários a sensação de deslocamento do eixo gravitacional do sistema político como um todo, sem que seja possível calcular os próximos lances do jogo para sobreviver às suas consequências.
Políticos são seres hábeis na arte de projetar o futuro e, assim, se preparar para as ondas que conseguem enxergar mais adiante. Agora, há muitos com medo de condenação. Antes do julgamento da Ação Penal 470, o imponderável residia nas CPIs. Foram tantos que caíram — ou cresceram politicamente — por causa das CPIs que os maiores partidos aprenderam a controlar essas comissões, de forma a reduzir seus efeitos. Até os depoentes descobriram o caminho das pedras para não precisar falar. A maioria já entra na sala de peito cheio para proferir “o direito constitucional de ficar calado”.
Assim, de CPI em CPI, houve quem perdesse o mandato aqui e ali, e alguns voltaram à ribalta. Afinal, criou-se a tradição de que situação política desfavorável do ponto de vista ético era um problema que o tempo podia apagar. Fernando Collor talvez seja o exemplo mais emblemático, uma vez que hoje é um senador atuante.
Aqueles que experimentaram a prisão foram poucos e, invariavelmente, de forma preventiva - entre os políticos do DF, tivemos Luiz Estevão, preso pelo desvio do TRT, e o ex-governador José Roberto Arruda, ambos levados à carceragem antes de qualquer julgamento. Em todos os casos, os advogados sempre disseram, “olha, politicamente, não posso fazer nada, mas condenado, você não será”.
Desde a tarde de quarta-feira, quando João Paulo Cunha (PT-SP) foi condenado, essa sensação de que autoridades estavam sujeitas apenas à prisão preventiva mudou. Embora ainda tenhamos pela frente pelo menos um mês de julgamento, há, no meio político, a sensação de que a Suprema Corte vai aos poucos assumindo o papel de poder moderador da moralidade e da ética pública. E o velho recurso de “contrate o melhor advogado da praça que está tudo certo” parece não ter mais o mesmo efeito do passado. Em tempos de ficha limpa, tudo está mudando e isso é salutar. Por ironia da história, essa mudança de eixo começa justamente pelo PT, que cresceu pregando a moralidade e a ética e, agora, vê seu primeiro integrante condenado. Mas não se assuste, leitor, porque a onda parece que veio para ficar. E se não for assim, o PT, que abriu os trabalhos, é bem capaz de voltar à velha cantilena oposicionista e cobrar decisões duras para outros que tiverem comportamento semelhante ao dos petistas que estão no cadafalso. Vamos aguardar.
Por falar em PT…
Nos bastidores, há quem esteja inquieto com as reações que podem advir, se confirmada a onda de condenações que parece despontar no horizonte. O silêncio público de Lula é considerado ensurdecedor. No comício da campanha de Patrus Ananias em Belo Horizonte, na sexta-feira, ele não citou o caso. Nem poderia. O PT publicamente tem dito que o julgamento não terá qualquer influência sobre as eleições, portanto, não será nos palanques eleitorais que tratará desse tema. Pelo menos, não agora, muito menos em Belo Horizonte, onde Patrus apresenta larga desvantagem para o prefeito-candidato, Márcio Lacerda, do PSB, apoiado por Aécio Neves (PSDB).
Mas, entre os ases da política, ninguém acredita que Lula permanecerá publicamente calado por muito tempo, olhando o fim do alto comando petista, que conduziu a sua primeira campanha presidencial vitoriosa. O confronto entre militantes petistas e grupos que comemoravam condenação, na última quinta-feira, em Osasco, soou como um alerta.
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