segunda-feira, setembro 17, 2012

Inovação poderá embalar Brasil futuro - SERGIO LEO


VALOR ECONÔMICO - 17/09

O governo, aflito com a perda de competitividade da indústria nacional, não tem se limitado às benemerências abençoadas no Palácio do Planalto, envolvendo redução de impostos e, mais recentemente, cortes no preço da energia elétrica. Um trabalho bem menos visível, está em curso, e, por enquanto, se esconde sob o batido e pouco entendido rótulo de "inovação", sob a exótica categoria da "nanotecnologia". O Brasil, gigante produtor de alimentos, poderá se beneficiar da novidade.

"O certo não seria falar em nanotecnologia, mas nanotecnologias", diz o diretor do Departamento de Tecnologias Inovadoras do Ministério do Desenvolvimento, João Batista Lanari Bó. Há diversas tecnologias agrupadas sob o nome de nanotecnologia, unidas apenas por sua escala microscópica: são engenhos humanos, criados com milionésimos de milímetro, aplicáveis às mais variadas áreas da indústria, da química ou da medicina, capazes de alterar a propriedade dos materiais. O ministério começa a sair do terreno das especulações sobre o tema, para incentivar as empresas a abraçarem essas novas tecnologias - nada microscópicas, quando se trata de medir seus possíveis ganhos.

Após reuniões entre potenciais interessados e a contratação de uma empresa de consultoria especializada, o governo está perto de provar que é possível escolher uma rota tecnológica inovadora e montar um modelo de negócios factível. O setor escolhido foi o da indústria de embalagens, essencial para a competitividade das exportações do país, onde a nanotecnologia pode permitir a criação de produtos mais resistentes, esterilizados ou inteligentes - capazes de avaliar e indicar ao consumidor o estado da mercadoria embalada, por exemplo.

Projeto oferecido pelo governo deve inspirar empresas

A indústria de plásticos, recentemente beneficiada por aumento de barreiras contra a concorrência importada, foi o alvo escolhido pelos técnicos do governo para a primeira iniciativa. É um setor onde há pouquíssimas empresas no início da cadeia produtiva, na produção de resinas plásticas (setor quase totalmente dominado por uma grande firma, a Braskem), e, na ponta final, cerca de 12 mil fabricantes de produtos de plástico. Em uma ponta, os negócios têm de ter uma escala monumental para atrair a atenção e interesse dos executivos; na outra, o reduzido tamanho das empresas as deixa muito pouco dispostas a riscos e investimentos em novas tecnologias.

O governo assumiu, então, um papel geralmente desempenhado pelos próprios empresários, e, após reuniões de trabalho com o setor privado, financiou a primeira fase de um estudo de viabilidade para a instalação de uma indústria de produtos plásticos com nanotecnologia destinados a embalagens. "Começamos falando em nanotubos de carbono, para embalagens da indústria eletroeletrônica, mas o Brasil é grande exportador de alimentos, onde temos de inovar na cadeia produtiva", comenta o coordenador do estudo, encomendado à consultoria Nanobusiness, Ronaldo Pedro da Silva.

"No país, 40% do que se consome em embalagens é para alimentos; está aí um baita mercado", resume o especialista. O "baita" mercado da indústria de embalagens reúne cerca de 230 empregos e tem faturamento estimado, neste ano, de R$ 46 bilhões, cerca de 5% acima da receita gerada em 2011. O setor de plásticos ocupa mais da metade do pessoal nessa indústria e participa com 40% do total de suas exportações.

O resultado do estudo encomendado pelo ministério já interessou uma holding do setor a bancar os passos seguintes do que pode se transformar numa fábrica de insumos nanométricos para a indústria de embalagens plásticas. Ou, em português corriqueiro: uma fábrica que produzirá uma espécie de pasta com componentes de argila em escala microscópica, a serem misturados às resinas plásticas, para criar embalagens mais resistentes, mais duráveis, mais impermeáveis, ou com capacidades antimicrobianas e antioxidantes. Um material capaz de enfrentar as crescentes exigências técnicas que os países desenvolvidos vêm impondo às importações, especialmente de alimentos.

O estudo, que necessita, obviamente, de aprofundamento para orientar, de fato, a criação de uma fábrica, evitou delírios desenvolvimentistas e adotou hipóteses conservadoras. A nanoargila foi escolhida por ser um material com facilidade de domínio da tecnologia e um mercado sem concorrentes dominantes, aberto a empreendedores.

Os estudos preliminares, que agora são discutidos seriamente pelo ministério com os empresários interessados, indicam a possibilidade de criação de uma fábrica de custo relativamente baixo e retorno alto, para produzir esse material a ser usado pela indústria plástica na melhoria das embalagens.

O mercado estimado é de até R$ 40 milhões anuais até 2016, os custos de instalação e operação (Capex e Opex, na terminologia dos planos de negócio) ficam em até R$ 29 milhões, pelas hipóteses mais conservadoras, nos primeiros cinco anos. Com financiamento do BNDES, pelo PSI, o carinhoso programa de apoio a investimento do banco, o investidor terá uma taxa de retorno entre 40% a 63% e recuperaria o capital em cinco anos e meio. É um negócio modesto, que pode trazer melhorias a uma cadeia produtiva de dezenas de bilhões de reais;

O exercício microeconômico serve para mostrar que nem tudo que se pode fazer pela competitividade da economia nacional ganha cerimônia e fanfarra nos palácios oficiais. O grupo de inovação do ministério explora também as possibilidades da nanotecnologia na exploração de petróleo, que será um dos temas de um seminário em outubro.

A escala microscópica desse tipo de tecnologia pode, quem sabe, inspirar o setor privado a se armar de lupas e investigar novas oportunidades, além das ações do governo, que surgem contra a armadilha da falta de competitividade.

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