segunda-feira, agosto 20, 2012

O que perdemos com as greves - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 20/08


Quando não são vítimas diretas do mau funcionamento de serviços essenciais decorrente das greves no setor público, os brasileiros tomados como reféns pelos funcionários - que querem arrancar do governo federal a promessa de aumentos salariais que o País não tem condições de pagar - são obrigados a assistir às cenas de confusão e grandes congestionamentos nos aeroportos e estradas. Longas esperas, irritação, perda de compromissos têm sido o preço pago pelos cidadãos que os grevistas vêm utilizando para tentar obter vantagens financeiras à custa dos contribuintes.

Da chantagem sindical praticada pelos servidores em greve, porém, há outras consequências tão graves quanto essas - e talvez de efeitos negativos muito mais duradouros -, mas não tão visíveis. Há pouco, a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) mostrou que a paralisação dos serviços públicos na área aduaneira impõe perdas financeiras imediatas e pesadas às empresas de comércio exterior e que o enorme atraso na liberação de produtos importados e dos destinados aos mercados externos poderá comprometer os negócios futuros do setor.

Com a constatação de que, em decorrência da greve dos funcionários federais de diversas áreas, em certos dias havia cerca de 150 navios parados nos portos, aguardando liberação para carregar ou descarregar mercadorias, a AEB estimou em até US$ 12 milhões a perda financeira diária das empresas apenas com armazenagem da mercadoria, com base no custo de US$ 30 mil a US$ 80 mil por navio.

Esta é uma perda tangível e imediata. Mas há outras, menos óbvias e que podem ter efeitos de longo prazo. Uma delas é o atraso na liberação e o encarecimento das mercadorias destinadas ao mercado externo, o que torna menos competitivo o produto brasileiro num momento em que, por causa da crise, é cada vez mais difícil exportar.

O atraso no embarque da mercadoria, por sua vez, pode causar multa e até cancelamento do contrato. Algumas exportações, como lembrou o presidente da AEB, José Augusto de Castro, utilizam carta de crédito, que tem prazo de validade. "Se eu não consigo embarcar dentro do prazo, perco a garantia. Ou seja, deixo de ter a garantia de pagamento e o importador vai pagar se quiser", exemplificou.

Outra consequência é a deterioração da imagem do exportador brasileiro e do próprio País no exterior, que passam a ser vistos como não cumpridores de contratos. Mercados conquistados duramente numa longa disputa com concorrentes externos podem ser perdidos em pouco tempo. Isso pode prejudicar ainda mais o desempenho das exportações brasileiras, já afetadas pela crise mundial.

Do lado das importações, o atraso na liberação das mercadorias por causa da greve dos servidores da Receita Federal e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) pode prejudicar o fornecimento de componentes e matérias-primas para a indústria, o que afeta a produção industrial. Além disso, eleva os custos de armazenagem e o custo da produção interna, com reflexos nos preços dos produtos finais. Em alguns casos, pode ocorrer perda de produtos por deterioração.

O que mais espanta nas conclusões da AEB sobre as perdas para o País causadas pela greve dos funcionários que atuam no comércio exterior é a frequência com que esses servidores recorrem às paralisações para extorquir vantagens do governo. De 2005 até a terça-feira, 14/8, quando a AEB apresentou seu estudo sobre os efeitos nocivos das greves no setor público, o total de dias parados acumulados pelos funcionários federais designados para a área aduaneira - do Ministério da Agricultura, da Receita Federal, da Anvisa e do Ibama - alcançou 659.

É como se, de pouco mais de sete anos e meio, praticamente dois tivessem sido de greve de alguma ou algumas das categorias de servidores que atuam no comércio exterior, com os efeitos imagináveis sobre as exportações, as importações e, portanto, a atividade econômica.

Além de frequentes (apenas em 2011 não se registrou greve de servidor da área aduaneira), as paralisações são de longa duração e de alto custo para o País.

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