segunda-feira, julho 09, 2012

Beleza ou caricatura? - WALCYR CARRASCO


REVISTA ÉPOCA
A primeira vez em que fui ao museu do Louvre, em Paris, estava ansioso por contemplar a Vênus de Milo, símbolo máximo de beleza da Antiguidade. Quando me aproximei do torso de mármore, descobri se tratar de uma gordinha. Surpreso, confirmei várias vezes a identificação. Era ela mesma. Símbolo de beleza? Quá-quá-quá! Se fosse viva, hoje em dia a Vênus estaria atormentada por regimes. Tenho a mesma sensação quando assisto a filmes antigos. As estrelas do passado, admiradas por seu esplendor, dificilmente resistem aos padrões atuais. Leslie Caron: olhos lindos, mas cadê o queixo? Audrey Hepburn: chique, só que reta como uma tábua. Lana Turner: seios avolumados, mas rosto comum e nariz de batata. Mudaram os padrões de beleza, é certo. E as operações plásticas tiveram grande influência nisso. Atualmente, muitas garotas fazem suas primeiras plásticas já no final da adolescência. Os pais não só pagam, como apoiam. Eu me pergunto: uma adolescente precisa ser peituda? Se dá tanta importância a isso, deveria buscar um terapeuta, e não um cirurgião. Tenta-se corrigir todo o corpo, o que torna algumas pessoas parecidas com ETs. Uma vez, eu assistia a um desfile acompanhado por uma expert em moda. Comentei sobre a modelo na passarela. Minha amiga respondeu:- Não vai ter carreira. Ela fez plástica de nariz. O rosto perdeu a proporção.

Era verdade. O narizinho parecia incrustado numa cara ossuda, sem nada a ver com ele. Confesso: já fiz plástica. Sempre tive trauma da minha barriga. Anos atrás, resolvi eliminá-la a golpes de bisturi. Não me contentei com uma lipo. Também fiz uma abdominoplastia. É uma técnica cirúrgica que remodela o abdome. Como sempre, veio o "já que".

- Aproveite e tire minha papada - disse ao médico.

Deitado na cama da clínica, pensei:

- Mas o que estou fazendo aqui? Por que vou me submeter a uma anestesia geral, da qual posso voltar com sequelas?

Quase levantei para ir embora. Naquele momento me espetaram. Acordei horas depois com um capacete de gaze no rosto. Impossível respirar direito. E sem umbigo.

- São só 24 horas de capacete - disse o médico diante de minhas pupilas lá no fundo, aterrorizadas.

- Ixiiiii....

- Quanto ao umbigo, você vai usar isto aqui, esta prótese de acrílico, para formar um novo buraco. Use sempre, senão fica liso.

- Aiiiiiiiii... - balbuciei através do capacete. Foram dois meses usando colete para formatar a barriga. No maior calor. A pele borbulhava. E o artefato de acrílico preso no abdome, para formar o buraquinho do umbigo. Admito: o resultado foi ótimo. Por sete meses. Já no oitavo, uma nova barriga começou a se formar. Está instalada até hoje, vitoriosa. Uma amiga fez pior. Queria botar prótese nos seios. Apavorou-se já na maca, a caminho da mesa de operação. Pulou e saiu correndo. Nua. Através do hospital. Certas celebridades agem como se fazer plástica fosse semelhante a ir ao cabeleireiro. Algumas fizeram tantas que relacionam os acontecimentos da vida com as operações: - Casei antes da primeira plástica. Agora estou na 20a plástica e no 200 marido. Essa coincidência será um sinal cabalístico? A plástica se tornou uma mania mundial para homens e mulheres. Pessoas fazem poupança para aumentar os seios ou botar bíceps de silicone. Hoje em dia, formar um elenco, principalmente em novela de época, é uma dificuldade. Cadê aquela senhora com cara de voyozinha? A atriz Laura Cardoso, atualmente em Gabriela, é uma das mais requisitadas. Além de ser uma grande intérprete, nunca mexeu no rosto. Demonstra a idade que tem. Sai de uma novela e entra em outra porque, como ela, há raríssimas.

A febre de plásticas tem motivo. A juventude é valorizada, a velhice não. Ninguém quer ser tratado como vovô. É bom se sentir charmoso. É chato estar distante do padrão estético: barriga zero, gordura zero, rugas zero, juízo abaixo de zero. As pessoas esticam o rosto para rejuvenescer. Que engano! A esticada de 50 não parece uma garota de 20. E sim o que é: uma esticada madura. Quanto mais vezes alguém se estica, mais esquisito se torna. Todas as plastificadas e todos os plastificados parecem clones, de boca puxada, olhos esbugalhados. E os incômodos? Eu digo, eu digo! Desde que puxei o queixo, faço barba atrás da orelha! Quanto mais plásticas, menor a identidade. Cadê a pessoa que estava ali? É o pior da plástica repetida: a pessoa se torna uma caricatura de si mesma.

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