sábado, outubro 01, 2011

RUTH DE AQUINO - A lingerie de Gisele


A lingerie de Gisele
RUTH DE AQUINO
REVISTA ÉPOCA
A ameaça de censura ao comercial com ela rodou o mundo. Só que, no anúncio, o objeto é o homem...

RUTH DE AQUINO  é colunista de ÉPOCA raquino@edglobo.com.br (Foto: ÉPOCA)
Certo ou errado? Gisele Bündchen, de lingerie e salto alto, seduz seu homem (e os nossos também) no comercial de TV. A modelo dá más notícias para o marido. “Amor, mamãe vem morar com a gente.” “Estourei seu cartão de crédito.” “Bati com seu carro.” Gisele séria, de vestido comportado. E sensual, de calcinha e sutiã. “Você é brasileira, use seu charme”, diz a publicidade. A Secretaria de Políticas para Mulheres (SPM) do governo Dilma achou a mensagem “preconceituosa e discriminatória” e quer tirar Gisele do ar.
Desconfio que a Hope, marca da lingerie, tenha contratado as mulheres de Dilma para bombar a campanha. O anúncio com a modelo mais bem paga do planeta virou uma sensação. Em inglês, francês, italiano, espanhol. A ameaça de censura do governo rodou o mundo. Vídeos legendados em diversos idiomas mostram Gisele no duplo papel. A esposa recatada. E a gata provocante. Tudo para vender lingerie... para as mulheres.
Acho o anúncio divertido, leve, maroto. Não me senti ofendida. E olha que sou chefe de família, como 30% das brasileiras. Fico boba com a falta de humor e rebolado da tal secretaria do governo. A nota de repúdio ao Conar, conselho que regulamenta a publicidade, usa uma linguagem pesada como a burca. Inspire. “O anúncio reforça o estereótipo equivocado da mulher como objeto sexual e ignora os grandes avanços alcançados para desconstruir práticas e pensamentos sexistas.” Expire. Conseguiu ler até o fim? Ah, falta explicar que o governo recebeu 15 – quinze! – queixas de telespectadores indignados com a publicidade. Uma multidão. Por isso, a ministra Iriny Lopes foi à luta contra a lingerie incorreta.
Que tal uma teoria inversa? O anúncio na verdade mostraria o homem como objeto de manipulação das mulheres e não o contrário. O homem é um tolo que cai de quatro para o poder da sedução feminina. Em vez de macho fulo de raiva com o cartão de crédito estourado, o carro batido e a vinda da sogra, o marido invisível se submete, dócil, ao charme de sua mulher.
Quem achou Gisele apelativa? Luana Piovani! A atriz, que vive semipelada no cinema, na televisão e no teatro, disse: “Sei lá, sou meio feminista”. “Não curto mulher de fio dental vendendo cerveja.” Depois de processar Dado Bolabella (ops, Dolabella) por ter levado uns tapas dele na boate, Luana vai ser mãe e acha que “representa as mulheres brasileiras”. Diz que só usa lingerie em festinhas para o marido e que “faz mulher-objeto, mas só na dramaturgia”. Senti uma pontinha de inveja da mulher invisível pela diva brejeira e simpática.
Fui saber a opinião do publicitário Armando Strozemberg, presidente da 3ª Câmara do Conar, do Rio de Janeiro. “Quando vi o comercial, fiz o seguinte exercício: eu colocaria um homem no lugar da Gisele? Nas mesmas duas situações? Claro que colocaria”, diz ele. “A sedução, no Brasil, é mútua. É coisa nossa. E o comercial é uma brincadeira que lida com esse universo. Não desmerece a mulher.”
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A ameaça de censura ao comercial com ela rodou o mundo. Só que, no anúncio, o objeto é o homem...  
Penso nas cenas de novela com atores sem camisa, mostrando o peitoral, de sunga, de cueca, tomando banhos demorados, ou mesmo de bundinha de fora. Uma exibição deliberada de músculos, barriga tanquinho e testosterona. As mulheres gostam e suspiram. E ninguém reclama que os homens sejam objetos sexuais – eles até gostam. Não gostam?
Não somos Giseles. Estamos longe disso. Mas cada uma de nós tem algo especial para seu homem – nem que seja o sorriso aberto, o olhar sugestivo, um colo ou... E vice-versa. Há 16 anos, eu fazia mestrado em Londres, não havia internet e, em vez de gastar palavreado em cartas para o namorado artista plástico no Brasil, eu mesma fiz uma série de fotos minhas de lingerie e salto alto. Enviava a ele pelo correio uma vez por semana, toda segunda-feira. Eram cartões-postais personalizados. Um “teaser”, na linguagem publicitária. Ele se dizia ansioso a cada novidade semanal do correio.
Quando contei isso a algumas amigas, me olharam incrédulas. E como ficava a imagem de jornalista séria e “meio feminista”? Por que fez isso, Ruth ? Para brincar, seduzir, surpreender e agradar ao namorado. Estamos juntos até hoje.

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