segunda-feira, outubro 31, 2011

DENISE ROTHENBURG - O tempo e o PT



O tempo e o PT
DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 31/10/11

Como bem lembram os jornalistas Mathew Cowley e Tom Murphy, do The Wall Street Journal, muito do sucesso de Lula se deve à sua voz. Ninguém fica indiferente quando ele pega um microfone para discursar, especialmente, no improviso

Os petistas estão em estado máximo de alerta. A medida em que vão assimilando a doença de Lula, começam a ficar meio que assustados com seus reflexos dentro do partido. Nenhum dos petistas com quem conversei topou expor em público suas preocupações sobre as eleições de 2012, mas, nos bastidores, essa conversa rola solta. 
A primeira preocupação é com o tempo de recuperação. O câncer de Dilma Rousseff foi diagnosticado no início de 2009. Em abril daquele ano, a então pré-candidata a presidente da República tratou um tumor no sistema linfático. Foram quase seis meses para que ela voltasse à ativa com força total. 
Nesse período, ela lutou bravamente e, às vésperas do carnaval de 2010, o PT apresentava Dilma aos seus militantes como a candidata à sucessão presidencial. Curada, a então ministra da Casa Civil seguiu concluindo seu trabalho, uma bateria de inaugurações e lançamentos de obras. E sempre ciceroneada por Lula. 
No caso do ex-presidente, o câncer na laringe surge no momento em que o PT se prepara para organizar seus palanques rumo a 2012. O partido esperava contar com a voz do seu maior líder e seu poder de sedução na política para atrair aliados. Novembro, que chega amanhã, seria o mês em que Lula se dedicaria a conversar com os partidos, especialmente, em São Paulo, onde Fernando Haddad é pré-candidato. Ja havia inclusive marcado uma conversa com o deputado Gabriel Chalita, do PMDB, para tentar, pela segunda vez, convencê-lo a seguir com o PT na largada da eleição municipal. 
Agora, Lula tem outras prioridades. E nem o PT quer que seja diferente. Afinal, dona Marisa Letícia, que passou oito anos dando bronca nos políticos que queriam discutir trabalho nos fins de semana, avisou que o momento é de dedicação ao tratamento. E nem precisava. Afinal, o Brasil tem plena consciência disso. 

Quem assume?E aí é que fica o vazio e o que mais preocupa o partido: quem exercerá esse papel de coordenador da eleição na ausência de Lula? A pergunta ainda não tem resposta. O presidente do PT, Rui Falcão, surpreendeu positivamente todos dentro do PT, é bem quisto, mas nem de longe tem esse poder todo junto a aliados estratégicos para facilitar a vida eleitoral do PT em várias capitais. 
Ontem, nas minhas conversas, houve quem citasse que talvez José Dirceu pudesse exercer esse papel muito discretamente. Ele atua forte nos bastidores, mas não tem esse charme do convencimento que muitos atribuem a Lula. E, como está com a imagem pra lá de arranhada desde o escândalo do mensalão e responde a processo no Supremo Tribunal Federal, acusado de chefiar uma quadrilha, não tem como desfilar à luz do sol em busca desses acordos. 
Como me contou ontem um político do PT, José Dirceu não tem hoje como chamar o presidente do PSB, Eduardo Campos, e dizer a ele que não lance um candidato em Recife. Muito menos arrancar de Gabriel Chalita uma parceria com o PT na largada da sucessão municipal paulista. O PT não tem outro Lula. 
E, de mais a mais, Lula é emoção. E emoção na voz. Como bem lembram os jornalistas Mathew Cowley e Tom Murphy, do The Wall Street Journal, muito do sucesso de Lula se deve à sua voz. Ninguém fica indiferente quando ele pega um microfone para discursar, especialmente, no improviso. Ele prende a atenção com suas analogias e o jeito sincero e simples de falar sobre todos os temas, desde os mais intrincados temas da geopolítica econômica até a alegria de ver a classe C andando de avião. 
O povo entende Lula, chora com ele, ri com ele. E o PT sempre surfou nessa onda, com um líder pairando acima das disputas das tendências que, volta e meia, travam o processo dentro do partido. Lula sempre soltou a voz nos palanques e nas conversas que valiam a composição do time para tentar chegar à final do campeonato eleitoral. 
Sem a voz de Lula a curto prazo, restará ao PT esperar que a recuperação venha em tempo de o ex-presidente ainda poder discursar nos palanques. Bem, se ele tiver o mesmo destino de Dilma, esse período de tratamento será breve. Por enquanto, resta aos petistas, como a todos os brasileiros, apenas a oração. 

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