quarta-feira, agosto 31, 2011

ALON FEUERWERKER - Estado cansado?



Estado cansado?
ALON FEUERWERKER
CORREIO BRAZILIENSE - 31/08/11


O Estado dirige bem a Petrobras mas não consegue fazer aeroportos funcionarem bem. Mistério. Nos bons tempos alguém falaria em sucateamento proposital para fins de privatização.
A fala sobre a superioridade do Estado dá sinais de cansaço



Causou pouco ruído dias atrás o leilão de privatização do aeroporto de Natal (RN), 100% repassado a particulares. Teve até a foto tradicional do martelo batido a muitas mãos, mas não despertou maiores emoções. 

O governo não fez firula. Não é Parceria Público-Privada (PPP), não resta participação da Infraero, nada. O ativo foi integralmente repassado a quem pagou mais. O governo caiu fora e ponto final. 
Natal é um filé. Se na Segunda Guerra Mundial ficou conhecida como "trampolim da vitória", pela localização estratégica para o controle da circulação em mar e ar no Atlântico Sul, agora é ponto de altíssimo potencial turístico. 
Fica pertinho da Europa mas está fincada na América do Sul. E num lugar paradisíaco. Com as vantagens decorrentes da tripla situação. 
Daí o belíssimo ágio obtido na venda. Os compradores pagaram mais de três vezes o preço do edital. Fossem outros os tempos, as autoridades seriam suspeitas de ter tentado vender o patrimônio público a preço de banana. 
A privatização dos aeroportos foi uma isca política descoberta para atenuar as críticas ao governo nos sucessivos episódios do assim chamado "caos aéreo". Mas não é só isso. É antes de tudo um excelente negócio. 
Aeroporto é atividade monopolista. Se o sujeito não está satisfeito com o serviço, não dá para simplesmente procurar a concorrência. Tem que usar o dito cujo e ponto final. A receita do empreendimento é garantida. 
Daí o sucesso na privatização de Natal, e deve repetir-se quando forem a leilão os aeroportos maiores. 
Mas fica a dúvida. Por quê, afinal, privatizar? Da maneira como o governo põe a questão, acaba parecendo confissão de incompetência. As autoridades confessam ser incapazes de tocar o negócio como se deve. 
É uma admissão e tanto para quem atravessou os últimos anos montado no discurso sobre a superioridade do Estado. Se este não consegue nem conduzir um monopólio de receita garantida, vai tocar o quê? 
O Estado dirige bem a Petrobras mas não consegue fazer aeroportos funcionarem bem. Mistério. Nos bons tempos alguém falaria em sucateamento proposital para fins de privatização. 
A fala sobre a superioridade do Estado dá sinais de cansaço. O anúncio do superavit primário excedente foi emblemático. 
O governo sempre soube que iria sobrar receita em 2011, mas em vez de acelerar o investimento no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) " ou repassar aos mais pobres e dependentes de políticas públicas de redistribuição de renda ", prefere redirecionar aos investidores. 
Em vez de suprir necessidades prementes, prefere abater dívida. 
A teoria é redonda. Ao diminuir a demanda por recursos para rolar a própria dívida o governo reduz a pressão sobre os juros. Juros menores significam mais consumo e mais investimento. E portanto mais crescimento e empregos. 
Mas a teoria embute uma renúncia. Diga o que disser, o governo admite confiar mais na capacidade de os capitalistas fazerem acontecer no que na aptidão dele próprio. 
Os sinais de cansaço estão por toda parte. As autoridades da Saúde puseram na agenda as tais fundações estatais de direito privado. Estatais na garantia dos recursos e privadas na liberdade para contratar (e demitir) pessoal e comprar bens e serviços. 
Quando Paulo Maluf e Celso Pitta implantaram algo parecido em São Paulo nos anos 1990, foi um escândalo, mas eram outros tempos. Agora, a privatização na Saúde só não vai adiante devido à resistência sindical-corporativa. 

FronteirasAproxima-se o debate na ONU sobre a formalização do Estado Palestino. Os palestinos pretendem proclamar sua soberania no território entre o Jordão e o Mediterrâneo que, antes de 1967, estava sob controle da Jordânia (Cisjordânia) e do Egito (Gaza). 
Quando um país define suas fronteiras, define também as dos vizinhos. Automaticamente, renuncia a reivindicações territoriais. A não ser que ambicione anexações. 
O Brasil poderia propor que todos os países participantes na Assembleia Geral da ONU reconhecessem esse status quo definitivo: o Estado Palestino em suas fronteiras declaradas e o Estado de Israel nas terras remanescentes. 
Poderia até haver depois alguma troca territorial por critérios demográficos, como propôs Barack Obama. Mas seria detalhe. 
Pois o princípio estaria estabelecido. E cada um cuidaria da vida na sua casa. Soberanamente. 

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