Judiciário: pró e contra
WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SÃO PAULO - 18/06/11
O desequilíbrio entre os que podem e os que não é um mal; mesmo assim, a defesa é um direito do brasileiro
A COBERTURA do Poder Judiciário nos meios de comunicação, em comparação com a dos outros dois Poderes, tem poucos assuntos capazes de gerar discussão animada. Ela surge quando crimes e escândalos envolvem nomes conhecidos do público. Brilham os heróis do Ministério Público, dos organismos policiais, até juízes com boa acolhida na mídia e criminalistas, todos em palavras acessíveis à maior parte da comunidade.
Acabamos de viver esses momentos no caso que envolveu Cesare Battisti no STF (Supremo Tribunal Federal) e no de Daniel Dantas no STJ (Superior Tribunal de Justiça). Logo desaparecerão das manchetes.
Antes que isso aconteça, merecem reexame por certos aspectos constitucionais do Poder Judiciário. São horas em que a população, como um todo, chega a ver a magistratura integrada a um poder constitucional com as responsabilidades consequentes, o que é bom.
É bem verdade que, ao libertar Battisti, o STF saiu diminuído, no dizer do ministro Gilmar Mendes, ex-presidente da corte. Criticou a decisão da maioria, ao libertar o terrorista italiano.
A rendição ao caminho aberto pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva até negar a extradição pedida pela Justiça italiana explica a crítica de Mendes, mas predominou o critério democrático da maioria no STF, enquanto órgão coletivo.
A Constituição diz no artigo 102 que compete ao STF "precipuamente, a guarda da Constituição".
Vale a pena repetir que, no advérbio "precipuamente" e nos substantivos "guarda" e "Constituição", estão contidos os modos de avaliar o dispositivo mencionado.
Precípuo é principal, essencial. Indica a função básica do STF. Por isso mesmo, escrevi na 4ª edição de meu livro "Direito Constitucional Brasileiro" (Ed. Saraiva): "O papel fundamental que a Carta Magna reserva ao Supremo Tribunal Federal é o de ser seu intérprete definitivo". Pois bem: a Constituição inclui, no elenco das responsabilidades do STF, o dever exclusivo de julgar e processar "a extradição solicitada por Estado estrangeiro" (letra "g" do mesmo artigo).
Gilmar Mendes, ao votar contra a maioria, mostrou firmeza ao demonstrar que a razão estava com ele, com o ministro Ricardo Lewandowski e com o presidente da Corte, ministro Antonio Cezar Peluso. Mas maioria é maioria e assim deve ser.
Durante outro processo, da famosa e estranha Operação Satiagraha, julgado pelo STJ , sendo relator o desembargador Adilson Macabu, o delegado Protógenes Queiroz construiu com grande competência seu "cartaz" político. Ele passou a ser presença obrigatória na mídia e, com isso, abandonou o rigor das formas processuais, no levantamento das provas, para terminar gerando a nulidade, afirmada pela maioria do STJ, por placar apertado.
Protógenes não foi exceção. Também é inevitável, embora injusto em toda parte, aqui e no exterior, que os mais afortunados tenham maior possibilidade de sucesso em sua defesa.
O desequilíbrio entre os que podem e os que não podem é um mal. Mesmo assim, o exercício pleno da defesa está no rol dos direitos fundamentais de todo brasileiro.
Na alternativa considerada, os dois julgamentos incluíram prós e contras do Judiciário ao agir como Poder que pode. Isso é bom, seja qual for a opinião do povo sobre o resultado.
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